Aprendi muito, e verifiquei que se manifestava aí uma vontade firme, determinada, de quebrar o imobilismo em que tem vivido a economia regional.

Vozes:. - Muito bem!

O Orador: - Um grupo de voluntários organizado pelo Eng.º Camilo de Mendonça, com quem não gasto adjectivos porque prefiro prestar homenagem ao seu trabalho, propôs-se oferecer a todo o Nordeste uma visão sobre o futuro daquelas terras, partindo das realidades presentes, combinando as forças, retemperando as energias e esquecendo os malefícios.

Todos os problemas concernentes ao desenvolvimento regional do grande quadrilátero do Nordeste, desse quadrilátero que preenche nada menos que uma quinta parte de Portugal continental e oferece ao País só metade da sua energia, foram tratados com suficiente amplitude para se lhes medir a grandeza, sem fantasias, nem ambições desmedidas.

Era preciso acertar o passo, deixando cair a lanterna encarnada desse tal chamado subdesenvolvimento que as estatísticas oficiais e oficiosas dos entendidos nos dependuraram ao pescoço e erguer a lanterna verde da nossa esperançosa ruralidade, com a qual ainda somos capazes de anatematizar a cidade monstruosa - não me refiro à formosa cidade de Lisboa, que nos recebe e encanta, nem talvez ao Chiado, de que tanto gosto e muito castigado é de calúnias.

Refiro-me directamente a quantos, por pecado de acção ou omissão, contribuem para as graves carências, para as imensas dificuldades da gente do campo.

Não sei se sabem que na minha terra se celebra regularmente a festa de S. Bartolomeu santo que deu o nome à magnífica pousada de Bragança e que é, no dizer autorizado do grande Camilo Castelo Branco, «um santo gravemente infesto a Satanás».

O Sr. António Santos da Cunha: - Mais do que o S. João!

O Orador: - Sim. E sem festa. O anátema é o resultado fatal daquela grave tensão entre a cidade e o campo que o Sr. Deputado Amaral Neto aqui nos descreveu com tanta elegância e tanta justeza.

Não vou hoje retomar essa tensão, nem abrir outra entre o interior e o litoral ou ainda outra mais pertinente ao turismo, qual seja a da montanha e do mar.

Venho cheio de propósitos generosos e só quero contribuir para aproximar, para ligar, para atravessar, a terra portuguesa do oriente para o ocidente, seguindo o caminho da luz.

Enquanto as correntes turísticas são dirigidas para as águas cálidas do Algarve, a montanha, sem inveja do mar reserva- a sua intimidade, a sua calma, a sua autenticidade, para receber os algarvios e os portugueses e estrangeiros que tenham apurado sentido de beleza e queiram descobrir o mais ignorado canto desta terra, a sua paisagem telúrica e humana.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para tanto bastará completar a rede de pousadas e hotéis, cuja falta os serviços oficiais do turismo perfeitamente conhecem, e acabar a rede de estradas, cujo traçado também os serviços prestigiosos da Junta têm estudado e sabido. Planos não faltam.

Estes problemas já não são hoje problemas de governo.

Pois a bússola do turismo tem o ponteiro voltado para as praias de águas quentes, enquanto a montanha assiste, na sua serenidade olímpica, a esta diversão dos homens e, entretanto, guarda os seus encantos e os seus tesouros para quantos procurem aquelas paisagens que sempre se situaram a um nível bastante superior ao das águas do mar ...

Se o vinho verde ferve é porque é da sua natureza ferver e picar ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Ora, como, vínhamos dizendo, apurados ainda mais os estudos do nosso desenvolvimento regional, desenvolvimento que o Sr. Deputado Nunes Barata concebe como directamente relacionado com o do turismo, chegou-se à conclusão do que há um problema que sobre todos interessa considerar, porque é o eixo onde trabalha todo o Nordeste.

Esse problema descobre-se facilmente logo que se abre o mapa.

Mete-se pelos olhos dentro que o rio Douro domina, caudalosamente, com a forca da própria força todo aquele território.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - As terras altas - terras velhas e firmes, porque emergiram primeiro e não as sentimos tremer-, a terra fria transmontana, a terra fria beiroa, ou beira transmontana, encerram e acarinham numa taça ciclópica a terra quente.

O Douro é o traço de união, ligando as margens, as culturas, os interesses, a paisagem e os homens.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Por imposição da geografia, a província de Trás-os-Montes e Alto Douro é uma realidade que os sábios, com seu geometrismo no espaço, não podem desconhecer, nem a Administração ignorar.

Na hora em que se programa um desenvolvimento que tem de comprometer as economias locais numa organização solidária e eficiente, o Douro é o eixo, a estrada, o caminho, o nervo desse desenvolvimento, o transporte barato.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E sobre o aspecto turístico temos de raciocinar, segundo creio, em termos mais amplos e compreender num mesmo grande cartaz todo o Norte, com a plenitude da sua «graça amorável», desde o Alto Minho ao Alto Douro, desde o vinho verde ao vinho fino.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Turisticamente a grande mancha do cartaz está feita - é ali o país do vinho.

E a estrada do vinho é o Douro.

Todo o mundo conhece o vinho do Porto, há apenas que o servir en su tinta, nos próprios barcos rabelos.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Águedo de Oliveira, numa formosa página, nunca esquecida, afirma com a segurança e firmeza habituais: «Baco plantou ali o seu tirso».