É mais difícil endireitar uma coisa que está torta do que fazer bem uma coisa nova.

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - Friso mais uma vez que as economias metropolitana e ultramarina, exactamente pela diversidade dos seus recursos e das suas características, devem e têm da se completar uma à outra, não se sobrepondo nem competindo entre si. Assim chegaremos, sem dúvida, à conclusão de que o potencial do todo é muito superior à soma dos valores individuais das vários parcelas que constituem a economia do espaço português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, como ia dizendo, as nossas forcas armados cumprem briosamente a tarefa que humanamente lhes é possível levar a bom termo: a estabilização da situação que nos dá o espaço e o tempo necessários a ocupação económica. À nós, civis, compete agora consolidar os benefícios dos ganhos militares que dia a dia vão somando para a vitória final.

Li, algures, que os guerras subversivas ganham-se na frente da batalha e pendem-se na retaguarda; que a história nunca possa registar esse facto, no caso da luta em que o povo português está empenhado.

Eu sei que tudo isto está na mente do Governo e só será rebatido por certos inconscientes, por não conhecerem o problema. Mas estaremos nós a tentar resolver a situação com o expediente e o vigor que ela requer?

Aqui me permito Apresentar os minhas dúvidas, desta vez suscitadas pelos termos em que foi criado o Gabinete do Plano do Zambeze, que, embora constituindo um passo em frente, é, na verdade, um passo muito pequeno, dado a medo e colhido pela mentalidade que receia, se é que não admite mesmo, a indispensável mudança profunda de atitudes e de sistemas.

Temos no projecto de Cabora Bossa o mais importante elemento de desenvolvimento jamais lançado em território nacional. A energia não produzida vai servir uma grande parte de Moçambique e vai atravessar as fronteiras dos países vizinhos. O vale do Zambeze tem um potencial tremendo no campo, mineiro, agrícola e agrícola e pecuário. A oportunidade é única mas tem de ser aproveitada já, pois o ritmo da vida moderna não consente hesitações e muito menos demoras nascidas de estreiteza de vistas e de tibieza na procura de soluções.

Temos em Moçambique, para não dizer em todo o território nacional, uma administração pública que está desactualizada e que se encontra ultrapassada pela urgência dos problemas que se lhe deparam. A máquina burocrática é soberana e tudo tolhe, permitindo prepotências inconcebíveis que só causam prejuízos e, o que é muito pior, esgotam a paciência e sufocam boas vontades, por mais firmes que sejam.

Para fazer alusão apenas a dois casos de que tenho experiência pessoal, lembro-me de um pedido de alvará que subscrevi para a montagem de uma fabrica de tintas e que levou miais de cinco anos a conceder!

Há poucos meses foi-me necessário requerer autorizarão para o pessoal da minha empresa trabalhar por turnos num trabalho que não admitia interrupções e que se prolongava por cerca de três meses, pois o pedido, cujo deferimento levou mais de quinze duas, teve de ser feito, mediante elevado número de folhas de papel selado, a S. Ex.ª o Governador-Geral de Moçambique (notem VV. Ex.ªs, ao mais alto magistrado da provincial), porque o governador do distrato só tinha competência para autorizar esse regime especial de trabalho por um período não superior a dois meses!

Não haverá consciência dos prejuízos e dos desânimos que estas coisas causam?

No vale do Zambeze podemos talvez dizer que as grandes concessões para pesquisar e explorar minérios estão já dadas a poderosos grupos financeiros, nacionais e estrangeiros. Esses Viveram os recursos necessários para poderem esperar; é do meu conhecimento que pelo menos um destas entidades levou dois anos e meio até assinar o contrato de concessão!

Há que chamar e atrair o grande capital, quer nacional, quer estrangeiro, mediante uma informação séria, objectiva e esclarecida sobre o ultramar, necessidade premente a que já aludiu nesta Assembleia a Deputada Dr.ª Custódia Lopes. Porém, não basta apenas o atractivo, é preciso haver o meio ambiente propício à instalação de novas actividades, conforme disse um conhecido industrial metropolitano numa entrevista publicada em Lourenço Marques no jornal Tribuna, em 5 de Fevereiro de 1965, e da qual cito esta passagem:

Resumindo numa só frase - acentuou o industrial visitante -, todos os territórios que se querem desenvolver têm de criar um condicionalismo atraente. No Mundo há capital; no Mundo há técnica; e tanto quanto os nossos contactos pessoais o permitem afirmar - prosseguiu -, esse capitel e essa técnica estuo absolutamente dispostos a instalarem-se no ultramar português. Só que o não farão, naturalmente, enquanto, como agora, desconhecerem toda a estrutura legal que lhes permita uma implantação segura.

Mas o desenvolvimento do vale do Zambeze, embora não possa de forma alguma dispensar o grande grupo, também não pode dispensar a presença da pequena empresa e até do empresário individual, tonto mais que é nestes sectores que a ocupação ao nível humano será mais significativa.

Serão estes médios e pequenos empreendimentos que acabarão por encher os vazios da nossa frente de ocupação económica, tornando-o estanque a influências menos desejáveis e até subversivas. Trata-se, portanto, de um aspecto que convém não deixar de acarinhar, auxiliar e fomentar por todos os meios.

Como primeiro passo para a coordenação dos esforços, quer no sector público, quer no particular, que vão ser despertados e activados pelo projecto de Cabora Bossa, surge-nos a criação do Gabinete do Plano do Zambeze, que, infelizmente, fica muito aquém do que seria de desejar como órgão orientador e incentivador dos fins em vista.

Desejo, neste momento, afirmar muito claramente que a crítica que vou fazer não é de modo algum destrutiva; admiro o trabalho e o estudo que entraram na elaboração do Decreto-Lei n.° 69/70, mas, na minha opinião,