quanto as mesmas têm de velhas, ou como são lançadas para servir interesses e objectivos alheios.

Ou então só podem julgar assim aqueles que sem coragem pana explicitar o seu pensamento integral, procuram na realidade propagar e fazer aceitar opções económicas que antecipadamente sabem conduzir depois a opções políticas que se tornavam então inevitáveis. Assim, através do pretexto de um progresso e de um desenvolvimento que por essa via não conseguiríamos, se frustrariam os sentimentos â a vontade que ainda em Outubro último a Nação bem claramente exprimiu. Por todos estes são-nos apresentadas múltiplas sugestões. Há quem lance a ideia de um mercado comum ibérico. Mas temos de ver que enfare os dois territórios em que politicamente a Península está separada não há paralelismo de potencial, nem equilíbrio de recursos, nem equivalência de população, nem semelhança de áreas- e estas realidades indestrutíveis não podem ser apagadas por expressões verbais de amabilidade e cortesia - e uma tal construção económica arrastar-nos-ia, talvez lenta mas seguramente, para uma situação que nenhum de nós deseja. Temos da ser e devemos ser amigos do grande povo espanhol, e é no interesse de ambos que assim seja...

O Sr. Júlio Evangelista: -Muito bem!

O Orador: - ..., mas não percamos de vista os fautores iniludíveis a que há pouco fiz referência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, esta alusão à Espanha fornece-nos um exemplo significativo. Todos concordam em que a Espanha tem na última década- alcançado extraordinário progresso económico, industrial, comercial, e que cresceu substancialmente o nível de vida do povo espanhol. Só temos de nos congratular com o facto. Mas para obter aqueles resultados não foi preciso à Espanha pertencer ao Mercado Comum, ou à E. F. T. A., nem integrar-se na Europa, e foi fora de todos os agrupamentos que a Espanha melhor defendeu os seus interesses. Mas há ainda quem sustente entre nós que o segredo do nosso futuro está numa integração no Mercado Comum. Se o fizéssemos, nos termos em que a proposição nos é submetida, passaríamos a ser colonizados pela Europa, e depois A Europa colonizaria o ultramar português. Podemos estar certos de que a Europa não vai cuidar da nossa prosperidade. Seria este mais um momento em que nos precipitaríamos atrás dos princípios dos outros, e de cada vez que o fazemos estamos convictos de que esses princípios são irreversíveis, e só mais tarde, e por alto preço, nos damos conta do erro e da precipitação. E a eterna obsessão de alguns de que só estamos integrados na política internacional se fizermos a política de terceiros, mas o que nos interessa é termos a nossa própria política, e isso é que nos dá prestígio e impõe respeito.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E a verdade é que no momento em que não tivéssemos iam desacordo ou conflitos com ninguém, e só recebêssemos bons e piedosas palavras de todos os países e governos, então já não teríamos política independente, nem estávamos já defendendo os nossos objectivos, mas somente apoiando os de outros. E a outra coisa não nos levaria a opção europeia. De resto, repare-se que uma opção europeia nossa teria inevitavelmente de passar pela Espanha, com tudo o que isso implicaria.

Por outro lado, enquanto a Europa se preocupa em conquistar mercados noutros continentes, alguns de nós parecem de súbito obsecados com o mercado europeu, em que dificilmente podemos competir; e no planeamento que fazem esquecem o nosso próprio mercado interno - metrópole e ultramar-, que é o nosso, e que outros se apressariam a ocupar rapidamente se tivéssemos a ingenuidade, que seria trágica, de não encararmos os problemas nacionais num plano global integral. Se acaso nos entregássemos amarrados à Europa, arrastaríamos uma existência precária e nominal, e isso seria planear era pequeno e estreito horizonte.

Objectam alguns que os países da E. F. T. A., ou muitos deles, podem amanhã ser admitidos no Mercado Comum, e que seria para nós desastrosa a situação se ficássemos excluídos. Confesso não compreender o argumento. Se e quando aquele hipótese se der, o Mercado Comum passaria a ser uma construção inteiramente diferente da actual, com outros princípios e outra, estruturou, outra política, outro carácter. Se os países da E. F. T. A., designadamente a Inglaterra, entrarem no Mercado Comum, este será desde logo diluído na sua rigidez; e então ajuizaremos melhor de qual o comportamento que nos convém, e a forma, de negociar. Mas há ainda, Sr. Presidente, os que olham a metrópole como base separada de desenvolvimento donde se partiria para desenvolver depois o ultramar. Creio que estamos, aqui, em erro. É que o próprio desenvolvimento da metrópole comporta ópticas diferentes, consoante a encaremos sozinha ou em conjunto com o ultramar; é que seria mais lento o próprio desenvolvimento da metrópole, como seria o do ultramar, se fossem feitos isoladamente; e caberá perguntar, além disso, se o ultramar esperaria pelo desenvolvimento da metrópole.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Enquanto aguardassem que a metrópole se desenvolvesse, que fariam as províncias? Aguardariam pacientemente, ou seriam desenvolvidas por outros, que o fariam, decerto, à revelia da metrópole e, sobretudo, contra esta?

O Sr. Casal-Ribeiro: - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isto, eu diria que só uma política global, de planeamento integral, é que pode ser uma política larga, grande e rusgada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Dois pontos mais, Sr. Presidente, e concluirei as minhas palavras.

Afigura-se que alguns julgam, ou pelo menos insinuam, que uma política nacional destinada a manter a Nação íntegra na sua totalidade actual é uma política antiquada, virada ao passado, conservadorista, mesmo reaccionária; e que é uma política de protecção de interesses criados, de travão ao desenvolvimento, de monopólios económicos, de simples apego a valores históricos: e que é uma política onde não cabe a justiça social e uma mais equitativa distribuição da riqueza nacional.

Por mim, penso que temos de reabilitar o ideário português e afirmar corajosamente que a política nacional portuguesa não é conservadora, mas audaciosa, não é antiquada, mas de futuro, e não está apegada a valores históricos, mas a interesses materiais colectivos, concretos e palpáveis, de hoje e de amanhã.

Vozes: -Muito bem!