Sr. Presidente: Haveria certamente, mais observações de carácter técnico a fazer à proposta de lei. Mas, porque se situam no domínio do pormenor e do ajustamento do articulado das bases, pertencem à discussão na especialidade.

Sem deixar de dirigir ao ilustre titular da pasta da Justiça uma palavra de particular apreço e de aplauso pelos propósitos tão humanos que informam a proposta de lei, declaro que a aprovo na generalidade.

Vozes: - Muito bem !

O orador foi cumprimentado.

O Sr. João Manuel Alves: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela vez primeira em que tenho a honra de subir a esta tribuna quero saudar a todos, na pessoa de V. Ex.ª, Sr: Presidente, a quem também presto as minhas sinceras e sentidas homenagens, não apenas pelo lugar & que os seus méritos o alcandoraram entre nós, mas, sobretudo, pela maneira, ao mesmo tempo lhana e inteligente, como o tem servido.

Srs. Deputados: Entendeu o Governo submeter à Assembleia a proposta de lei agora em discussão.

Antes de mais, saúdo o facto, por duas ordens de razões:

Em primeiro lugar, pela marcada intenção do Governo, já revelada em anterior proposta, de confiar a esta Câmara a palavra final acerca da regulamentação das situações que, por não serem conjunturais, exigem antes ampla discussão e definição de princípios.

Depois, pela proposta em si mesmo, no impulso que pretende ser para se atingir a meta que o Estado - qualquer Estado- se não pode furtar de buscar: o da realização resentantes -, mas ainda quando são violadas normas de direito privado. Também aqui há todo o interesse em assegurar que o ordenamento da vida social se mantenha firme e íntegro.

Quanto a este ponto, adiro, sem relutância, à tese de Ihering da «luta pelo direito».

Os princípios de direito privado serão inertes se aquele que estiver investido no seu direito não puder fazer a afirmação dele.

Escreve aquele autor:

Quando a arbitrariedade e a licença intentam, com ousadia e temeridade, levantar a cabeça, é sinal seguro de que não cumprem com a sua obrigação os que são chamados a defender a lei. Todavia, no direito privado, cada um, em sua esfera de acção, está obrigado a defender a lei, a guardá-la e a cumpri-la.

O seu direito concreto é a faculdade outorgada pelo Estado de descer à liça judicial para defender a lei e estorvar a injustiça.

Aplicando o pensamento do filósofo ao instituto de que nos ocupamos, diríamos, pois, que a assistência judiciária se impõe não apenas pela prossecução do princípio da igualdade de todos perante, a lei, trazido à colação por razões económicas, mas também, atentas essas razões, por um dever de solidariedade da sociedade para com todos aqueles, que, afirmando o direito em que estão investidos, salvaguardam, ao mesmo tempo, o ordenamento social na luta contra a injustiça.

Deste moda, e também nesta, visão do problema, é de saudar a presente proposta de lei, toda ela orientada no sentido de facilitar o recurso aos tribunais, com o alargamento da assistência a todos quantos gozem de personalidade judiciária, sem qualquer restrição, e com profunda simplificação do processo de concessão.

Parecem-me estes os pontos mais salientes da proposta em discussão.

Antes, porém, de os valorar, só uma palavra para aqueles que, no meu modesto entender, mais acesa mantêm a luta pelo direito - os advogados.

Sem eles, sem o seu contributo eficaz, sem o seu alto sentido de ética profissional, seria inerte qualquer instituição de assistência judiciária.

É devido ao seu alto sentido de dever (c) da função que exercem que tem sido possível não só o funcionamento do instituto, mas também a sua superação, em termos de não ser negado- a ninguém o direito à justiça.

Estou convencido de que, não há no País advogado que não se impusesse a si próprio, sem a obrigatoriedade de escalas ou de nomeações, o dever de proporc ionar patrocínio gratuito a quantos dele tiveram necessidade.

Irei mais longe: a maior parte, se não todos, já alguma vez, pelo menos, sacrificou relações de amizade ou de cortesia, suportou más vontades e desbaratou a saúde, sem qualquer estímulo material, apenas para honrar o seu ministério, em defesa de uma causa justa, ao serviço do direito.

Pareceu-me ser meu dever deixar aqui esta palavra de justiça a uma classe tantas vezes injustamente apreciada, até porque do texto da proposta, na medida e pelo modo como se regulamenta a sua contribuição, poderá o leigo tirar ilações menos exactas.

Olhando agora mais de perto a proposta em discussão, direi, antes de mais, que lhe darei o meu voto de concordância na generalidade.

O instituto que agora se pretende reformar começou a vigorar, entre nós, em 1599, por Carta de Lei de 21 de Julho desse ano, inspirado na lei francesa de 1851. Em 1927 a sua regulamentação foi integrada no Estatuto Judiciário, aprovado pelo Decreto n.º 13 809, do qual constituía o título IX, aí se mantendo com as reformas do mesmo Estatuto de 1928 e 1933.

Em 1944 foi separado, de novo, da organização judiciária, sendo objecto de diploma à parte - o Decreto-Lei n.º 35 548.

A definição do estado de carência económica que determina a concessão da assistência judiciária poderá dizer-se que, embora com formulação diversa, é, desde sempre, no fundo, idêntica à que consta da proposta.

Na verdade, embora a Lei de 1899 e o Decreto de 1927 falassem em litigantes pobres, o contexto de ambos apontava a interpretação desse vocábulo, como sendo a de pobreza relativa; pois no articulado desse diploma, exigia-se a alegação e a prova de o pretendente à assistência «não