A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 103.º da Constituição, acerca da Convenção Cultural entre Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, emite, pelas suas secções de Interesses de ordem cultural e de Interesses de ordem administrativa (subsecção de Relações internacionais), sob a presidência do Digno Procurador, assessor, Afonso de Melo Pinto Veloso, o seguinte parecer: A Convenção Cultural entoe Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, assinada em Lisboa, a 19 de Novembro do ano findo, pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo Português e pelo Embaixador britânico Sir Nigel Ronald, como plenipotenciários, é, tecnicamente, um acordo intelectual bilateral, cujo aparato diplomático justifica o nome de «tratado» ou «convenção», e cujo conteúdo e forma permitem agrupá-lo entre os acordos denominados «culturais». Os especialistas do direito internacional não se têm demorado na análise e classificação destes diplomas, que não oferecem interesse propriamente político, embora constituam instrumentos de uma política especial, particularmente delicada, que é a «política da culturas. O estudo, porém, dos trinta e seis acordos intelectuais celebrados entre Estados no período áureo da «política internacional do espírito«, como lhe chamou Paul Valéry, isto é, entre 1919 e 1938 - estudo feito in extremis pela Sociedade das Nações -, oferece-nos alguns esclarecimentos sobre a matéria, em geral entregue pelas chancelarias ao arbítrio dos negociadores: Quanto ao conteúdo, é possível distinguir no acervo destes diplomas, e dos que se negociaram mais tarde, quatro grupos de acordos intelectuais: I, acordos «universitários» ou «escolares», destinados a regular as relações universitárias ou certos problemas de ensino entre as Altas Partes Contratantes (criação de leitorados e de cátedras, permuta de professores e de estudantes, bolsas de estudo, cursos de férias, etc.); II, acordos «linguísticos» (de interesse, aliás, não apenas intelectual, mas também político e económico), concluídos entre Estados em condomínio linguístico ou entre nações de língua diferente, em geral no propósito de consolidar uma aliança ou de assegurar a maior extensão de influência de um idioma imperial; III, acordos parciais sobre outros assuntos (criação de institutos, exposições de arte, troca internacional de pu blicações, propaganda do livro, etc.); IV, acordos que cobrem todo ou quase todo o domínio dos interesses intelectuais das Potências signatárias, únicos a que é legítimo atribuir a designação de «acordos culturais». Quanto à forma, é corrente distinguir entre os acordos anteriores a 1985, atípicos, divergentes, não subordinadas na generalidade a qualquer modelo ou padrão, e os diplomas ulteriores, que possuem já um certo ar de família, uma certa unidade de técnica, obedecendo a um cânone comum - texto de perfeito equilíbrio e de luminosa ciarem - que foi o Acordo intelectual ítalo-húngaro de 16 de Fevereiro de 1&35, assinado por Benito Mussolini e pelo Ministro da Educação e dos Cultos da Hungria, Valentim Hóman. A Convenção entre Portugal e a Grã-Gretanha, sobre a qual recaiu o nosso exame, é, com efeito, um acordo cultural bilateral, que não se afasta sensivelmente do tipo clássico desta, espécie de instrumentos diplomáticos. Tornava-se realmente necessário um acordo desta natureza entre as duas Nações? A iniciativa - digamo-lo desde já - pertenceu no Governo de Sua Majestade Britânica e foi naturalmente acolhida com satisfação pelo Governo Português, que considerou desejável