O Orador: - Por essa razão, para da relevo à outra faceta que a excede, não duvidou o Governo em ligar indissolùvelmente a propriedade à gerência da farmácia.

E não se diga que constitui inovação tendenciosa ou doutrina despida de interesse para os nossos dias a orientação acolhida na proposta governamental.

Cada vez com maior insistência, organismos nacionais e internacionais advogam novos rumos que devem ser garantidos à farmácia. Desde a Organização Mundial de Saúde aos departamentos de saúde pública, desde os congressos internacionais às jornadas farmacêuticas portuguesas, invariàvelmente se vai propugnando pela necessidade, cada vez mais instante, da coincidência da propriedade com a gerência.

Note-se que até nos países de radicada tradição liberal da propriedade da farmácia se avolumam grandemente as reacções contra o que está estatuído, sem que, todavia, o fenómeno contrário se verifique nos países onde o princípio oposto vigora.

Portanto, e pela lógica das considerações anteriores, entendo que presidiu à proposta do Governo, da autoria do Ministro Martins de Carvalho, criteriosa finalidade de fazer evoluir a farmácia nos novos moldes que hoje se lhe exigem.

Acrescem às razões explanadas outras mais, que representam importantes aspectos de interesse público.

Cumpre salientar a necessidade de prestigiar o curso de Farmácia e dar incentivo à sua frequência como processo único de constituir um verdadeiro escol profissional. Fàcilmente se compreenderá que a livre propriedade da farmácia é poderoso factor em contrário.

Não quero deixar de transcrever o Prof. Doutor Correia da Silva, autorizadíssima voz em deontologia farmacêutica, que afirma

A direcção técnica efectiva do farmacêutico só existirá se o farmacêutico for ao mesmo tempo, proprietário da farmácia. Todas as vezes que a propriedade pertencer a um não farmacêutico, mesmo que o farmacêutico esteja presente, a sua liberdade está comprometida.

A saúde pública exige que entre as duas direcções, económica e técnica, seja a direcção técnica que prevaleça. Isto admitindo que as duas direcções coexistem, porque a experiência ensina e a estatística confirma que quando a propriedade da farmácia é de um não farmacêutico, a direcção técnica do farmacêutico é, na maioria dos casos, dispensada. De resto, para falar mais cruamente, o ponto a atingir é dispensar pràticamente o farmacêutico.

A defesa da saúde pública julgo só poder ser assegurada quando, efectivamente, seja o farmacêutico a presidir não só na oficina, como também na entrega dos medicamentos solicitados.

O que venho de dizer são apenas os aspectos fundamentais e decisivos para acreditar como mais válido o princípio da propriedade exclusiva da farmácia para os farmacêuticos.

Entendo ser impossível, dentro do princípio oposto, salvaguardar devidamente o interesse público resultante de cada um dos pontos focados.

Triste é constatar, porém, que a intenção que informou aquele projecto de diploma legal não tivesse encontrado, na Câmara Corporativa, auditório suficientemente preparado para o analisar.

Vozes: - Muito bem!

que transcendeu o âmbito de um estudo crítico, vindo a constituir valioso subsídio para a resolução do problema legislativo da farmácia portuguesa.

Não resiste o parecer da Câmara Corporativa ao estudo do Doutor Braga da Cruz. Como, aliás, não alcançara mérito aos olhos de quem lhe dedicasse cuidadosa leitura. São palavras do Prof. Braga da Cruz.

Somos de parecer que o articulado do projecto do proposta de lei do Governo, com alguns retoques e com pequenos acrescentamentos, merece inteiramente ser convertido em lei pela Assembleia Nacional.

Assim o entendeu também o Governo Daí nova proposta subscrita pelo Ministro Neto de Carvalho, no relatório da qual expressamente se diz.

A Câmara Corporativa manteve-se fiel ao princípio da indivisibilidade, mas introduziu-lhe excepções tão numerosas e profundas que praticamente o tornam inoperante, impedindo que se alcancem os objectivos de interesse público que o diploma tinha em vista.

O novo texto agora presente à Assembleia Nacional reflecte os mesmos anseios, a mesma orientação, procura atingir as mesmas finalidades, que a proposta de 1962. Apresenta ligeiras modificações, que o valorizam, em parte, mas lhe podem desvirtuar o sentido.

Apesar disso, entendo não dever deixar de lhe dar, na generalidade, plena aprovação.

Não quero terminar estas modestas considerações sem deixar bem expresso o meu profundo regozijo pela esclarecida visão dos dois titulares da pasta da Saúde e Assistência e, do mesmo modo, apoiar o Governo pela atenção prestada a este momentoso assunto, que o interesse público perfeitamente justifica.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Costa Guimarães: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando se anunciou a discussão da proposta de lei da propriedade da farmácia, hesitava sobre se valeria a pena trazer ao debate, onde sabia que não deixariam de proferir-se esclarecidos depoimentos, um modesto exteriorizar da minha sensibilidade e das minhas preocupações quanto aos pontos mais delicados da questão, em atitude fundamentalmente ditada por natural reacção a determinados aspectos que, entendo, não podem ser olhados apenas pela justeza de rígidas normas jurídicas, ma