E depois canta o Douro, o «Douro celebrado» de Camões, recolhendo as falas de Estrabão, de João de Barros, de André de Resende, de Manuel Faria de Sousa e de António de Sousa Macedo, e canta-o inspiradamente.

Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados: é preciso aproveitar o Douro em todas as suas potencialidades, esgotar os seus recursos e completar os aproveitamentos hidráulicos já realizados ou previstos, de forma a retirar desses investimentos todo o rendimento desejável.

Já tudo foi estudado por ordem do Governo, e, feitas as contas, o acréscimo das despesas da navegação do Douro e da sua transformação numa via fluvial aberta à utilização dos barcos de grande tonelagem, desde o Pocinho ao Porto, deve custar sensivelmente o mesmo que custou a linda ponte da Arrábida, com os seus 10 km de auto-estrada.

O Sr. António Santos da Cunha: - Só isso?

O Orador: - Disseram-no os entendidos nessas contas. O- Governo da Nação, que lançou essa ponte e agora constrói a do Tejo. não pode hesitar em pôr a navegação no rio Douro.

O Sr. Amaral Neto: - Haverá possibilidade de cobrar portagem numa navegação fluvial do Douro?

O Orador: - Certamente. O Douro é uma estrada verdadeira e natural, com 172 km de navegação assegurada, servindo os interesses do 40 concelhos dos distritos do Porto. Vila Real Bragança. Aveiro, Viseu e Guarda, abrindo as mais largas perspectivas de ligação com a Espanha, em conformidade com a Convenção do 31 de Agosto de 1885.

O turismo de Espanha pode desaguar na capital do Norte. Creio que não haverá cenário mais grandioso na terra portuguesa nem melhor recepcionista do que o vinho do Porto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Douro agrícola é a epopeia do trabalho português, e Ramalho Ortigão, esse viajante infatigável que tinha olhos para ver e sensibilidade para medir os homens e as paisagens, chama-lhe apenas «um deslumbramento».

O Sr. António Santos da Cunha: - E é-o de facto.

O Orador: - Podemos, portanto, consentir que os turistas tomem a sua caneca de vinho verde, para refrescar, sob as ramadas minhotas, mas todo o Norte, onde nunca se apagou o respeito pela hierarquia e pela grandeza e onde existe um apurado sentido de quanto toca aos mais altos interesses nacionais, há-de convir que a navegação do Douro não pode circunscrever-se à acanhada perspectiva do escoamento do ferro de Moncorvo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de um problema nacional, quer se olhe pelo lado negativo do desperdício do condicionalismo favorável que lhe está criado pelas águas dos aproveitamentos já realizados, quer se afronte pelo lado positivo dos novos investimentos do Douro nacional.

A navegação do rio é elemento-base do desenvolvimento económico de um vastíssimo interland.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Espero poder tratar novamente deste assunto no debate sobre as contas públicas, mas não posso deixar de afixar desde já este grande cartaz do turismo do Norte - o país do vinho -, colocando o rio Douro no lugar que lhe pertence e que o poeta lhe deu:

Eu sou o Douro famoso,

Sou mais que o Tejo orgulhoso,

Mais que o Minho poderoso,

Sou das torrentes o Bei.

... Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nós não podemos ficar eternamente a recitar versos ao rio e à montanha, a cantar as alegrias do vinho novo e a admirar as nossas próprias estruturas sociais, que são de paz e de concórdia.

Precisamos de as fortalecer, e para tanto não nos podemos dispensar de proclamar desta tribuna a necessidade imperiosa de conceder prioridade aos investimentos que contribuem para que os portugueses das zonas rurais mais desfavorecidas sejam trazidos ao nível económico que de direito lhes pertence.

O turismo também se faz de sorrisos.

Não precisa o povo do Norte de grandes riquezas para cantar e para sorrir, rnas precisa daquela honrada mediania em que assenta a alegria- de viver.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - «De la panza viene la danza».

Eterna lição do «Rifonero», que é fonte de larga sabedoria .

Ao fim e ao cabo disse uma palavra sobre a paisagem humana das terras altas e frias e outra de ajuda a pôr os barcos no rio.

Quando subirmos o Douro, veremos, lá ao fundo, os amendoais em flor e por todo o caminho aquela obra-prima em que, manifestamente, colaboraram os deuses.

Foi ali que o lavrador português mediu as suas forças com a Natureza e venceu.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Baptista Felgueiras: -Sr. Presidente: no prosseguimento do debate generalizado de que está a ser objecto o aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Barata sobre o turismo nacional tem-se vindo a construir nesta tribuna, pouco a pouco, com as intervenções dos Srs. Deputados que se interessaram pelo problema, um maravilhoso mosaico, cujas pedras são os pedaços da beleza com que a Providência dotou generosamente a nossa terra e valoriza e enriquece tantas das suas regiões.

A par disso, aqui têm sido expostas as necessidades e soluções que importa considerar em relação ao fenómeno turístico, quer no plano nacional, quer no âmbito peculiar a cada região do País.

Já dois dos meus colegas de círculo trouxeram ao debate o seu contributo autorizado e valioso. Mas não quero deixar de trazer também uma pedra para a composição do quadro, ainda que descolorida e sem relevo, e de salientar algumas necessidades e aspirações concretas do meu distrito que se podem encarar do ponto de vista turístico.

O distrito de Viana do Castelo é um dos mais belos recantos do Mundo em que vivemos. Abraçam-no dois rios formosíssimos, o Lima e o Minho. Qual deles sobreleva o outro em encanto, não será fácil dize-lo, e melhor será, portanto, deixar o problema em aberto e a rivalidade de pé.