a um rico entrar no reino dos céus do que fazer um camelo passar pelo fundo de uma agulha.
O Sr. Deputado Gonçalves Rapazote afirmou que a segurança social data da era anglo-saxónica. Que nasceu da Carta do Atlântico, o que não disse foi o que era essa segurança social. E isso é que não vem na Carta do Atlântico. Esta não cria nenhuma segurança social, apenas postula a segurança para quantos dela precisam.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Eu não posso falar mais vezes, mas, no entanto, gostaria de saber qual a segurança social que V. Ex.ª defende.
O Sr. Martins da Cruz: - Já vai ver, senhor doutor, a segurança social, pelo menos aquela que nesta Câmara é possível defender e que respeita a um conceito heterodoxo, que simplesmente postula a doutrina corporativa. Não é aquela que postula o capitalismo e que o Sr. Deputado Gonçalves Rapazote defende. Também não é a anglo-saxónica, que eu, ao fim e ao cabo, não sei como será a segurança específica nessa segurança. Na medida em que a conheço, é à segurança social que se deve todo o risco. Se há outra além desta, eu não a conheço.
A modalidade para esta segurança é universal.
O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!
O Sr. Martins da Cruz: - Se vamos a adoptar essa solução, que vimos defendida, então, nesse capítulo, vamos alinhar na posição internacional e nas publicações estatísticas ao lado do Ghana, Nigéria e Camboja, e infelizmente não teremos ao nosso lado nenhum país da Europa.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Estou convencido de que iríamos alinhar ao lado dos países mais avançados.
O Sr. Martins da Cruz: - É um mal, na medida em que esta modalidade não é aquela que é seguida por qualquer país da Europa.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Isso é outro problema.
O Sr. Martins da Cruz: - Esse é que é o problema; não há outro. É aí que nós vamos alinhar ao lado do Ghana, da Nigéria e do Camboja, enquanto a Espanha vai muito mais avançada.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Nós podemos apresentar uma fórmula, que é a nossa, que efectivamente realize o seguro e faça a cobertura, que é o que é preciso. V. Ex.ª continua seduzido por essas ideias que não concretiza; são emanações que têm pouca consistência.
O Sr. Martins da Cruz: - Mas não é preciso voltar a definir o que é segurança social, porque já há muito tempo está assente tal conceito. Posso, portanto, continuar a utilizar a expressão sem necessidade de a definir.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - O que V. Ex.ª não tem é o direito de dizer que eu sou contra a segurança social. Eu defendo as seguranças sociais com toda a energia, porque quero uma segurança social palpável e concreta.
O Sr. Martins da Cruz: - É isso mesmo; todos queremos uma segurança social palpável e real para todos os portugueses. E esse modelo que V. Ex.ª defende tem sido incapaz de fazer uma segurança social concreta.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Eu estou a defender a base da proposta do Governo, enquanto V. Ex.ª parece que ataca essa base.
O Sr. Martins da Cruz: - Pois ataco. E V. Ex.ª começou por dizer que no projecto inicial o Governo tinha inserido nessa base umas expressões que, parece, assustaram V. Ex.ª É aí que eu discordo de V. Ex.ª e do Governo, na medida em que este transigiu com a Câmara Corporativa.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - O que eu disse é que o Governo aceitou a única fórmula que era possível.
O Sr. Martins da Cruz: - Mas o projecto inicial do Governo inseria-se numa linha de orientação já definida por esta Câmara quando legislou nesta legislatura sobre a reforma da previdência. Nessa altura, em matéria de segurança social, esta Câmara definiu a integração dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais no sistema da previdência. O projecto inicial do Governo ia nesse sentido e depois abandonou-o lamentavelmente.
O Sr. António Santos da Cunha: - O que V. Ex.ª quer é o que se passa nos países do Mercado Comum.
O Sr. Martins da Cruz: - E nos países da E. F. T. A.
Reparem VV. Ex.ªs que é o mesmo departamento do Governo que na mesma legislatura manda para esta Assembleia duas propostas de lei de orientações diferentes. E põe esta Câmara perante a situação de ter de legislar sobre segurança social em dois sentidos diferentes.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - É a opinião de V. Ex.ª
O Sr. Martins da Cruz: - Não é só minha. Quando nos ocupámos da reforma da previdência e discutimos a base V, eu mesmo levantei este problema. E foi-me dito que essa base abrangia os acidentes de trabalho e as doenças profissionais.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Eu também entendo que abrange.
O Sr. Martins da Cruz: - Eu também voto a base em discussão, porque o que nela está merece a minha anuência. O que não compreendo é que ela tenha ficado aquém daquilo que devia ser.
Chegados a esta altura, em 1965, quando o Mundo e a Europa têm sobre estes problemas ideias assentes, bem definidas e esclarecidas, e um sistema de segurança social a funcionar perfeitamente, com cobertura integral da população, como, por exemplo, a Alemanha, com 97 por cento, e a Espanha, que nos ultrapassou nesse capítulo, é estranho que venhamos agora a tomar uma posição que talvez ficasse bem há 30 anos, mas que hoje já não serve.
O Sr. Gonçalves Rapazote: - Desculpe mais uma interrupção, mas não posso concordar com o seu entendimento do nosso esquema do seguro social.
O Sr. Martins da Cruz: - Também não pretendo impor-lho. Quero afirmar, prosseguindo nas minhas considerações, que não nos encontramos à frente da Europa em problemas comuns. A segurança social não é um problema especificamente português, mas de toda a huma-