todos nós, e que me parece indispensável abordar, tentando pôr termo a uma situação penosa que há demasiado tempo se arrasta.

Fá-lo-ei focando, especialmente, três pontos:

Responsabilidade da Assembleia Nacional quanto à lei de imprensa;

Actividade desenvolvida em ordem a corresponder-lhe;

Necessidade de iniciativa imediata e eficaz.

Pelo menos desde a revisão constitucional de 1959, a responsabilidade desta Gamara na aprovação da lei de imprensa é exclusiva e grave.

Exclusiva porque, mercê do aditamento então feito ao artigo 93.º da Constituição, essa matéria passou a ser unicamente da competência da Assembleia Nacional.

Especialmente grave porque já há onze anos a Câmara reconheceu, unanimemente, a necessidade da lei de imprensa.

E tão grande era ela, tão vivamente foi então sentida, que um dos poucos projectos de alteração, que na altura logrou êxito, foi o conducente a consagrair constitucionalmente a imperiosidade de um estatuto da imprensa.

Daí o actual artigo 23.º da Constituição, segundo o qual lei especial definirá os direitos e deveres, quer das empresas, quer dos profissionais de jornalismo, por forma a salvaguardar a independência e dignidade de umas e outros.

Creio que vale a pena determo-nos um pouco na análise, ainda que breve, do que então se passou, para que melhor possamos julgar como temos de corresponder a tal responsabilidade.

O problema foi abordado logo na discussão na generalidade da proposta, de alteração da Constituição, nestes termos:

Ao passo que todas as actividades têm o seu estatuto definido na lei e aqueles que as exercem podem conhecer claramente os seus direitos, responsabilidades e obrigações, a imprensa está ainda sob o regime nebuloso de um puro arbítrio e vê a sua vida dependente de critérios pessoais que oscilam consoante a deposição ou a opinião de quem as exerce, ou conforme o sabor dos tempos, ou, até por vezes, em função de factores que são de todo em todo imprevisíveis.

O Sr. Pinto Balssmão: - Muito bem!

O Orador:

Estas oscilações e impossibilidades são, aliás, males secundários; poderiam até não se verificar, sem que por isso o erro de origem desaparecesse, porque o mal está em se deixar ao arbítrio dos homens o que deveria pertencer à disciplina das leis.

O Sr. Pinto Balsemão: - Muito bem!

O Orador: - Estas palavras, com que, em 1959, se denunciava, a inadmissibilidade do sistema então vigente, que ainda hoje subsiste, são do Deputado José Hermano Saraiva.

Com certa surpresa verifiquei que não houve, quanto a elas, uma só voz discordante, apesar de o discurso em que se inserem ter sofrido viva crítica.

A mim próprio me perguntei se a Câmara de então seria unânime neste ponto.

Encontrei a resposta no final da discussão na especialidade, a propósito da controvérsia levantada pelo projecto do Deputado Carlos Moreira no sentido de fazer consagrar constitucionalmemte a obrigatoriedade de diploma que contivesse o estatuto da imprensa.

Este diploma visaria não só a substituir a ideia de censura pela de estatuto, mas também a definir os direitos e deveres recíprocos da empresa e dos jornalistas.

Afirmou então, expressamente, o Deputado José Hermano Saraiva que a lacuna a preencher era velha de trinta anos e que todos estavam de acordo em que era absolutamente indispensável que houvesse uma lei de imprensa.

A dúvida estava apenas em consignar ussa reconhecida necessidade na Constituição.

É certo que assim era, pois que o Prof. Mário de Figueiredo, que se opunha à solução que veio a prevalecer, falando imediatamente antes de o autor do projecto encerrar o debate, afirmava:

A questão que agora se discute é esta: deve ou não haver uma lei de imprensa?

Todos estamos de acordo em que deve.

O que eu afirmo é que para isso não é necessário que se vote o artigo em discussão, porque isso já resulta do § 2.º do artigo 8.º

O projecto veio a ser aprovado. No entender do seu autor, a existência do princípio genérico não impedia, antes impunha, talvez, a formulação de uma disposição directa relativa à liberdade de imprensa, assunto de indiscutível importância e repercussão incontestável na opinião pública, ao qual a Assembleia não podia tapar os ouvidos.

Eis como, em 1959, a Câmara assumiu conscientemente graves responsabilidades na aprovação de uma lei de imprensa, da sua competência exclusiva.

Cabe agora ver como se desempenhou delas e como lhes corresponderá.

Em 3 de Dezembro de 1959 o Deputado Homem de Mello protestou contra a manutenção do estado de coisas em matéria de lei de imprensa, referindo designadamente:

Aquela afirmação do Chefe do Governo e o imperativo constitucional referidos parece que indicavam claramente aos responsáveis que haveria de publicar-se quanto antes o novo regime legal de imprensa.

Ora, um ano e meses passados sobre as palavras do Presidente do Conselho e cerca de cento e trinta dias após a votação da Assembleia, nada se exteriorizou no sentido preconizado, pelo que se me afigura indispensável que o País seja esclarecido e esta Câmara (cuja função essencialmente política e de controle da actividade governamental nunca é de mais recordar) se pronuncie sobre a situação da imprensa portuguesa.

Nesse mesmo dia, o Deputado Carlos Moreira apresentou um requerimento a pedir informações quanto ao projecto do Governo no sentido da promulgação de uma lei de imprensa, em execução do artigo 23.º da Constituição.

Em 15 de Dezembro de 1959 veio a informação de que «o Governo prepara sobre o assunto uma proposta de lei, que submeterá, logo que pronta, à apreciação da Câmara».

Em 3 de Fevereiro de 1970 o Deputado Pinto Balsemão formula a seguinte pergunta, publicada no Diário das Sessões do passado dia 17:

Quando será enviada à Assembleia Nacional a anunciada proposta, de lei de imprensa?

O Governo ainda não respondeu.