se vê da sua parte final, mal ficaria à Câmara Corporativa não apontar imediatamente qualquer desvio ou violação que a esse preceito se pretendesse fazer.

No entanto parece que, sob este prisma, não sofre dúvida razoável a constitucionalidade do projecto. Com efeito, ele incide sobre «bases gerais de um regime jurídico» - o do uso de acendedores e isqueiros. Que o objecto desse regime jurídico seja de relativamente pequena importância, já não é relevante para o efeito de aplicação do preceito constitucional referido. A Assembleia Nacional é soberana quanto à escolha da matéria que versa legislativamente; só quanto à forma lhe impõe limitações o citado artigo 92.º Esta disposição poderá exigir a revisão de preceitos pesada e minuciosamente redigidos, como o da base II do projecto; mas esse ponto caberá melhor aquando do exame na especialidade.

Fundamentação axiológica

Quanto ao conteúdo e mérito actual E assim, encaremos o primeiro: o mérito da inovação tal como se apresenta (independentemente de como se poderia apresentar).

O conteúdo inovador do projecto assenta em dois pontos principais: Alargamento do prazo de isenção a pessoas não residentes na metrópole;

B) Atenuação das medidas previstas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros, sobretudo pela supressão da sua incidência, pessoal. A) Dado que esta finalidade inspira uma única disposição do projecto, a da base IV, reservaremos a sua análise para quando do exame na especialidade. B) A ideia, mestra do projecto, segundo parece à Câmara Corporativa, é a da atenuação, através muito particularmente da supressão da incidência pessoal (1), das medidas tomadas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros. Como tal ideia inspira quatro das cinco bases do projecto (com exclusão apenas da base IV), parece curial examiná-la nesta parte do parecer, reservada à apreciação na generalidade.

Esta linha de orientação é seguida quer quanto às medidas processuais (captura, custódia), quer quanto às próprias penas.

Assim, dispõe o projecto que o não pagamento imediato da multa só envolve captura do infractor em caso de não identificação (base II). Limita-se assim o âmbito de uma medida que, não sendo em rigor uma pena, no entanto se lhe assemelha pela imposta restrição da liberdade pessoal.

E antecipe-se desde já que parece à Câmara inteiramente de aplaudir este sistema. Mas o ponto será retomado quando do exame na especialidade da base n.

Quanto às penas, restringe-se a sua pessoalidade, quer a de origem - as multas aplicadas a funcionários públicos não são elevadas ao dobro (base v) -, quer a de incidência - as multas deixam de ser convertíveis em prisão (base I) e deixam de ter reflexos ou efeitos profissionais ou disciplinares (base III).

Parecem à Câmara de aplaudir sem reservas estas inovações.

Agora, na apreciação do projecto na generalidade, a atenção incidirá apenas sobre o que parece ser o seu objecto essencial: a abolição da incidência pessoal das medidas tomadas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros (2).

A ideia fundamental do projecto parece ser realmente a de limitar a sanção de um delito (contravenção) que lesa unicamente (e só reflexamente) os interesses patrimoniais do Estado, a medidas de natureza e incidência também unicamente patrimoniais. Bastaria este paralelismo lógico talvez para justificar o regime do projecto, mas parece à Câmara Corporativa que ele pode basear-se ainda na seguinte linha de considerações, que se procurará em seguida demonstrar mais pormenorizadamente. As penas curtas de prisão, ou as situações equivalentes, como a custódia, são de evitar na medida do possível;

B) Sobretudo no caso de crimes que poderíamos dizer de pura criação legal, como o que está em causa;

C) E designadamente tratando-se de uma infracção fiscal. Contra as penas curtas de prisão tem-se a- doutrina penalista pronunciado; e ,como a questão interessa neste ponto - a prisão por uso ilegal de acendedor ou isqueiro não pode ir além de dez dias (3) - convém examiná-la com maior minúcia, até porque parece à Câmara Corporativa que a importância do projecto vem menos das soluções em si que dos princípios que põe em causa.

Contra o sistema penal dos tempos antigos, elevaram-se no século XVIII vozes de protesto, entre ias quais se salienta a de Beccaria, em Itália.