Uma outra observação deve anteceder a análise de cada um dos preceitos do projectado decreto-lei. É esta: dar alcance interpretativo a todas as disposições do projecto com essa índole corresponde a prescrever que elas terão aplicação retroactiva, nos termos do princípio geral expresso no artigo 8.º do Código Civil; corresponde, em suma, designadamente, por exemplo, a dispor que foi indevida a cobrança, desde a entrada em vigor da Lei n.º 2073, de certas receitas, cuja restituição poderá ser pedida pelos interessados, quer no Estado, quer aos corpos administrativos. As complicações financeiras resultantes, em especial, da aplicação retroactiva dos preceitos interpretativos de ordem fiscal do novo decreto-lei não seriam desprezíveis, nomeadamente em relação aos corpos administrativos.

Parece, por outro lado, que daria margem a dúvidas o saber-se quais preceitos do novo diploma se deveriam considerar interpretativos e quais não. Para as arredar em absoluto, convém deixar dito, em cada um dos preceitos do novo diploma cuja aplicação retroactiva se considere aconselhável (afinal de coutas, apenas os preceitos do artigo 7.º), o suficiente para que transpareça a sua índole interpretativa ficando entendido que os restantes têm natureza inovadora, são preceitos novos com aplicação reservada ao futuro.

Exame na especialidade O artigo 12.º da Lei n.º 2073 consagrou a isenção e a redução de quaisquer impostos e taxas para os corpos administrativos, durante determinados períodos, em benefício das empresas hoteleiras ou similares.

Esta terminologia é a melhor - e não há, portanto, razão para a alterar, substituindo-a pela mais restrita, e em todo ocaso imprópria, que o projecto agora adopta: licenças dos corpos administrativos. Esta expressão só englobaria as taxas ou emolumentos cobrados pelos corpos administrativos pela passagem de licenças policiais (taxas de polícia), as taxas pagas pela concessão de licenças administrativas em sentido restrito (taxas do domínio) e os impostos que o Código Administrativo (artigo. 704.º, n.º 5.º) designa por «licença de estabelecimento comercial ou industrial» e imposto sobre bilhares, casinos e outras casas de recreio, bem como sobre as destinadas à exploração regular da indústria de espectáculos, o qual é (artigo 709.º), de facto, cobrado por meio de li cença. De fora, ficariam todos os demais impostos directos a que o mencionado artigo 704.º alude, bem como as taxas fiscais (artigo 723.º), na medida em que sejam susceptíveis de ser pagas pelas empresas hoteleiras ou similares.

Se alguma alteração se impusesse ao texto do artigo 12.º, citado, essa diria respeito aos limites da isenção do pagamento de taxas aos corpos administrativos. A lei fala em «quaisquer taxas», mas parece que o propósito que o legislador razoavelmente deveria ter tido seria o de isentar as empresas hoteleiras e similares do pagamento das taxas fiscais e policiais - não das taxas pela prestação de serviços ou pela utilização do domínio público. Esta restrição terá como consequência evitar a prestação gratuita de serviços e o uso gratuito do domínio público, facultado às empresas hoteleiras e similares, quando é certo que, inclusive, entes públicos, morais e culturais não estão em geral isentos do pagamento das respectivas taxas. A Câmara, sugere um do preceito, que prescreve a isenção e redução de todas as taxas a que esteja eventualmente sujeito o exercício da actividade hoteleira ou similar, parece que não deve manter-se, ou porque não é porventura necessária, por falta de alcance prático, ou porque não devem consagrar-se semelhantes privilégios sem considerar o seu alcance em relação a cada modalidade particular. As taxas a pagar, por exemplo, pela ocupação de bens do domínio público marítimo não devem ser objecto de isenção ou redução.

8. Os §§ 1.º e 2.º do artigo 12.º da Lei n.º 2073 consignam um certo tratamento tributário de favor, exclusivamente referido a estabelecimentos hoteleiros, não aos estabelecimentos similares, enumerados na alínea b) do artigo 1.º do mesmo diploma. Poderiam suscitar-se dúvidas sobre se o mencionado tratamento tributário de favor não deveria, afinal, feita a devida interpretação de tais preceitos, considerar-se já neles consagrado. Pode realmente agora prescrever-se que também os estabelecimentos similares ficam abrangidos pelos referidos 1§ 1.º e 2.º do artigo 12.º

9. Pretende-se agora que à redução das contribuições predial e industrial concedida às empresas hoteleiras e similares na parte final do corpo do artigo 12.º da Lei n.º 2073 se acrescente uma redução de 50 por cento no imposto complementar a pagar por tais empresas. O novo preceito tem, evidentemente, de eu tender-se no sentido de que estas empresas pagarão apenas metade do imposto complementar que, segundo o respectivo regulamento (Decreto n.º 36 420, de 17 de Julho de 1947, e Decreto n.º 37 783, de 13 de Março de 1950), corresponderia aos rendimentos dessas empresas sujeitos a contribuição predial e a contribuição industrial, independentemente das reduções que o mencionado artigo 12.º estabelece. Portanto, não se trata da redução a metade de todo o imposto complementar a pagar par elas, incluindo o que recaia sobre eventuais rendimentos sujeitos a impostos diferentes da contribuição predial e da contribuição industrial - mas só da redução a metade do imposto complementar correspondente à contribuição predial e industrial que tais pessoas singulares e colectivas pagariam, como proprietárias e exploradoras de estabelecimentos hoteleiros ou similares classificados de utilidade turística, se não beneficiassem da redução prescrita na parte final do artigo 12.º

Há que deixar isto explícito no texto da lei, paru afastar dúvidas.