O Sr Sales Loureiro: - V. Exª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr Sales Loureiro: - Estou a seguir com muita atenção o brilho do pensamento da exposição de V. Exª Dou inteiro acordo e aplauso à ideia que V Exª expende de que o novo sistema tem de ser misto, para se ajustar, no domínio dos factos, ao domínio das ideias, num sistema como o nosso, de ética corporativa Reforço e louro muito o pensamento de V Exª.

O Orador: - Muito obrigado Vou seguir apresentando mais alguns exemplos que justificam o meu ponto de vista em assunto tão candente e de tão grande importância.

Pausa.

O Orador: - A recente lei espanhola de segurança social, de Dezembro de 1963, estabelece como limite o fim do ano coerente para a transferência da gestão do seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais paia o Instituto Nacional, para as mutualidades laborais ou para as mútuas patronais, no caso de as empresas não quererem assumir, por si, a responsabilidade dos acidentes ou doenças profissionais.

Mais uma vez o país vizinho e amigo nos dá um grande exemplo de liberalização condicionada, emando um instituto regulador das actividades deste géneio

E certo que não é função específica do Estado a actividade de entidade segui adora, a não ser que as actividades particulares, de qualquer modo, lesem os interesses do indivíduo ou da colectividade Cumpre-lhe aqui mais a função de tutelar do que de suprir uma actividade já existente no País, de largas tradições e de bons serviços prestados na sua generalidade

Acautelar interesses criados, dar vida a instituições existentes, será bem melhor do que desfazer o que já está feito para criar de novo A destruição é sempre um perda irreparável, só se justifica quando o que existe é incapaz de cumprir A nacionalização torna o indivíduo cada vez mais dependente do Estado, criando uma dependência nociva à defesa da própria dignidade do indivíduo Precisamos de pensai sempre que, como já se disse, o homem só defenderá, verdadeiramente, a sua sublime dignidade quando deixar de tentar fazer do Estado o seu paraíso na terra Não o empurremos, por isso, para um paraíso que não deseja e que é contrário às suas naturais inclinações - que o não podem encaminhar se não para o fim superior e eterno para que foi criado.

Na sua memorável intervenção dentro desta Assembleia, quando se discutiu o Estatuto da Saúde e Assistência, depois de ter citado a opinião do Prof Doutor Marcelo Caetano expressa no parecei de que foi relator da Câmara Corporativa acerca do anterior estatuto, o antigo Ministro e ilus tre Deputado Dr. Veiga de Macedo afirma ser de prever que a cobertura dos riscos do desemprego involuntário e dos acidentes e doenças profissionais acabe- por ser feita através do seguro social.

O Sr Sales Loureiro: - Muito bem!

O Orador: - Parece-me, pois, que em Portugal deveríamos admitir um sistema misto que permitisse a existência de um organismo de previdência que, em regime de livre concorrência, pudesse servir de padrão regulador, quer dizer, quanto a mim, a Caixa Nacional de Seguros das Doenças Profissionais deveria admitir também o seguro dos acidentes de trabalho.

A responsabilidade económica que envolve o aspecto do alargamento das definições expostas na proposta de lei apresentada pelo Governo, e que tantas preocupações parecem ser traduzidas no parecei da Câmara Corporativa, parece não merecei mais do que uma palavra de análise.

É evidente que o Governo deve ter acautelado o estudo económico do problema, pois seria inconsequente apresentar um projecto de lei sem que as suas possibilidades de êxito fossem, pelo menos, postas em equação Salvo o devido respeito pelo douto parecer da Câmara Corporativa, parece que foi exorbitante a afirmação do agravamento de taxas que resultará da ampliação dos benefícios agora propostos Mas, mesmo que tal agravamento se desse, o facto é que corresponderia sempre a um benefício social, mais do que isso, a um benefício daqueles a quem o trabalho privou de poder ganhar o pão para si e para os seus

Mas não há que temer repercussões financeiras, que cairão sobre as entidades seguradoras O assunto foi devidamente ponderado pelo Governo e o agravamento de taxas, se o houver, não irá além de 0,2 por cento De resto, a Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais e várias disposições legais, uma e outras devidas à iniciativa do nosso digno colega Dr. Veiga de Macedo, vieram diminuir os perigos de risco de uma maneira notável, com benefício evidente para as entidades seguradoras

Mas nunca isso poderá ser tomado em conta para diminuir as garantias que é de justiça oferecer ao trabalhador Em primeiro lugar, a cobertura dos riscos do trabalho, que terá de ser, de acordo com o espírito e com o projecto do Governo, ampla e definitiva.

Tudo o mais é acessório e não pode ser tomado em conta para diminuir os direitos de quem trabalha.

Neste ponto de tão grande importância na ordem humana e social, e mesmo até com aspectos e reflexos na ordem económica, não podia também a Igreja deixar de fazer doutrina verdadeira é justa.

Sem me querer alongar nas citações de documentos pontifícios aplicáveis, não quero deixar de frisar o aspecto geral da encíclica Mater et Magistra do Papa João XXIII, de saudosa memória, que apresenta a organização de seguros sociais como um dos factos mais gratos ao seu coração verificado em todas as organizações sociais evoluídas

Mas já Pio XII, na encíclica Dium Redemptons, afirmava que não se cumprirão suficientemente as exigências da justiça social «se não se tomam precauções certas a favor dos operários por meio dos seguros públicos ou privados para o tempo da velhice, da doença e do desemprego forçado»