São posições Sr. Presidente, são atitudes que não posso guardar para mim e que, como mandatário então presente nas ilhas, entendo dever trazer ao conhecimento desta Câmara para uma melhor compreensão do arquipélago.

Embora me não considere aqui por empréstimo, só posso interpretar todo este entusiasmo como portuguesismo incontestável.

Na verdade, Srs. Deputados, eu não estava em causa.

Eram os candidatos do Governo, em representação da União Nacional, a serem eleitos.

Era Portugal que tinha de renunciar ou "sobreviver no mundo que criou. Cabo Verde, parcela integrante desse mundo, rejeitou ia renúncia e, por imposição da consciente vontade do seu povo, reafirmou ao País a sua inteira comunhão nos propósitos da defesa intransigente do território nacional, seja ele o Algarve, a Estremadura, o Alentejo, Angola, Moçambique ou a Guiné.

Esta é a mensagem que trago de Cabo Verde - mensagem traduzida no acto eleitoral e para além dele - e que transmito à Nação através do seu mais alto órgão representativo, com legitimai vaidade de pertencer a uma comunidade tão orgulhosamente portuguesa, não obstante, por vezes, tão ferida na sua dignidade.

É verdade, Sr. Presidente, eu, que nasci em Cabo Verde e para lá voltei há trinta e três anos, ainda mau refeito das atribulações universitárias, para continuar a viver com aquela boa gente, sofri com ela as agruras passadas, sana que ouvisse um protesto, sem que ouviste um queixume que não fosse, de portuguesas para Portugal.

Perante uma natureza hostil e tão ingrata, aquele povo nunca procurou outra forma de coexistir que não fosse a portuguesa e sempre - mas sempre -, desde o seu achamento, manteve intacta a sua nacionalidade, respondendo à chamada todas as vezes que a Nação, tenha perigado na sua unidade. Nem sequer durante a ocupação filipina ai Bandeira Nacional deixou de estar ali presente, flutuando nos mastros da majestosa, ilha do Fogo.

É pelo que ocorreu no passado, de que me limito a apontar apenas um motivo que é orgulho do Cabo-Verdiano, é pelo que se verifica no presente e continuará a processar-se no futuro, que me dói ouvir dizer displicentemente que. há cabo-verdianos do "lado de lá", estabelecendo-se lamentáveis confusões.

Ocorre-me responder: "Entre os Portugueses, alguns traidores houve algumas vezes ..." E pergunto, "Porquê falar de traidores só entre os portugueses de Cabo Verde? Porquê, em vez de lembrar uma ignomínia, se não recordam em portugueses de Cabo Verde que se batem e morrem pela Pátria comum?"

Com o apontar de traidores - aliás arregimentados entre falhados e delinquentes de crimes comuns -, alguns já condenados, outros fugidos à justiça ordinária - porquê diminuir a acção daqueles que heroicamente conseguem resistir e são condecorados, em reconhecimento da sua bravura, na defesa de um património e de uma civilização que, sendo de portugueses, são também de Cabo Verde? Poderia deixar as respostas entregues à que se passou não se descreve. Sente-se, e vive-se. Eu estava na comissão de recepção. Posso garantir que não houve "orquestração". Na "hora di bail" - na hora da partida foi a apoteose. Nem os. serviços de segurança puderam conter o entusiasmo do povo. O Sr. Almirante Américo Tomás estava rodeado e confiante, visivelmente comovido, multiplicava-se para não deixar de apertar a mão a quantos lha estendiam.

A atestar esses grandes momentos de alto patriotismo, deporei nas mãos de V. Ex.ª esta plaquette, cujo conteúdo, em palavras e imagens, ficará a documentar, para os que a não viram, essa inesquecível e grandiosa jornada.

Não se pode duvidar, mas eu tenho de insistir.

É que preciso de pugnar pelos anseios daquela gente, num clima de inteira igualdade nacional, de forma a serem aceites como se viessem de Setúbal, da Guarda ou de Santarém.

Preciso que se me entenda, como representante de um círculo que só pretende o engrandecimento de Portugal e com ele prosseguir, progredindo em qualquer dos sectores que possam contribuir pana uma vida melhor.

Sr. Presidente: Desde a primeira vez que falei nesta Câmara, em Janeiro de 1962, venho insistindo por uma maior e mais constante aproximação entre os portugueses de todas as latitudes. O convívio que se proporciona por contactos directos infunde-nos maior confiança recíproca e mais certeza nos nossos destinos comuns.

No caso específico de Cabo Verde é uma forma de quebrar o isolamento, a confundir-se com abandono, tantas vezes causa de frustrações, numa paisagem agressiva, prisão ciclópica, cujas grades são o mar, a convidar para a evasão.

Não sei se a ideia me teria sido ditada pelo ambiente telúrico, se teria germinado pela origem, ou até que seja original.

Do que não restam dúvidas é de que o pensamento está na base da nossa actividade política e administrativa, concretizando-se, com a assídua presença dos responsáveis em terras que constituem o território de Portugal.

Esta é a altitude do Chefe do Governo, deslocando-se até junto das populações, para auscultar os seus anseios, as suas necessidades, as mais reacções.

Não me parece lógico convidar quem quer a visitar a sua própria casa - todo o português estará em Cabo Verde em casa que é sua.

Todavia, se não me é lícito convidar - em face da orientação que o Prof. Marcelo Caetano imprimiu à sua actividade de governante -, eu não posso eximir-me, ainda que não fosse senão por mera coerência, à ousadia de sugerir a S. Ex.ª para visitar Cabo Verde, pana ali sentir também o calor do patriotismo da sua gente, a sua inabalável portugalidade, a sua firme determinação de manter a comunidade a que pertence.