Mas existe um outro facto cuja prova está feita. À tarde, no Juízo da Instrução Criminal, Gonçalves Tavares queixava-se de que tinha um «alto» ou um «galo» na cabeça, cuja existência foi comprovada pelo advogado Dr. Dias Ferreira e pelo inspector Dr. Silva Garcia (este «verificou ou pareceu-lhe verificar que algo de anormal ali existia)».

Como teria sido provocado este hematoma?

O Tavares relaciona-o com o facto de o agente Leonel lhe ter agarrado nos cabelos e lhe ter batido com a cabeça na parede.

O agente nega.

Impressionou-me muito que os motoristas cuja detenção no dia anterior provocou a ida à Polícia Judiciária do dirigente sindical e na cela dos quais este acabou por ser recolhido, não tivessem feito qualquer referência a queixas do Tavares localizadas no crâneo. E tendo-lhes sido concretamente perguntado se aquele exibia algum ferimento, responderam terminantemente que não.

Não ponho em dúvida a prova de existência, de tarde, do hematoma. O que me confunde é a não alusão imediata, para os companheiros, à agressão na cabeça, a mais espectacular e a mais concretizada nas declarações ulteriores do Tavares.

De resto, a condução do preso pelo corredor deve ter sido envito confusa em virtude da atitude de recusa tomada por este. Basta atentar em que, na mesma tarde e no Juízo de Instrução Criminal, o Tavares queixava-se de que fora agredido com uma joelhada numa coxa (declarações concordantes do Dr. Dias Ferreira e do Dr. Silva Garcia). Ora, no meu gabinete, prestando com calma as suas declarações, durante cerca de três horas, o dirigente sindical garantiu terminantemente que só fora agredido com as mãos. E, em face da minha dúvida, pois já ouvira em declarações o Dr. Silva Garcia que referiu a imputação da joelhada, o Tavares teimou que os agentes Daniel (Leonel) e Lucas Pereira o agrediram com as mãos, «mesmo só com as mãos».

Em suma: que a condução do dirigente sindical para a zona prisional foi turbulenta, não há dúvida. Mas esse facto deve-se só à sua recusa em atacar a ordem de prisão.

Que, no fim, o Tavares tinha a camisa sem um botão, os cabelos em desalinho e se queixava de ter o corpo «moído» e mais tarde de ter um hematoma na cabeça é ponto assente.

Que tenha sido agredido pêlos agentes Lucas Pereira e Leonel Marques, em tranquilidade de consciência se dirá que não existe prova bastante para formular um juízo consciencioso.

Não podemos esquecer que a condução do preso é feita de dia, durante as horas de serviço, por um vulgar corredor destinado ao trânsito das pessoas que vão à Polícia Judiciária tratar de qualquer assunto.

Para ele abrem numerosas portas, nomeadamente a da sala de espera.

Os agentes negam as agressões. O detido nunca pretendeu agredi-los, o que também exclui a ideia de um desforço físico. No final, não tem uma arranhadela, uma gota de sangue, uma contusão visível.

E extratar-se-á que o advogado do Sindicato, Dr. Dias Ferreira, ouvido no processo, e relatando um incidente, cuja apreciação já transcende o objecto deste inquérito, contou que estando a referir a numerosos dirigentes sindicais que o Firmimo Tavares dizia ter agredido, e ter aparência disso, um agente da Polícia Judiciária dirigiu-se-lhe em tom brusco, afirmando: «o senhor está enganado, nós aqui não batemos»;

5.ª Em conclusões:

1.ª No dia 29 de Outubro de 1975, o dirigente do Sindicato dos Transportes Rodoviários de Lisboa, Firmino Gonçalves Tavares, dirigiu-se ao edifício da Polícia Judiciária a fim de averiguar as razões por que aí haviam sido detidos, na véspera, dois motoristas;

2.ª Quando lhe estavam a ser prestadas explicações, assumiu a responsabilidade da ordem dada aos motoristas para agirem pela maneira que motivou a detenção deles;

3.ª Considerando, então, autor moral dos factos praticados pêlos detidos, foi-lhe dada, por um inspector, voz de prisão, que se recusou a acatar enquanto aqueles não fossem libertados;

4.ª Em face dessa recusa e só por esse motivo foi necessário puxar e empurrar o dito dirigente sindical, a fim de o conduzir à prisão, sendo certo que Firmino Gonçalves reconhece que aos agentes cumpria executar, mesmo à força, a ordem dada pelo inspector;

5.ª Não se provou que no decurso da condução do preso para a zona prisional ou em qualquer outro momento ele tenha sido agredido por agentes, ou outros funcionários, da Polícia Judiciária;

6.ª Efectivamente, as duas únicas pessoas a mulher e a irmã de um dos motoristas presos que declararam no processo ter visto agredir o dirigente sindical são desmentidas por este, quer quanto ao facto de terem presenciado as agressões, quer relativamente ao número de agressores, quer ainda à maneira por que as agressões se teriam processado.

Entendo que, face à larga publicidade dada a acusações que o inquérito não com-