de satisfazer pelo menos 60 por cento, das suas importações e exportações. Recordo que em teoria, era esse o alvo do nunca de mais enaltecido despacho n.º 100.

Suponho que a tonelagem de que dispúnhamos em fins de 1969 pouco ultrapassava os 30 por cento! Daqui pode avaliar-se o que se consome em divisas com afretamento de navios estrangeiros e, por vezes, quando há urgência, em que condições desfavoráveis esse afretamento terá de ser feito.

O tráfego marítimo entre portos portugueses está reservado à bandeira nacional e desde logo bem, mas se os armadores não dispõem de navio** para satisfazer as exigências desse tráfego, haverá coerência nesta reserva?

Em 1969, par exemplo, houve que afretar navios estrangeiros para, transportar 340 000 t sobretudo minérios, carvão e madeira!

Não preciso de acentuar que outros países marítimos se apoiam nas suas frotas de comércio como elemento de grande riqueza nacional, fonte poderosa, do divisas, constituindo essas frotas as suas mais eficientes indústrias. São tantos casos que não merece a pena aflorá-los. Mas o problema do aumento substancial e modernização da nossa marinha marcante não é simples, não só pela diversificação de tipos de navios em face das novas técnicas de cargas e embalagens como de adaptação das infra-estruturas portuárias.

Aqui, com em tantas outras actividades nacionais, há um trabalho exaustivo de estudo, investigação e coordenação e executar, que nem pode ser esquecido nem menosprezado, nem pode ser atributo de um só departamento.

O mundo de hoje é cada vez mais interdependente, é facto, mas essa interdependência não uniformiza nem dirige a maneira de viver e agir, nem condiciona os hábitos. O nosso pequeno mundo do nação plurirracial dispersa por continentes, que as rotas do mar aproximam e cimentam, é um versa lista, repito, de interesses primordialmente oceânicos e a nossa vocação e futuro, como o passado e o presente, estão no mar, nesse mar imenso, misteri oso. que nos traz sempre novos aspectos e novas surpresas e que são, insisto, ainda a base da nossa existência.

Diria, como alguém há pouco referiu, que, «no mar estamos em nossa casa e na Europa em casa dos outros», ainda que algumas de bons vizinhos.

Mas toda esta divagação resultou de sentir, como velho marinheiro, que não podemos perder, e agora mais do que nunca, o sentido do mar. E afinal tecer algumas considerações acerca da situação de mediocridade da nossa marinha mercante, com as suas 700 000 t de arqueação bruta, que lhe dá o 28.º lugar entre os países marítimos!

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª poderia esclarecer-me no seguimento das pertinentes considerações, que está a fazer, se acha razoável que a, reserva do tráfego marítimo à bandeira nacional entre, portos portugueses se mantenha com legitimidade quando a nossa marinha mercante se não encontra suficientemente apetrechada para corresponder às necessidades desse tráfego e consequentemente, ao maior desenvolvimento económico metropolitano e ultramarino?

O Orador: - Mas foi justamente isso o que acabei de dizer. É, correcto que esteja reservado o tráfego à bandeira nacional, mas o que me repugna aceitar é que os armadores ou as empresas a quem está reservado o uso exclusivo desse tráfego não estejam habilitados com os meios, em navios, necessários pana o satisfazer.

O Sr. Cunha Araújo: -Muito bem! E quando se tem de recorrer ao afretamento dei barcos estrangeiros, a quem deve caber esse afretamento?

O Orador: - Ate certo ponto esse problema é um pouco complexo, ou melhor, com que não estou familiarizado, mas, como V. Ex.ª sabe existe a Junta Nacional da Marinha Mercante. Mas a Junta é sómente o organismo de coordenação económica que deverá distribuir, equitativamente, entre as companhias a que está reservado esse tráfego, o direito de a fretar navios.

O Sr. Cunha Araújo: - Mas V. Ex.ª não acha que isso é consentir numa actividade agenciadora que só servirá para encarecer os transportes requisitados?

O Orador: -Eu disse realmente que os afretamentos, principalmente em situações de urgência, sairão mais caros, o que redundaria em encargos maiores. Todavia, na continuação das minhas considerações, talvez tenha mais alguma, informação a prestar.

O Sr. Cunha Araújo: - Parece que seria mais razoável que, quando houvesse necessidade de recorrer à tonelagem estrangeira, fosse realmente a Junta Nacional da Marinha Mercante quem fretasse os navios para os indivíduos que necessitassem desses transportes, e não as empresas, como intermediárias, a exercerem uma função agenciadora.

O Orador: - Nessa altura estávamos a dar talvez à Junta Nacional da Marinha Mercante uma função que não é a sua, porque a Junta não pode ter funções comerciais, visto serem as suas atribuições de coordenação e de disciplina de tráfegos entre os diferentes armadores, de acordo com a reserva de que usufruem.

De maneira que tal hipótese afigura-se-me, repito, fora das atribuições da Junta Nacional da Marinha Mercante. Todavia, eu não estou perfeitamente dentro dos assuntos da Junta, visto que a minha vida se passou na marinha de guerra. Mas o que se afigura é que a Junta da Marinha Mercante, como faz a distribuição dos navios das companhias pelas carreiras regulares e outras, fixando horários, etc.. para servir os territórios ultramarinos, poderia também distribuir pelas companhias determinadas quotas no afretamento de navios estrangeiros; mas eu faço a seguir mais algumas considerações, que naturalmente irão ao encontro do que V. Ex.ª pretende.

O Sr. Cunha Araújo: - Eu quero acrescentar mais uma observação.

O Sr. Roboredo e Silva: - Faz favor de dizer, eu estou pronto a responder.

O Sr. Cunha Araújo: - Parece-me que, justamente, a reserva do tráfego à bandeira nacional teve o sentido de incentivar, junto da nossa marinha mercante, a aquisição de barcos para os transportes nacionais. E isso não se tem passado, o que é lamentável. E eu tenho ouvido queixas nesse sentido, e é por isso mesmo que fiz esta observação. Eis o que importa acentuar, a fim de que se salvaguardo o melhor modo de servir a economia metropolitana e ultramarina.

O Orador: - É isso mesmo que eu vou dizer a seguir. De resto, a minha posição é talvez um tanto fora da rotina, passe o termo.