sarmos a ser o que não queremos; e, se pretendemos manter a nossa personalidade nacional, haveremos de saber atravessar sem desvios as flutuações ideológicas e as oscilações pendulares dos interesses. dos grandes impérios, de que não poderemos fazer depender a nossa própria orientação. Afirmou-o V. Ex.ª há instantes numa frase: fidelidade ao essencial que define o perfil de Portugal no Mundo e na História e, do mesmo passo, acompanhar a humanidade no tempo. Fidelidade ao perfil de Portugal no Mundo e na História: eis a síntese perfeita, eis o que todas as exigências, todos os anseios, todas as reivindicações, todos os clamores e todas as reformas devem preservar, no interesse da sua própria satisfação. E ainda há dias em Roma, a, 24 do mês de Novembro, a voz autorizada de Paulo VI ensinou doutrina de reter, e cito as suas próprias palavras:

Se o vento da insatisfação deve levar-nos a ceder à mentalidade do Mundo, a seguir as modas e as atitudes efémeras e variáveis, e a copiarmos o Mundo sem discernimento, então será deplorável o resultado.

Defendermo-nos de que assim nos aconteça é do nosso dever e do nosso interesse. E acrescentarei que poucas vezes na História teremos enfrentado uma emergência em que, de um só golpe, tanto tenhamos a perder e tanto tenhamos a ganhar. Mas teremos muita força se possuirmos a coragem de não dar razão ao adversário; e, se não conhecermos a fadiga, nem enfraquecermos a nossa vontade e a nossa paciência, muito na verdade teremos a ganhar.

Cuido por isso que se nos impõe guardar a serenidade e a lucidez da nossa visão, a consciência do que é transitório, a frieza nas decisões, a autonomia nas ideias, a independência nos princípios, a tenacidade nos propósitos e o destemer nos actos. Não devemos nem podemos esquecer toda a comunidade internacional, de que somos parte. Menção separada, todavia, será de dedicar ao Brasil, e estou certo de que exprimo os sentimentos unânimes das duas Câmaras se afirmar o desejo de que continue a expandir-se a Comunidade Luso-Brasileira, e neste particular permito-me dar aqui .testemunho pessoal do altíssimo serviço que o Sr. Presidente do Conselho prestou àquele ideal e ao País com a sua visita de há poucos meses. Mas com todos os que compõem a sociedade internacional poderemos conviver. Entendamo-nos, porém: convivência não significa abdicação, nem uniformização, nem adopção de modo de ser dos demais. Para além disto, de todos poderemos ser colaboradores sinceros sem subordinação, aliados fiéis sem subserviência, amigos leais sem servilismo, e até adversários correctos sem arrogâncias a que não somos afeiçoados, nem transigências que nos apouquem.

Sr. Presidente da República: São as duas Câmaras hoje aqui reunidas órgãos representativos da soberania nacional.

Nos termos constitucionais, cabe-lhes um vasto papel no Estado e na vida da comunidade portuguesa. E há que recordar as muito especiais responsabilidades que no plano legislativo e no plano político competem às Câmaras actuais. Mas não podemos subes timar, por outro lado, as funções normais da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa, e nesse âmbito surge o problema das suas relações com o Governo. Decerto não podem, nem querem, aqueles dois órgãos da soberania abdicar do exercício pleno das suas atribuições: fiscalizar, formular reparos onde for caso disso, comentar quando convier, sugerir quando preciso, elogiar quando justificado. Para tanto caberá isenção no debate, responsabilidade na crítica, ponderação nas sugestões, generosidade no aplauso, firmeza nas deliberações. Mas tudo é facilitado pela existência de um clima, comum ao Governo e às Câmaras, de unidade ideológica fundamental: prosseguir incansavelmente os interesses portugueses, salvaguardando o que é essencial na História e na vida colectiva e realizando o que é útil e necessário na vida individual de hoje. Nenhuma dúvida há de que este pensamento constitui para todos nós guia permanente. Foram extensamente renovadas as duas Câmaras. Novas gerações e valores novos vêm contribuir com novas ideias, expressar novas preocupações, transmitir novas aspirações. Beneficiarão assim as Câmaras de uma atmosfera de renovação, entendendo-se esta, decerto, não como cópia ou adopção de ideias alheias, mas como aperfeiçoamento das nossas próprias. Mas na adesão àquele pensamento superior todos se sentem irmanados e identificados, e essa será a base sólida para a cooperação entre todos, com ânimo construtivo e a mais larga compreensão, e com o espírito sempre dirigido para os mais altos objectivos da Nação e para a defesa dos seus interesses. Sei que exprimo o sentir íntimo dos Deputados e Procuradores ao afirmar ao Chefe do Governo, neste lugar e nesta hora, os propósitos sinceros de uma colaboração leal e franca. E, em nome das Câmaras, Sr. Presidente da República, aceite V. Ex.ª Os votos de felicidade pessoal que desejamos ao homem, o testemunho de respeito que nos merece o cidadão, os sentimentos de fidelidade que são devidos ao Ch efe do Estado.

O orador foi vibrantemente aplaudido.

Terminado o discurso do Sr. Deputado Franco Nogueira, o Sr. Presidente da Assembleia Nacional disse:

Em nome de S. Ex.ª o Presidente da República, declaro inaugurada a X Legislatura da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa. E, ainda em nome de S. Exa., declaro encerrada a sessão.

Eram 18 horas.