(...)tabelecer preços ainda mais baixos e até recusar-se a comprar a madeira deste ou daquele produtor-proprietário.

A Madeiper no seu comunicado promete diligenciar no sentido de uma colaboração mais íntima entre a lavoura e a indústria, mas todos estamos a ver que a sua actuação tende não à colaboração, mas sim à completa subordinação da lavoura a indústria no que respeita à produção da madeira de pinho e eucalipto própria para o fabrico de celulose, e, por isso, a colaboração oferecida pela Madeiper à lavoura só com ironia pode ser tomada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, efectivamente, os preços que a Madeiper estabeleceu para o ano de 1970, e que tornou públicos, sofreram, em relação à madeira de eucalipto e ao ano findo, uma redução de mais de 30$ em cada estere, o que representa para a lavoura um gravíssimo prejuízo, e tanto maior quanto é certo que a tendência dos preços, em geral, se verifica no sentido da alta.

A agricultura atravessa, como todos sabem, uma grave crise, que o Governo se empenha em debelar por meio da adopção de medidas que constam do III Plano de Fomento e do próprio relatório que precedeu a proposta da Lei de Meios para o corrente ano, que foi apresentada a esta Assembleia e que aqui foi oportunamente discutida e aprovada.

Pois a actuação das empresas de celulose a que se vem fazendo referência ainda torna mais grave essa crise.

O Sr. Camilo de Mendonça: - V Exa. dá-me licença?

O Orador: -Faz favor.

O Sr. Camilo de Mendonça: -É só para abonar as razões de V. Exa. Efectivamente, a atitude das indústrias de celulose é contraria aos princípios constitucionais e que está inclusa na Lei de 1936 das coligações económicas. Por isso espero que o Governo intervenha como deve para repor a situação.

O Orador: - Ora, Sr. Presidente, nós vivemos em sistema de economia dirigida, no qual o Estado intervém como árbitro supremo dos interesses em conflito, a ele competindo, liberto de todas as plutocracias, definir os princípios a que deve obedecer a expansão da economia e estabelecer a justiça nas relações sociais, corrigindo os defeitos que resultem de livre jogo das actividades particulares.

Em face, da actuação das empresas de celulose, o Governo não pode ficar indiferente à situação que as mesmas criam à lavoura do País, e deverá intervir, rápida e eficazmente, evitando que se agrave ainda mais a crise por que está passando a agricultura.

O Sr. Almeida Cotta: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Almeida Cotta: - Talvez tivesse podido informar V. Exa. de que realmente a questão não está a ser esquecida pelo Governo.

O Orador: - Regozijo-me com essas informações.

O Sr. Camilo de Mendonça: - A única coisa que posso dizer é que a Corporação da Lavoura diligenciou e havia um como que compromisso do Governo de não permitir que isso acontecesse. Mas, quando vejo uma reunião pública em que o director-geral dos Serviços Florestais procede como sintonia de colaboração, já não sei onde acaba a Administração e onde começam os altos interesses privados.

O Sr. Almeida Cotta: - Esses limites talvez sejam fáceis de definir.

O Orador: - Se V. Exa. não se importa, continuo os minhas considerações.

O Orador: - Foi à sombra da lei do condicionamento industrial e protegidas por esta mesma lei que se instalaram no País as indústrias de celulose, e em protecção dessas indústrias encontra-se condicionada a exportação das madeiras que constituem a matéria-prima das mesmas indústrias. E a lavoura não pode ficar à mercê de monopólios que conduzem ao desmedido, e por isso injusto, enriquecimento de meia dúzia de senhores e ao empobrecimento da classe Agrícola, em geral, no que respeita ao sector da produção das madeiras de pinho e eucalipto.

Sr. Presidente: As grandes empresas de celulose do País agruparam-se em sociedade no que respeita à compra da madeira de pinho e eucalipto própria para o fabrico de celulose e, praticamente sozinha essa sociedade no mercado comprador desses produtos, a mesma estabeleceu unilateralmente para estes os preços que entendeu, resultando deste conluio grave lesão para os interesses da lavoura.

As empresas de celulose passam, assim, a actuar em monopólio na compra da referida madeira, estabelecendo livremente os respectivos preços, protegidas ainda por uma exportação condicionada, e condicionada de tal forma que equivale a uma proibição de exportação. Quer dizer essas grandes empresas de celulose, cuja prosperidade se mede pelas altas cotações na bolsa das respectivas acções, conluiados, passam a comprar à lavoura a madeira de que precisam pelo preço que querem, abusando da miséria em que vive a maior parte dos lavradores portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E é de tal forma o clima que se gerou neste País que essas grandes empresas de celulose, pela publicidade que deram ao seu comunicado, entendem certamente que a sua actuação está absolutamente certa e em conformidade com os princípios dominantes na economia portuguesa e no mundo dos negócios.

Grave sintoma é este, Sr Presidente, que pode ser objecto de largas reflexões. Mas para agora limito-me a chamar respeitosamente a atenção do Governo, especialmente do Sr. Presidente do Conselho e do Sr. Ministro da Economia, para a situação criada à lavoura pelas referidas empresas de celulose.

Aguardemos, pois, confiados no alto espírito de justiça do eminente estadista, que é o Sr. Prof. Marcelo Caetano, e no elevado critério do Sr. Dr. Dias Rosas, que vem sobraçando com assinalado mérito a pasta da Economia.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Havia mais alguns Srs. Deputados inscritos para usarem da palavra no período de antes da ordem do dia. Peço a esses Srs. Deputados que colaborem (...)