terá, sob a sua dependência, um dispensário em cada região ou cidade de grande densidade de população, dispensário sub-regional (local ou citadino).

Através de semelhantes unidades assistenciais será possível fazer uma eficiente acção educativa de higiene mental, obra intensa de profilaxia das doenças mentais, tratamento activo dos doentes mentais em regime ambulatório, uma mais segura e apertada vigilância dos doentes em regime domiciliário e dos doentes em licença de ensaio.

A cada dispensário regional corresponderão um ou dois médicos neuropsiquiatras, conforme a importância da respectiva região, importância averiguada por meio de inquérito.

Estes serviços poderão ser independentes ou anexos a outros estabelecimentos destinados a tratamento de doentes com perturbações mentais ou mesmo a hospitais gerais.

A assistência será prestada por médicos especialistas sob a orientação e fiscalização do dispensário de zona, que deve funcionar no hospital psiquiátrico da respectiva zona.

Semelhante organização substituirá as brigadas com grande vantagem, pela sua acção mais directa, mais activa e mais assídua e, consequentemente, pela sua maior e mais perfeita eficiência.

Exprime-se o desejo de que dentro de cinco anos se instale nos hospitais regionais um serviço alerto para hospitalização livre de doentes agudos, portadores de perturbações psicopáticas não perigosas para a ordem pública e segurança das pessoas e que não exijam condições especiais de vigilância. A palavra loucura foi substituída por alienação mental para indicar as alterações do psiquismo, que colocam o indivíduo na impossibilidade de se adaptar à vida social, por haver perdido o contacto, inteligente e vital, com a realidade, o indivíduo é um estranho no seu meio e um estranho a si mesmo; passou a ser outro e, em geral, sem a consciência da transformação sofrida. Na definição de Bali, o alienado é um homem que sonha com os olhos abertos; é estranho à realidade das coisas; estranho a si mesmo. Perdeu a liberdade moral porque, como o homem dominado por um sonho, é incapaz de se socorrer das faculdades intelectuais para deliberar sobre as impressões que recebe, razão por que, até certo ponto, deixou de ser responsável pelas suas acções perante a sociedade.

Mas tanto a palavra loucura como a expressão alienação mental traduziam estados de espírito caracterizados pela perda definitiva da liberdade moral do doente e marcavam o doente para sempre.

Hoje tudo se passa de maneira diferente.

As palavras louco e alienado, que estigmatizam o doente, devem ser suprimidas da linguagem oficial e substituídas por doente do espírito, doente mental, doente da mente, psicótico ou por qualquer outra expressão semelhante, mas que não desvalorize o indivíduo, pois ele hoje, na medicina, tem um lugar semelhante ao doente de outro órgão, do coração, do estômago, etc.

A precocidade com que se surpreendem estas doenças nervosas, a rapidez com que se lhes acode, a brevidade com que muitas vezes se curam (e tantas vezes sem quaisquer sequelas), dão origem a que a sociedade as arranque da posição degradante que ocupavam no quadro nosológico e as situe na medicina ao lado das doenças dos outros órgãos. E, precisamente por essa compreensão, a sociedade já se não defende dos seus portadores, vai mesmo ao encontro deles procura descobri-los muito cedo, dá-lhes o auxilio mental de que necessitam, coopera com humanidade no seu tratamento, não os marca para a sua vida futura; e, mantendo-os, sempre que possível, no seu ambiente, procura modificá-los para mais facilmente conquistarem o equilíbrio que perderam, e procura reintegrá-los numa vida normal.

Para quê estigmatizar pois estes doentes com o nome de alienados se, em poucos meses, as suas perturbações podem desaparecer por completo e para sempre? Para quê comprometer para sempre a sua situação na sociedade, na sua vida profissional, no seu futuro?

Cada vez é mais necessário organizar a psiquiatria social, despistando os propensos às doenças do espírito e os portadores de doenças mentais para os integrar na sociedade no uso de uma vida normal.

E o problema tem actualidade e é urgente porque as transformações sociais, a industrialização crescente a que assistimos, a fuga da gente dos campos para os grandes centros, a ambição insatisfeita de outras situações, a dispersão frequente dos membros da família, a mecanização da vida, são pausas permanentes e torturantes que actuam malèficamente sobre o espírito dos indivíduos, que, arrancados ao seu meio e à sua vida, se tornam nuns inadaptados ao novo meio e à nova vida.

Se se adoptasse o tratamento clássico do isolamento, impossível seria conseguir condições que pudessem receber trio grande número de doentes; mas, felizmente, a ciência, a investigação, a observação, conseguiram romper o mistério e a magia que envolviam as doenças do espírito e abrir novos horizontes, a permitir compreender parte do muito de incompreensível que neles havia. Assim nasceram doutrinas e técnicas, que, em renovação constante, vão aumentando os conhecimentos, que a medicina vai utilizando, a ponto de já haver hoje uma orientação, bastante segura, quanto ao estudo dos doentes, estudo que leva ao conhecimento da doença e do seu tratamento mais apropriado.

Desta forma, a sociedade vai-se familiarizando com estes doentes e consegue-se, na frase do Prof. Baraona Fernandes, a desalienação da psiquiatria, permitindo a clínica de muitos doentes de espírito no seu ambiente e em condições semelhantes às dos doentes da medicina geral.