quem reconhece expressamente, nas suas declarações, que aos agentes cumpria, «mesmo à força», fazer respeitar essa ordem. Por isso, ele isenta de responsabilidades em termos gerais os agentes que o conduziram do gabinete do inspector para a zona prisional. Acusa, todavia, dois Daniel (aliás, Leonel) e Lucas Pereira de o terem agredido durante esse percurso, já fora do gabinete e das vistas do inspector e antes de o detido ter dado entrada naquela zona;

3.ª Além dos três intervenientes identificados, Gonçalves Tavares, Leonel Marques e Lucas Pereira, apenas duas pessoas afirmam ter presenciado a condução do primeiro daqueles através do corredor que vai da porta do gabinete do inspector até à porta de entrada da zona prisional: as declarantes Noémia Silva Marques e Sara Tavares de Sousa, respectivamente irmã e cônjuge de um dos motoristas detidos na véspera.

É sobre as declarações por elas prestadas que vai, agora, incidir o nosso exame. E podemos já adiantar que a força de crediticidade dessas declarações não é convincente.

De facto, Gonçalves Tavares foi envito categórico ao afirmar que «os agentes que lhe bateram foram só os agentes Lucas Pereira e Daniel» (Leonel). As declarantes, ao contrário, dizem que viram todos os agentes bater no Tavares.

Mas mais significativo é o seguinte: das declarações de Gonçalves Tavares neste ponto categoricamente confirmadas pelo inspector Dr. Silva Garcia deduz-se que as duas declarantes ficaram dentro do gabinete deste quando o detido daí foi levado. Ora, de dentro do gabinete não podiam presenciar as agressões.

Como resolveram as declarantes a dificuldade? Afirmando que saíram do gabinete do inspector à frente do preso, o que é contrariado por todos os elementos existentes no processo.

Por outro lado, Gonçalves Tavares diz claramente que as agressões só foram presenciadas por um casal cuja identidade desconhece; e o motorista do Sindicato apenas alude a umas «moças» desconhecidas que teriam visto as agressões.

Assim, havemos de concluir que sendo só as declarantes Noémia e Sara a asseverarem que todos os agentes da Polícia Judiciária que compareceram no gabinete do inspector Dr. Silva Garcia agrediram o dirigente sindical quando este foi conduzido pelo corredor, tal facto não pode ser dado como indiciariamente provado.

Desmente-o o próprio Tavares; e, para poderem afirmar que o presenciaram, as declarantes colocam-se no corredor quando tudo aponta no sentido de que se achavam dentro do gabinete, donde o não podiam

testemunhar.

4.ª Bem mais difícil é a formulação de um juízo sobre as alegadas agressões por parte dos agentes Lucas Pereira e Leonel. Firmino Tavares assegura que estes lhe bateram; os agentes em causa negam o facto.

Não existe prova presencial. O mesmo Gonçalves Tavares diz «que os agentes tinham tido o cuidado de esvaziar o corredor por onde o conduziram, mas mesmo assim um casal que ali se achava disse para o declarante que tinha visto baterem-lhe bem e que não havia direito de as coisas continuarem na mesma.

O que é certo, e essa foi uma grande falta sua, é que no estado de excrtamento em que estava não lhe ocorreu identificar essas pessoas. E agora não vê grandes hipóteses de o conseguir, mas vai tentá-lo interessada e rapidamente. Até ao momento não nos foi dada notícia dessa identificação.

Por seu turno, o motorista do Sindicato José Augusto Rodrigues da Silva diz a este propósito: Quando regressaram da zona prisional, outra vez pelo corredor, umas moças que ali estavam disseram que o seu colega foi violentamente agredido, referindo-se ao Tavares. As raparigas diziam que tinham visto. O declarante desconhece a identidade delas.

Mas como explicar, então, que ao ser recolhido à zona prisional o Tavares exibisse a camisa com todos os botões violentamente arrancados, os cabelos em desalinho e se queixasse de que tinha o corpo todo «moído»?

Havemos de convir que estes elementos, bem como o «reboliço» ou a «algazarra», a que aludem os declarantes Brás de Sousa e Lopes da Silva, não são suficientes para concluir que o Firmino Tavares foi agredido.

Sabemos que é um homem possante e volumoso. No gabinete do inspector sentou

É razoável supor que no fim de um trajecto assim penoso não existissem botões na camisa de resto, circunstância bem mais reveladora de o preso ter sido puxado ou ter dado sacões para se libertar de quem o

segurava, do que de agressões ter o cabelo em desalinho e sentir o corpo todo «moído» quando na cela se quis sentar sobre um cobertor estendido no chão.