Projecto de decreto-lei n.º 509

A Câmara Corporativa, consultada nos termos do artigo 105.º da Constituição acerca do projecto de decreto-lei n.º 509, elaborado pelo Governo, sobre a interpretação e extensão das isenções concedidas pela Lei n.º 2073, emite, pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecções de Política e administração geral é de Finanças e economia geral), às quais foram agregados os Dignos Procuradores Alexandre de Almeida e Inocêncio Galvão Teles, sob a presidência de S. Ex." o Presidente da Câmara, o seguinte parecer:

Apreciação na generalidade Propõe-se o Governo, além do mais, interpretar autenticamente por meio de um decreto-lei, alguns preceitos da Lei n.º 2073, de 23 de Dezembro de 1954, relativa ao exercício da indústria hoteleira e similares.

Do ponto de vista do direito constitucional positivo, nada obsta a que o Governo, no exercício da competência legislativa conferida pelo n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, em ampla, medida coincidente com idêntica competência da Assembleia Nacional, proceda, ele próprio, à interpretação autêntica de disposições provenientes deste outro órgão legiferante. Na medida em que as suas faculdades legislativas se sobrepõem, Assembleia Nacional e Governo são constitucionalmente livres de interpretar, suspender e revogar quaisquer diplomas legais, sem que importe saber se tais diplomas emanam de uma ou do outro. Esta doutrina não é menos evidente em relação à interpretação do que em à suspensão e à revogação de quaisquer preceitos de ordem legal. Nada há, efectiv amente, de anómalo em que um órgão legislativo diferente daquele que criou uma norma legal; possa fixar-lhe o sentido em que deseja vê-la aplicada, uma vez que as vontades de ambos os órgãos têm exactamente o mesmo valor e autoridade e representando-se um cada momento conformes, substituindo-se e representando-se uma à outra. Quando o Governo depara com a necessidade da interpretação autêntica de normas editadas, sob a forma de lei, pela Assembleia Nacional, um de dois caminhos se lhe oferece para satisfazê-la apresentar à Assembleia Nacional uma proposta de lei com as normas que deseja ver convertidas em lei interpretativa, ou fazer, ele próprio, e sem mais, um decreto-lei interpretativo com esse mesmo conteúdo.

Adoptará normalmente o primeiro destes procedimentos no decurso das sessões legislativas da Assembleia Nacional ou quando o seu início esteja suficientemente próximo, tão próximo que se possa aguardar, sem prejuízo de maior, o momento em que a Assembleia Nacional possa a estar disponível para apreciar da conveniência da interpretação sugerida ou pretendida pelo Governo.

Mas nada ha de forçoso na escolha desta via. É este um campo em que influem, e influem ao, considerações de oportunidade - bem podendo suceder que, em dadas hipóteses, se imponha usar, em vez desta, a outra via, a via do decreto-lei, em que se prescinde da intervenção do órgão que editara o diploma interpretando.