A pecuária é, como toda a gente sabe, uma das maiores riquezas dos Açores.

Nas ubérrimas pastagens artificiais de 3. Miguel, como nos extensos prados naturais das outras ilhas, há mais de 151 000 bovinos, ou seja 15 por cento dos existentes em todo o território continental.

Este poderoso armeutio tem permitido não só auto-abastecer aquele arquipélago, mas ainda suprir, em medida apreciável, os deficits de carne e de lacticínios que se verificam no continente.

Ora este suprimento, se é já da ordem dos 93 por cento relativamente ao deficit da manteiga, não vai além de 25 por cento pelo que respeita ao deficit da carne de vaca, o que quer dizer que mais de três quartas partes da carne que falta (com excepção de uns escassos 9 por cento provindos do ultramar) ainda é fornecida pelo estrangeiro, que com isso ganha, em boas e acreditadas divisas, à roda de 100 000 contos.

Semelhante situação, que se tende a agravar no continente, com o aumento constante da população, com o turismo e com a melhoria do nível de vida, poderia, em grande parte, ser resolvida pelos Açores, com a duplicação, ou mesmo triplicação, dos seus efectivos pecuários.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para tanto não eram precisas nem obras dispendiosas de irrigação, nem grandes construções, nem. muita maquinaria.

O Sr. André Navarro: - Muito bem!

O Orador: - Uma melhor remuneração do gado ao produtor, paralela a maiores facilidades de crédito e a mais perfeitas normas de comercialização, bastaria para que, em prazo relativamente curto, aquela finalidade fosse atingida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Foi pensando e agindo neste sentido que S. Miguel, com as simples forças da sua Junta Geral, dos seus homens mais abastados e da sua principal câmara municipal, seleccionou todo o seu gado, procedeu à arroteia de difíceis incultos, transformou os seus pascigos naturais em ricos pastos artificiais e construiu um modelar matadouro frigorífico e industrial com capacidade bastante para laborar não só os 55 000 bovinos do seu distrito, mas todos os que a escassez da terra pudesse vir, no futuro, a comportar.

Depois de tantos esforços e de tanto dispêndio, pensava o Micaelense que lhe seria fácil marcar uma boa presença nacional, ou mesmo internacional, no campo da exportação de carne (tal como já o conseguira com os lacticínios, cujo valor ascendeu a mais de 62 000 contos no ano de 1962), substituindo o «circuito vivo» do velho processo de exportação de gado pelo «circuito morto» da moderna exportação de carne frigorificada.

E, satisfeito e confiante, procedeu no dia 10 de Julho do ano passado à sua primeira experiência, enviando para Lisboa, pelo navio Terceirense, um pequeno lote de carne naquelas condições.

Quando se julgava, porém, que tudo iria correr bem economicamente, tal como havia decorrido tecnicamente, eis que surge a conta da empresa armadora marcando 7$31 por cada quilograma de carne transportada!

O Sr. Sousa Meneses: - Absurdo! ...

O Orador: - Ninguém queria acreditar, e não queria porque esse frete equivalia a três vezes mais do que se esse mesmo volume de carne limpa fosse enviado, no porão, sob forma de gado vivo.

E começaram as reclamações, reclamações que chegaram à Junta Nacional da Marinha Mercante, que acabou por fixar, a título experimental, durante um ano, o frete de 2$80 por quilograma, acrescido de. 20 por cento para operações de. carga e de descarga.

Semelhante redução não resolveu, porém, o assunto, e não resolveu porque esse frete, adicionado às restantes despesas de exportação, nenhuma margem de lucro deixa para ser oferecida, como vantagem, à gente da lavoura.

Utilização do matadouro ............... 1$00

Taxa de amortização do matadouro ...... $65

Transporte do cais ao matadouro ........ $25

perfazendo 3$6316, importância esta que somada a 3$36 (2$80+20 por cento) de frete totaliza 6$9916, que é preço bastante para desaconselhar ou impedir a comercialização das carnes refrigeradas dos Açores.

Desta forma ficaram logradas as esperanças dos Micaelenses, que supunham ter no seu moderno matadouro o instrumento ideal para melhor fomentarem a produção do gado de corte através de uma maior valorização do seu preço de compra e melhor expandirem o seu comércio através de uma mais perfeita apresentação dos seus produtos.

E ao chegar a esta dolorosa conclusão não podemos deixar de perguntar: mas o que é que está errado em tudo isto?

O matadouro do Ponta Delgada não foi feito sem o conhecimento e a aprovação do muitas entidades superiores, nem sem a orientação e o concurso de técnicos distintíssimos.

Um serviço oficial chegou mesmo a oferecer-lhe uma parte da sua aparelhagem para que mais rapidamente ele pudesse surgir, na plenitude da sua função, como «unidade-piloto» que guiasse, no futuro, alguns empreendimentos semelhantes.

O defeito não deve estar, pois, nem na sua planificação, mim na sua construção, nem na sua dimensão.

Mas se o defeito não está em si próprio, onde está então?

Na distância?

Mas meu Deus! Muito mais longe do que os Açores estão Angola e Moçambique, o Uruguai, a Argentina e a própria Austrália, e, todavia, todas estas províncias ou todos estes países conseguem trazer até aqui, em boas condições económicas, milhares de toneladas de carne congelada.

Sei que a carne congelada, por ser transportada sobreposta, ocupa muito menos espaço nas câmaras frigoríficas do que a carne frigorificada, que requer vir senarada e