encial: «Tratemos dos espíritos, porque é no espírito dos homens que as guerras começam». Compreende-se que certas potências procurem, por meio de acordos intelectuais, bilaterais ou multipartidos, cimentar a obra da segurança colectiva. Precisarão, porém, de o fazer duas nações como Portugal e a Grã-Bretanha, que desde 1386 permanecem inalteràvelmente fiéis ao primeiro tratado de amizade e auxílio que assinaram e que, unidas perante as dramáticas vicissitudes de seis séculos de história, com justificado orgulho se proclamam os mais antigos aliados do Mundo? Cremos que sim. E vamos ver porquê.

stória política e diplomática das nações. Como tal tem sido largamente discutida nos países interessados e fora deles. Discutida pelos historiadores; discutida pelos homens de Estado; discutida pelos economistas (quanta tinta se gastou a comentar o tratado de Methwen de 1703, maus vantajoso para nós do que pretendeu fazer-nos acreditar a política francesa!); discutida pelos mestres do direito internacional, alguns dos quais, cá e lá, consideram inactual e demasiado fluida a armadura jurídica da aliança. Debilidade dos textos; pouco conhecimento mútuo dos povos. E, entretanto, nunca em qualquer tempo a aliança foi invocada por uma das partes, que a outra não acudisse, sem sombra ide hesitações, ao seu apelo. Porquê? Porque a aliança luso-britânica não está apenas na letra dos tentados; está no instinto profundo das nações. E uma tradição que mergulha as suas raízes em seis séculos de história. Não será indispensável, como já se pretendeu, actualizar a sua expressão jurídica . É, porém, necessário fortalecer a aliança como sentimento; tornar mais viva a consciência desse «dogma histórico» (como lhe chamou o marquês de Soveral) na alma colectiva dos dois povos. O Prof. Huizinga, reitor da Universidade de Leiden, presidente da Academia Neerlandesa, consagrou uma verdade quando afirmou há vinte anos em Genebra: «Há velhas nações amigos que não têm pressa de se conhecer».

Esta observação subtil ajusta-se como uma luva ao caso da Grã-Bretanha e de Portugal. O fortalecimento moral da aliança : exige entre os dois povos um convívio mais íntimo, uma comunicação maus fácil, uma riqueza maior de informações recíprocas, um contacto mais frequente e mais directo, uma mais perfeita comunhão das juventudes universitárias e escolares. Noutro tempo, o pouco que conhecíamos um do outro nos bastava: Encontrávamo-nos de século a século nos campos de batalha; combatíamos lado a lado; quando passava o perigo apertávamos (fraternalmente as mãos e despedíamo- nos até à próxima guerra, deixando aos netos - quando Deus quisesse- o encargo de recomeçar a epopeia interrompida dos avós. Agora, os tempos mudaram. As condições do Mundo são diferentes. Ê em volta do gigantesco bloco anglo-saxão que se organiza, pela força do Pacto do Atlântico Norte, a defesa do Ocidente. A guerra tem de pensar-se em inglês. Não basta, como nos prélios medievais, vestir as armas no momento próprio. É preciso forjá-las em comum, trabalhar em comum longos anos, àsperamente, incansàvelmente - não já para vencer uma guerra, mas para uma empresa mais difícil ainda: para a evitar. A colaboração das espadas não é suficiente; temos de assegurar a colaboração dos espíritos. A Convenção Cultural entre, Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, agora submetida ao nosso exame, é necessária e vem na hora própria.