contravenções de natureza penal, fundamentalmente (17) quando punidas com multa convertível em prisão; e infracções de natureza administrativa, quando punidas com multa não convertível. E indica a mesma portaria três exemplos de contravenções de natureza penal:

As transgressões aduaneiras (18), cuja gravidade advém do prejuízo que causam a uma economia proteccionista;

As infracções fiscais de funcionários fiscais, particularmente obrigados a absterem-se delas (19);

O uso ilegal de acendedores e isqueiros, nos termos do Decreto-Lei n.º 28219.

Salta à vista a desproporção entre a gravidade dos dois primeiros exemplos e do último. Na verdade, não descobre a Câmara Corporativa qualquer razão para considerar o uso sem licença de um acendedor ou isqueiro facto mais grave do que a maioria das transgressões fiscais, e por isso a qualificar como infracção de natureza penal, e não administrativa. O exame à luz do direito criminal e financeiro do sentido geral da inovação proposta parece assim à Câmara justificá-la inteiramente, quanto ao seu mérito actual.

Quanto ao conteúdo e em mérito potencial Mas não seria possível, para regular o uso de acendedores e isqueiros, um regime mais perfeito ainda?

Refere-se a justificação da apresentação do projecto em análise, feita à Assembleia Nacional por um dos seus autores, o Deputado Sr. Alberto de Meireles, à «circunstância de ser desconhecida nos restantes países a exigência de licença para uso de acendedores e isqueiros» (20).

Em regra, realmente, o regime é diferente em países estrangeiros (21); e um regime, muito usado nesses países, e que portanto se apresenta como possível e assim como alternativo em relação ao do projecto, é o regime da cobrança de um imposto único sobre o isqueiro ou acendedor, imposto que, como todos os indirectos, seria pago imediatamente pelo fabricante ou importador, ou pelo vendedor, mediante a aposição de um selo metálico ou contrastaria oficial, mediatamente pelo adquirente, cujo preço seria aumentado pelo mesmo imposto. Seria portanto um imposto de fabrico e importação, ou então de consumo, integrado no regime tributário especial dos flamíferos.

Esta solução é diversa, quer da vigente, quer da do projecto. Parece à Câmara Corporativa dever limitar-se a lembrá-la como possível, sem a sugerir ou defender. Na verdade, tal solução oferece vantagens, mas também inconvenientes. Tem a vantagem da maior comodidade - o adquirente do acendedor ou isqueiro paga de uma vez só o direito à sua utilização, sem se ter de preocupar com o pagamento anual da licença ou com os riscos da sua omissão, que se podem figurar como imposições de natureza pessoal, de certo modo vexatórias. Talvez tenha até a vantagem de uma maior rentabilidade - abrangerá mesmo os isqueiros e acendedores de uso doméstico, os quais, dado que aos fiscais não é permitida a entrada em casa alheia para fiscalização, hoje de facto não pagam licenças; e além disso facilita a tarefa da fiscalização e diminui assim o respectivo custo. Tem, porém, a desvantagem da onerosidade para o contribuinte: prime iro, porque o imposto único, para ser correspondente (22) ao valor do anual (mesmo tomando em linha de conta a duração provável dos objectos), terá forçosamente de ser relativamente elevado, elevado sobretudo em relação ao custo do próprio objecto (aliás, de forma alguma indispensável e cuja venda e consumo fortemente se ressen-

Rosa, «Natureza Jurídica das Penas Fiscais», in Boletim da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos n.º 19, pp. 1269 a 1277, n.ºs 20-21, pp. 1571 a 1575, n.º 22, pp. 1759 a 1770; Dr. Mouteira Guerreiro, «Em torno da Infracção Fiscal», in Ciência e Técnica Fiscal n.ºs 37-88, p. 129; Vítor da Silva Garcia, «A Infracção Fiscal», in Ciência e Técnica, Fiscal n.º 46, p. 512; Domingos Martins Eusébio, «Subsídios para Uma Teoria a Infracção Fiscal», in Ciência e Técnica Fiscal n.º 55, pp. 127 e 128. «A multa fiscal é assim uma pena não criminal» - Dr. Cortes Rosa, 06. cif., p. 1273; cf. Prof. Cavaleiro de Ferreira, Direito Penal, vol. n, p. 162.

(17) A portaria indica como característica da contravenção fiscal de natureza penal a intransmissibilidade aos herdeiros da multa correspondente antes do trânsito em julgado da sentença que a imponha.

(18) Artigos 11.º, 50.º, 51 .º p 151.º do Contencioso Aduaneiro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 31 664, de 22 de Novembro de 1941.

(20) Diário das Sessões, 1964, p. 2935.

(21) Mas em Itália, um decreto-lei de 11 de Junho de 1956 substituiu o direito único sobre o isqueiro por um direito anual a cargo do utente ou detentor, pago mediante a aquisição de um selo «que o utente pode aplicar sobre o aparelho ou sobre um qualquer documento de identificação pessoal» - Benato Alessi, Monopoli Fiscali, Impaste di Fabricazione, Dazi Doganali, Turim, 1956, p. 232.

(22) Parece à Câmara Corporativa que seria inconstitucional, por força da parte final do artigo 97.º da Constituição Política, um projecto de lei abolindo a licença de isqueiro, será, criar uma fonte de receita em princípio equivalente e compensatória.