regulamentar, tornando-se iníqua e sentimento do sentimento de justiça comum» (sic!).

E acrescenta o referido parecer que «perante essa indesejável realidade, e como que por força de um fatalismo cosmológico de justiça, ou a lei deixa de ser aplicada em todo o seu rigor, mercê de a Administração ser dominada por humano sentimento de brandura, ou os seus destinatários descobrem engenhosa e fraudulenta formal de lhe mitigarem os rigores».

O Sr. Nunes de Oliveira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz obséquio.

O Sr Nunes de Oliveira: - Mas afinal essa situação está criada em relação a quem? Aqueles intrusos que se intrometeram na farmácia e que nada tinham a ver com ela. Houve uma intromissão de estranhos à profissão e eles é que são culpados da situação que criaram.

O Orador: - Não há intromissão sem haver um consenso da Administração. Não me vá V. Exa. dizer que o exercício da profissão farmacêutica se faz na clandestinidade.

E porque, diz o parecer, «qualquer destas atitudes, e ambas se verificaram na aplicação do Decreto-Lei n º 23 422, é indesejável e deve ser evitada, para valorização de direito e prestígio dos poderes da Administração».

Contudo, a proposta de lei em discussão outra coisa traduz do que a ratificação plena do referido Decreto-Lei n.º 23 422, apesar da triste experiência de longos anos dolorosamente vivida pelas famílias lesadas pelos efeitos lógicos do clima moral que tal lei gerou mesmo antes de ser publicada e que levou precipitadamente os proprietários a relegar em nome de farmacêuticos diplomados as suas propriedades de farmácia, tal o pânico suscitado numa instintiva e humana reacção pela sobrevivência própria e da família!

O Sr. Nunes de Oliveira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz obséquio.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Qualquer cidadão tem liberdade de acesso a uma Universidade para tirar o respectivo curso. Parece mais lógico seguir-se esse caminho querer atingir determinadas posições servindo-se de atalhos. O caminho certo, o rumo direito, é apenas este, o Estado confere a todo o cidadão liberdade de inscrever-se numa Faculdade para tirar o seu curso.

O Orador: - Aquilo de que estou a tratar é do direito de propriedade.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Estou a compreender perfeitamente.

O Orador: - Ainda bem.

Apesar das conclusões a que chegou a Direcção-Geral, de Saúde, que em documento inserto no Diário Ilustrado, segundo li no jornal Diário da Manhã de 28 de Dezembro findo, confessou que «cedo se verificou que a rigidez do citado diploma se não ajustava à multiplicidade das situações criadas pela vida. Que se impunha ter presentes os interesses dos herdeiros do proprietário falecido, contra eventuais entendimentos de terceiros, só em aparente cumprimento das finalidades legais» (ipsis verbis).

Não pode deixar de impressionar profundamente estoutra declaração da Direcção-Geral de Saúde, a que o Diário da Manhã faz referência que ela, a Direcção-Geral de Saúde «deixou pràticamente de exercer nesta matéria qualquer espécie de acção coerciva»!

O Sr Nunes de Oliveira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Há confusão da parte de V. Exa. na interpretação desse comunicado da Direcção-Geral de Saúde, que apenas refere especificamente uma certa benevolência que houve em relação às viúvas e aos herdeiros legitimários, e não em relação àqueles que iludiram fraudulentamente a lei vigente. São duas coisas distintas.

O Orador: - Eu penso que interpretei bem esse comunicado.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Posso garantir a V. Exa. que é como eu digo.

O Orador: - Estou a referir-me a lei morta que, ao cabo de 80 anos, não conseguiu fazer-se impor. E a autoridade que tinha de a fazer executar vem agora confessar que não lhe foi possível materialmente fazê-la impor.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Mas é a lei vigente.

O Orador: -Quando a lei não se faz impor, caduca.

É um princípio de direito a que não podemos fugir.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Mas V. Exa. não pode afirmar que a lei não se cumpre. Há uma larga percentagem em que ela foi cumprida.

O Orador: - Tudo quanto tenho lido da Câmara Corporativa, das afirmações feitas aqui, me diz que a Administração tem responsabilidades, que houve desleixo e que, no fundo, a lei não teve execução.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Houve incúria relativamente àqueles que estão fora da lei Mas a lei teve efeitos positivos relativamente àquela grande percentagem que está dentro da lei.

O Orador: - Refiro-me à ineficácia da lei, que é evidente e reconhecida por todos.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - A ineficácia pode sei total ou parcial, e neste caso é evidente que é uma ineficácia parcial.

O Orador: - Em face do que tenho lido, verifica-se que há uma situação deplorável . .

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Mas isso não lhe dá direito de reputar a lei como morta Para estar moita era preciso que não estivesse nenhuma farmácia dentro da lei, como está, dando, portanto, a certeza de que a lei está viva.

O Orador: - Quando a lei não tem força para se fazer cumprir, dizem os juristas que ela morre por si.

V. Exa. está a defender o seu ponto de vista, eu defendo o meu. Julgo, pois, que a Câmara já está esclarecida.