Tal receio não resiste, porém, a uma analiso ligeira, se se atender à circunstância característica do nosso mercado dos géneros agrícolas, qual seja a de o preço de compra do consumidor não corresponder, nem mesmo remotamente, aos preços de venda do agricultor.

Desta sorte, se se quiser encarar o problema dos preços na sua inteira realidade e liberto do conceito puramente comercial, fácil será elevar ao nível justo a remuneração do produto, mantendo e até baixando o preço de consumo de muitos dos géneros agrícolas.

Por outro lado. enquanto em qualquer ramo da actividade económica o aumento do produção implica o aumento de réditos, tal fenómeno na agricultura portuguesa provoca contraditória e inadmissivelmente o aviltamento dos preços e a diminuição dos lucros.

O Sr. Augusto Simões: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Augusto Simões: - É realmente assim como V. Ex.ª diz; tenho verificado, efectivamente, que a agricultura portuguesa cada voz está mais obrigada a pagar caro aquilo de que necessita e a vender barato aquilo que produz.

O Orador: - Mas sem proveito para o consumidor, deve V. Ex.ª observar.

O Sr. Augusto Simões: - Em virtude do intermediário.

O Orador: - O mal não é do intermediário, mas dos intermediários, no plural.

Sendo assim, que incentivo tem o agricultor português para aumentar a sua produção agrícola?

Manifestamente que nenhum; nem nenhum tora enquanto esta situação de facto persistir.

E não se argumente com o dogma do fatalismo desta anomalia em razão da pericibilidade dos produtos e da fraca elasticidade do seu consumo, dado que as modernas técnicas de conservação e transformação de géneros, o as facilidades de exportação, podem e devem obviar a muitos desses problemas, que só ontem oram insolúveis.

A solução de todo este problema vital está há muito patenteada, na obra grandiosa do cada vez mais saudoso Ministro Linhares de Lima. que na sua genial concepção da Federação Nacional dos Produtores de Trigo nos apontou o caminho que teimamos em não seguir, e nos ensinou a lição que teimamos em não aprender.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Bastará adaptar e malcabilizar a enorme máquina burocrática constituída por grémios, comissões e juntas, articulando-a em ordem à fácil distribuição e escoamento dos principais produtos (vinhos, frutas, cereais, batatas, lacticínios e pecuária) para os centros consumidores e indústrias transformadoras, e ter-se-há resolvido o problema com eficiência e. até, com economia.

O Sr. Augusto Simões: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Augusto Simões: - Isso é consequência da nossa política do transportes, que continua a não ser feita como era necessário que fosse. Como essa política de transportes está do certa maneira traumatizada, os produtos têm necessàriamente de chegar aos centros consumidores por um preço muito elevado em relação aos centros que os produzem.

O Orador: - Se se suprimissem esses transportes através de organizações oficiais, que já existem, os produtos podiam ser mais bem pagos à lavoura.

Outro aspecto que interessará à diagnose e solução da crise agrícola é o da extensão e intensidade da intervenção oficial na actividade agrícola nacional.

Talvez que o malogro ou quase malogro de muitas iniciativas oficiais no âmbito agrícola se possa debitar à exagerada pormenorização das intervenções.

Há que distinguir cuidadosamente entre política agrária e administração agrícola.

A política agrária, que compete exclusivamente às entidades governativas, devora tão-sòmente propiciar as condições de ambiente e facultar os meios necessários ao desenvolvimento da- agricultura - mas sem estiolar o espírito de iniciativa ou coarctar a liberdade do agricultor, descendo a pormenores que só causam embaraços.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - À administração agrícola cabo a ordenação da exploração rural por forma à obtenção dos melhores resultados (através da rotação e da escolha das culturas, etc.) e deverá pertencer exclusivamente ao agricultor e nunca, pelo menos por via directa, aos organismos oficiais.

No desenvolvimento deste aspecto será pertinente ao nosso tema destacar a forma por que a burocracia oficial encara- a crise de certas regiões agrícolas e. se propõe solucioná-la.

No que respeita à Beira Alta, está já banalizada a sentença: são terras para a selva.

O pinheiro, o choupo e o eucalipto é a trindade mágica com que muitos técnicos -obcecados por uma mais que discutível orientação puramente económica - evitam problemas que os podiam obrigar a puxar pela cabeça.

Se não nos enganamos muito, este axioma rústico constitui uma das «verdades agrícolas» que nos assopram do estrangeiro; e teria sido liberalmente expendida por uma famosa missão americana que nos visitou e que , como, aliás, é já proverbial em missões americanas, teve o invulgar mérito de demonstrar que a razão assiste sempre aos outros.

E tão constantes são os Americanos em encararem os problemas pelo ângulo errado que se pode considerar infalível quem na dúvida resolver precisamente ao contrário do que eles opinam.

O Sr. Pinto de Mesquita: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça obséquio.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Queria fazer um pequeno aparte sobre um caso passado com um americano. Trata-se de um técnico americano de cuja opinião tive conhecimento através, se bem me recordo, do Sr. Engenheiro Agrónomo Costa Lima, que foi director ilustre do Instituto do Vinho do Porto. Veio esse técnico americano até nós a tratar de problemas da conservação de solo e da erosão, e parece que não era da espécie daqueles que V. Ex.ª apontou.

O Orador: - Era uma excepção, certamente.