O Orador: - Pois havia porventura de o simples correr do tempo legitimar a usurpação e absolver o usurpador? Pois havia de a distância do tempo, que é a que mais depressa se vence, diminuir a eloquência dos factos e atenuar a sem-razão dos escribas que erigiram o esbulho em fundamento de soberania? E havia de o tempo habilitar ao cómodo esquecimento uma opinião internacional já de si tão propensa a dar quitação de seus escrúpulos pelo compromisso ao silêncio apaziguante? Não.

Como sob a palavra de Albuquerque ao Idalcão, assim pela voz dos Portugueses de hoje cumpre dizer a este silêncio cúmplice que «com ele não teremos paz nenhuma» senão sómente se ele falar pelo portuguesismo de Goa!

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Nem em tal circunstância pleitearemos por causa exclusivamente nossa, já que se afigura universal o interesse em não deixar consolidar situações de desrespeito a valores, como a normal convivência dos Estados e a boa vizinhança dos fronteiriços, que todos os estadistas mais ou menos aclamam na fácil homenagem de alguns discursos e pelos quais bem poucas nações sacrificam as doçuras de Cápua das suas beligerâncias em guerra fria ...

Sr. Presidente: Mas outro motivo, tamanho, concorre para que nos não dispensemos de anualmente, por acto de reflexão, e a todo o instante, por protesto de vigilância, reevocarmos o primeiro passo do martírio dos Goeses.

Esse motivo, Sr. Presidente, é a fidelidade que eles demonstram e que ao menos merece paga de igual por igual; tão certo que o professarmo-nos seus irmãos não nos custa mais do que sentir mais viva a dor do membro decepado no corpo da Pátria e na atitude recíproca se supõe iminente o risco das perseguições, dos vexames, dos cárceres e exílios. Constitui, assim, ponto de honra não nos deixarmos ultrapassar em manifestações positivas, já não digo nos gestos difíceis., da fraternidade lusíada.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Dizem que os povos não têm memória. Não na têm, eu creio, para os males que os apoquentaram e cujo regresso, efeito de causas persistentes, às vezes não prevêem ou descuidosos desaprenderam de indesejar.

Todavia, acompanha-os nos paroxismos da tormenta a boa memória de quando, apesar de tudo, o mar era chão e o vento soprava bonançoso. Vai desta sorte, pelo que sabemos, o estado de espírito dos goeses acorrentados, cujas recordações de antes do cativeiro se chamarão na língua própria ou no sentir comum, portuguêsmente, saudades da relativa ventura perdida.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Pensando neles, talvez nas desaproveitadas ocasiões de mais nos aproximarmos e mutuamente servirmos, tenhamos a viril coragem de não ceder à lembrança do infortúnio, mas também de nos não acomodarmos ao triste sossego das situações pretensamente irremediáveis.

E uma vez que só por vício de expressão, se não por um erro de conceito, afirmaríamos que nos identificamos com os nossos, sendo eles mais exactamente «alguns de nós», nenhum poder estranho bastaria para impedir esta natural e necessária solidariedade no sofrimento que perdura.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quebrá-la por vontade livre seria então mais e pior do que um desnaturamento: havia de parecer uma aberração.

Sr. Presidente: O meu mais seguro motivo por poucas palavras o direi.

Goa, Damão e Diu doem e resistem. Temos de encher a alma com a certeza de que tal não acontece em vão. Temos de abrir à inteligência todas as perspectivas de luta que o simples facto da nossa razão oferece. Temos de armar a vontade para a força do nosso direito.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - As recordações dolorosas como as de 18 de Dezembro, essas nos ajudam e incentivam na medida em que, para além do instante passageiro dado ao poder da iniquidade, soubermos ver o tempo prometido à esperança doa Portugueses.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - A esperança é virtude cristã, reconfortante e afirmativa. Deus nela revela sempre como penhor e como prenúncio de vitória.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: -Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Está em discussão na especialidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1965.

Vou pôr em discussão o capítulo 1, constituído pelos artigos 1.º e 2.º, que vão ser lidos.

Foram lidos.

Artigo 1.º É autorizado o Governo a arrecadar em 1965 as contribuições e impostos e demais rendimentos e recursos do Estado, de harmonia com os princípios e as leis aplicáveis, e a empregar o respectivo produto no pagamento das despesas legalmente inscritas no Orçamento Geral do Estado respeitante ao mesmo ano.

Art. 2.º Durante o referido ano ficam igualmente autorizados os serviços autónomos e os que se regem por orçamentos cujas tabelas não estejam incluídas no Orçamento Geral do Estado a aplicar as receitas próprias no pagamento das suas despesas, umas e outras previamente inscritas em orçamentos devidamente aprovados e visados.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vão votar-se os artigos 1.º e 2.º

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vou pôr agora em discussão o capítulo II, constituído pelos artigos 3.º, 4.º e 5.º Vão ser lidos.