Seria, assim, da ordem dos 500000 fogos o deficit carencial de habitações em 1960.
Como é evidente, o quadro, na crueza dos seus números, não entra em conta com o condicionalismo específico dos diferentes meios a que se refere.
Cumpre .considerar que o problema é muito mais urgente nos bairros urbanos clandestinos ou arruinados do que nó meio rural, onde a própria dispersão e o modo de vida dos habitantes torna menos preocupantes as condições sanitárias e de promiscuidade.
Podem pôr-se reservas às conclusões extraídas do quadro, por não entrar em linha de conta, por um lado, com o volume existente de casas desocupadas (excedendo largamente o índice normal de desocupação) e, por outro lado, com o facto de uma parte substancial dos fogos superlotados ser susceptível de ocupação por famílias menos numerosas, devendo, consequentemente, excluir-se no calculo do deficit.
Os reparos são, em princípio, fundados.
Devemos, todavia e antes de mais, observar que o volume anómalo de desocupação se verifica na província (1), designadamente nos concelhos rurais que progressivamente se despovoam, não podendo, pois, contribuir de modo imediato e sensível para solução do problema habitacional. Trata-se, muito pelo contrário, de riqueza perdida, de investimentos inutilizados por subsequentes migrações internas.
Quanto ao reaproveitamento de fogos superlotados, destinando-os a famílias de menor dimensão, cumpre considerar, por um lado, que a falta de mobilidade dos agregados prejudica em larga medida esse reaproveitamento e que, por outro lado, uma parte apreciável de tais fogos carece de condições mínimas de higiene, salubridade e segurança,- ou reclama, pela sua vetustez, reparações volumosas e urgentes, se não mesmo a sua integral substituição.
O rigor impunha, apesar de tudo, que se reduzisse, em função do reaproveitamento possível, o número representativo das carências resultantes da superlotação. Sucede, porém, que não se dispõe ainda de elementos que permitam estudar e planificar, em termos aceitáveis, e partindo de hipóteses válidas, esse reaproveitamento.
Posto isto, afigura-se-nos aceitável, para traduzir a ordem de grandeza das necessidades de habitação em 1960, o número de. 500 000- fogos resultante do quadro acima elaborado, visto que o eventual exagero da cifra correspondente à superlotação compensaria:
As carências não consideradas resultantes da superlotação em fogos de maior dimensão e famílias mais numerosas (sete ou mais pessoas com três divisões; nove ou mais pessoas com quatro divisões; etc.);
As necessidades suplementares decorrentes de um menos elástico e mais correcto critério de superlotação (uma ou duas pessoas por divisão, por exemplo) ;
As carências, que não se consideraram, resultantes da necessidade de substituir ou reparar grande número de habitações vetustas ou sem os requisitos mínimos de higiene e segurança (1).
Por outro lado, talvez seja conveniente evidenciarmos desde já as seguintes conclusões que se extraem do quadro reproduzido no número anterior:
a) No decénio de 1950-1960 o deficit carencial aumentou de um pouco menos de 40 000 fogos, ou seja de 4000 fogos por ano. Significa isto que a
(1) Todos os distritos, à excepção de Lisboa, Porto e Setúbal, tom superavit mais ou menos largo de habitações (Nelson Montes o Vaz Finto, Aspectos do Desenvolvimento da Indústria de Construção em Portugal, comunicação ao I Colóquio de Produtividade na Indústria da Construção em Abril de 1964, pp. 56 e 57).
(1) A este propósito será pertinente observar que, em 1960, dos agregados domésticos portugueses 59 por cento não tinham cozinha nem instalações sanitárias ou só dispunham de cozinha;
22 por cento tinham cozinha e retrete, mas não dispunham de casa de banho; só 19 por cento tinham cozinha, retrete e casa de banho; 72 por cento não dispunham de água canalizada;
62 por cento não tinham esgotos, e 59 por cento careciam de electricidade (I. N. E. - X Recenseamento Geral da População, tomo VI).