cerrai fileiras para uma luta de vida ou de mor necessário preparar os que ficam e os que emigram para esse choque psicológico de mentalidades e de que a ressaca da vaga migratória causará num futuro próximo»

Quem poderá dizer que assim não é, que o reflexo descristianizador que dessa ressaca advirá pode o sentir do nosso povo, se desde já a Igreja e o Estado, volto a repeti-lo, porque a tarefa é comum e a ambos pertence, não fizerem tudo quando em si caiba para se salvar o sentimento religioso e lusíada do nosso trabalhador emigrado.

Em França, para 150 000 emigrantes, contam-se apenas 5 padres portugueses. Em Paris contam-se 80 000 portugueses e dispomos apenas de 2 sacerdotes da benemérita missão católica a cargo dos padres da Congregação do Coração de Maria.

A emigração clandestina é verdadeiramente desastrosa e chega-se a perguntar se não seria preferível fazer como na vizinha Espanha, onde os passaportes de turismo são facilitados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Seria uma maneira de, automaticamente, destruir a organização clandestina com todo o seu cortejo de injustiças e opróbrio.

O Sr Martins da Cruz: - Muito bem!

O Orador: - O trabalhador seria livre na sua reflexão e espontâneo na resolução da partida e não partiria fortemente empenhado, e muitos deles voltariam prontamente ao depararem com o panorama que os espera, o que, assim, não podem fazer com medo às lógicas consequências penais e ainda porque lhes falta o dinheiro para pagar aos engajadores, que lhes tiraram a última camisa do corpo, como é uso dizer-se.

Vozes:- Muito bem!

O Orador: - Quebrar-se-ia ainda o messianismo, enfim, deixaria a emigração de ser o fruto proibido que se Conhecemos as fortes implicações que o problema pelo que nos limitamos a pô-lo perante o juízo sereno dos responsáveis.

Sr Presidente O nosso trabalhador, ao chegar a França, vê-se geralmente perante uma situação angustiosa ignora a língua, o ambiente, que lhe é hostil, e encontra muito piores condições de alojamento do que as que tem aqui. Depressa cria um complexo de inferioridade, um estado de constante depressão. Uma ânsia o domina, para outra coisa não foi lá ganhar dinheiro, pois precisa de pagar a dívida que criou para poder partir, e o que procura é entesourar o mais que possa. Torna-se assim numa máquina de trabalho. Horas suplementares sem qualquer preocupação de saúde ou de repouso. Os que emigraram clandestinamente, e são mais de 65 por cento, têm ainda na alma o amargor do que passaram em viagem, das injustiças e maus tratos que sofreram.

Mais do que as doutrinas subversivas que lhe incutem, esta situação destrói nele toda a riqueza humana que possuía.

No aspecto moral, embora o emigrante casado mantenha geralmente uma preocupação de fidelidade à família, vão aparecendo casos de lamentável abandono familiar. Aos jovens abre-se uma, vida licenciosa cujas consequências são manifestas.

A mulher, essa, é quase sempre infeliz. A mulher casada sente-se longe dos seus filhos e do seu próprio marido, senhores de uma nova mentalidade, que ela geralmente não assimila. Quanto às raparigas, é ínfima a percentagem das que se conservam dignas.

Perante tão desastroso quadro, de que dou apenas leves traços, escuso-me de afirmar, mais uma vez, o quanto é fácil a esta gente perder o contacto com a vida cristã, e esta é o grande esteio do seu portuguesismo.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Brilhante de Paiva: - V Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz obséquio.

O Sr Brilhante de Paiva: - Tenho estado a escutar as considerações de V Exa. não apenas com o raciocínio, porque elas merecem o aplaudo entusiástico de quem tenha amor aos seus compatriotas, que vão constituir lá fora famílias que não são portuguesas Parece-me que é esse o ponto crucial Não há igrejas, não há escolas, para manter dentro do patriotismo essas famílias emigradas Também a protecção familiar não existe.

Por esta razão eu sinto as palavras de V Exa. com dobrada comoção e não quero deixai de novamente felicitar V Exa. pelas considerações que vem fazendo.

O Orador: - Muito obrigado a V Exa., e apenas quero dizer porque se trata de famílias que lá fora vão constituir outras de natureza diferente. Devo dizer que na Alemanha ainda é pior, porque não deixam ir para lá as famílias.

O Governo tem de olhar para o problema, que é da maior gravidade

S. Exa. Revma. o Sr Arcebispo Primaz deslocou-se propositadamente a Paris para presidir a uma reunião que, na segunda-feira de Páscoa, se realizou na Missão Católica da capital da França.

O coração do prelado bracarense veio enternecido com o espectáculo que lhe foi dado ver o amor à Igreja e à Patuá naqueles milhares de homens e mulheres que em seu redor se ajuntaram em grande parte oriundos da sua arquidiocese. Por outro lado, o seu coração de pastor alvoroçou-se sofredoramente ao ver que eram quase nulos os meios de que a Missão dispunha para fazer face à situação que se lhe deparava. Urge que, ao lado das Missões, se criem secretariados sociais e centros de alojamento que possam resolver os inúmeros problemas que diariamente se apresentam, com os mais variados aspectos.

Sr Presidente Um problema que merece também especial atenção é o da criação de escolas que contribuam não só para que o nosso emigrante atinja o mínimo de preparação que não nos envergonhe e lhes facilite a vida, como também para educar as crianças portuguesas em idade escolar, que depressa esquecerão a nossa língua e ficarão sem o mais pequeno conhecimento da nossa história e da nossa geografia