Creio que é a luz destas verdades gerais que cumpre considerar o caso português.

Nesta longa hora tomada à vossa benevolência, muito de propósito me demorei menos sobre os seus pormenores do que sobre as generalidades em que creio inserir-se.

Não falta fazer a pintura das preocupações que nos tomam, das angústias em que se debatem os agricultores, da ruína que já aniquilou muitas lavouras e pende sobre outras, do acastelar das dívidas, do atrasar das amortizações, do acelerado diminuir dos rendimentos, com todos os negrumes, com todos os traços, com todo o vigor muitas e muitas vezes feita já a V. Ex.ª

Mas cabe tentar ainda um resumo final para procurar esclarecer definitivamente o sentido da minha presença. A lavoura, sobretudo a dos cereais, a menos ajustada ao território, a mais necessária aos habitantes, está assoberbada de dificuldades profundas e em agravamento. «Ajudai-nos! Protegei-nos! Salvai-nos!» é o título genérico de uma série de artigos em publicação agora mesmo num dos mais antigos e conhecidos dos nossos periódicos agrícolas e ó o grito, o clamor unânime, dos lavradores.

Velhas queixas, repetidos avisos, recomendações solidamente fundadas, têm sido desprezadas por governantes e governados, mantendo-se numa inércia - mas inércia não quer dizer torpor, quer dizer falta de força para alterar o movimento - que conduziu a crise presente.

Agora é redobrado o esforço a fazer, mas a intensidade mesma do mal fará aceitar todos os remédios capazes de concitarem boas esperanças.

Chegou a hora de agir, a hora inadiável de decisões que não sejam só ordens de cima, mas sim directrizes de acção eficiente. Porém... há dois anos disseram-nos que o mal era das estruturas, agora (todavia com mais visos de verdade) que das culturas, e a lavoura pergunta-se como discernir e escolher um caminho entre o jogo das palavras e o das veleidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Veleidades, sim, porque outro nome não têm os mais honestos propósitos, os mais bem concatenados planos, os mais enérgicos assomos, quando é incerto o ponto de partida e insuficiente a força de acção.

Vozes: - Muito bem!

ios financeiros não estão assegurados com a abundância indispensável para dar à reconversão ritmo e alcance correctores da crise, e força para talharem e repararem rápidos prováveis falhas e desilusões. A indispensável retirada da seara dos muitíssimos milhares de hectares por ela arruinados só poderá fazer-se tomando de arrendamento as terras dos lavradores pobres para as florestar e pelo tempo disso, conforme permite lei já antiga de dez anos, mas nunca, que eu saiba, utilizada desta feição; e os recursos agora anunciados em jogo não parecem aplicáveis ao efeito.

Para não encarar a falta de rentabilidade das culturas de cereais, afirma-se que devem ser abandonadas onde essa não seja satisfatória aos preços actuais - isto é, em quase toda a parte -, princípio certo, contanto que haja culturas de substituição utilizáveis em amplitude bastante, o que ainda ninguém demonstrou, e capitais para investir nelas e esperar enquanto ganham conhecimento e mercado, o que está demonstrado não haver!

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Longamente esquecida a agricultura como factor de crescimento da economia nacional, é tarde e a péssima hora que se acorda a reparar quanto ela lhe é ainda necessária, e quão pouco preparada está para tal papel.

E em nome do direito à simples sobrevivência de mais de 4 milhões de portugueses, e do direito a vida melhor de outros tantos, que eu proclamo a crise agrícola nacional, não como mal crónico, mas como afecção agravadíssima, requerendo as mais atentas, enérgicas, prontas e eficazes providências.

O Sr. Franco Falcão: - Muito bem!

O Orador: - É necessário que a Nação se convença de não ser este só um mal de sector, a par do qual os demais possam passar indiferentes ou apenas curiosos, mas doença agudíssima a minar todo o corpo económico e social.

É necessário antes de mais nada travar-lhe o avanço, fortalecendo os lavradores pela revalorização das produções não rendáveis, e seguidamente combatê-la ajudando-os com informação segura e meios eficazes a orientarem-se por melhores caminhos. Mas aquela acção, que é de urgência, não deve nem pode ser suprida pela ultima, que é de efeito a prazo.

Para se combinar as duas há que mobilizar boas vontades e recursos materiais até ao limite do impossível, justificando-se a eventual partilha com domínios até agora melhor dotados e que como tais possam consentir declarações, que ainda serão avanços relativamente à agricultura.

E há que proclamar aos povos das cidades que a agricultura não é um serviço público, mas uma actividade tão válida e m ais indispensável que as suas,...

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - ... servida por homens que como eles aspiram a beneficiar das conquistas da civilização, e que portanto têm de ser igualmente retribuídos pelo seu trabalho:...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... igualmente, se não melhor, por a tarefa ser mais dura e as compensações mais raras.

Dos agricultores dizia um velho moralista em trechos dos mais célebres da literatura francesa: «... poupam aos outros homens o trabalho de semear, de lavrar e de