ao financiamento público do alojamento, na cauda de todos os países da Europa (mesmo depois da Grécia, que tem, nos últimos anos, envidado um esforço sério para resolver o seu gravíssimo problema habitacional), permite-nos também chegar a outras conclusões preciosas.

Assim, e antes de mais, verifica-se que o volume global de construções, se localizou, durante o decénio de 1953-1962, francamente abaixo do deficit de reposição (cujo valor médio, nesse período, devia ser de aproximadamente, 27 000 habitações por ano): Daí o agravamento da ordem dos 40 000 fogos que, de 1950 para 1960, se operou, como atrás averiguámos, no deficit carencial.

Em segundo lugar, apercebemo-nos do reduzidíssimo papel que as cooperativas desempenham no sector da construção. De 1953 a 1962 não se processa nenhuma evolução: no início (1953), no meio (1958) e no fim (1962) do período, o número de fogos por elas edificados anualmente (respectivamente, 277, 265 e 257) mantém-se sensìvelmente o mesmo, representando pouco mais de 1 por cento do volume global das habitações construídas. Carecendo de um regime jurídico que lhe facilite a consecussão dos seus objectivos sociais, não existindo uma fiscalização eficiente nos actos de gestão, e faltando-lhe um apoio financeiro adequado e decidido, não parece haver até agora vingado entre nós o movimento cooperativo, de que tanto haverá a esperar e que tão activamente intervém, como acima vimos, na solução do problema habitacional da Alemanha (26,1 por cento dos fogos), da Áustria (27,3 por cento), da Dinamarca (27,5 por cento), da Finlândia (45,2 por cento), da Holanda (26,2 por cento), da Noruega (27,3 por cento), da Suécia (29,5 por cento) e da própria Suíça (12,6 por cento).

A terceira observação a fazer-se - e esta, de longe mais importante - é a de que 91,3 por cento dos fogos construídos na metrópole no decénio de 1953-1962 o foram à margem de toda e qualquer orientação social, agindo o sector particular movido pelos estímulos usuais do mercado: o lucro e a especulação.

Pode, assim, afirmar-se a priori que a esmagadora maioria, a quase totalidade dos investimentos feitos na construção urbana no período em causa, não se orientou seguramente pelo critério da maior rentabilidade social, já que, visando acima de tudo obter a mais alta remuneração para os capitais, tenderia forçosamente a aplicar-se em imóveis de luxo e de renda elevada, inacessíveis à grande massa da população.

Significa isto que, havendo estado até agora pràticamente a cargo do sector particular o problema português do alojamento, nada se fez de significativo para canalizar os respectivos investimentos imobiliários no sentido que as necessidades sociais do País gritantemente impunham, exceptuados alguns casos esporádicos, nomeadamente as vantagens legalmente concedidas para a construção de casas de renda limitada e a atitude salutar da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, que, na distribuição dos seus financiamentos à construção, se orienta, desde há anos, pelo critério predominante da concessão de crédito apenas para o caso de rendas acessíveis ou habitações dos próprios mutuários.

E aí estão, como corolário inevitável, todas as características e anomalias da nossa conjuntura habitacional, algumas das quais nos parece útil pôr aqui em evidência. O quadro IV indica-nos qual foi, em percentagem do produto nacional bruto e em percentagem da formação bruta interna de capital fixo, a formação bruta de capital fixo na habitação durante o ano de 1960.

Fonte: Bullelin Annuel de Statistiques du Logement et de la Construction pour l'Europe - NU, Genève, 1963 (in Relatório do Grupo de Trabalho n.º 7).

Verifica-se, pois, que Portugal aplicou, em 1960, na construção urbana, uma percentagem do produto nacional bruto que, se se situa, relativamente a este e ao volume de formação bruta interna de capital fixo, um pouco abaixo da média dos indicados países da Europa, no entanto, de modo algum traduz atitude de abandono ou de menos interesse pelo sector e antes representaria, se bem orientado o investimento, esforço notável e meritório de um país de escassos recursos e carecido de acelerar o seu desenvolvimento económico. Basta comparar com a nossa a posição da Dinamarca, da Irlanda e, designadamente, da Inglaterra para disso nos apercebermos.

E o confronto ainda mais nos favorece se. entendendo a análise ao decénio de 1953 a 1962, verificarmos que Portugal, nesse período, imobilizou em alojamentos 19,2 por cento (e não apenas 16,7 por cento como em 1960) de formação bruta interna de capital fixo (1).

Conclui-se, assim, que o nosso país vem aplicando em alojamentos uma parte substancial do produto nacional bruto, dificilmente se entrevendo a possibilidade de sem prejuízo dos interesses igualmente inadiáveis do desenvolvimento económico nacional, distrair do investimento reprodutivo para o sector de habitação muito maior proporção de capitais. E, em princípio, os efectivamente aplicados deveriam ter sido suficientes, se não para eliminar em prazo curto o deficit carencial que vinha de 1950, pelo menos para cobrir o deficit de reposição e concorrer em larga medida para a gradual solução do primeiro.

Que sucedeu, porém?

Antes de mais, e como atrás vimos, as carências aumentaram de cerca de 40 000 fogos entre 1950 e 1960.

Isto só poderia resultar ou da insuficiência dos recursos aplicados ou do excessivo custo médio dos fogos construídos.

(1) Relatório do Grupo de Trabalho n.º 7.