interesse que vejo merecerem de toda a gente e em todo o lado as coisas do ultramar.

Pois o ultramar é hoje a primeira frente onde se defende a Nação. Daí o motivo doa cuidados de todos!

Mas a verdade é que o ultramar se mantém quase na ignorância e no incógnito de muita gente. Exactamente, sublinharei que nesta Câmara muitos foram já os distintos colegas que me salientaram o seu enorme desejo de conhecer o ultramar para poderem formar uma ideia - ainda que aproximada - das suas realidades e das suas perspectivas.

Porquê este silêncio?

Eis uma angustiante interrogativa para que nunca encontrei resposta válida.

Os inconvenientes daí resultantes são catastróficos e tão evidentes que me escuso de lhes dar relevo. Todavia, não deixarei de salientar que só essa ignorância permite que certos apátridas, sem a menor dignidade e qualquer escrúpulo, espalhem e cheguem até a ter audição em algumas camadas de gente de boa fé (porque a outra não conta evidentemente) aquilo que o Sr. Presidente do Conselho, com certa parcimónia, classificou como infâmia, mas que é muito mais do que isso - é traição.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - "Que no ultramar o que se defende são só os interesses do grande capital, dos trusts e dos monopólios!"

E fazem esta e outras afirmações com um descaramento inaudito, pois têm consciência que se lhes não contrapõe um auditório devidamente informado e ao por das circunstâncias que logo os desmascare.

Quando é uma constatação histórica e uma realidade que as grandes empresas e o grande capital não têm pátria! Com a sua habitual lucidez, bem significou o Sr. Presidente do Conselho que quem mais sofreria se, por infortúnio, viéssemos a perder o ultramar seriam, sim, os humildes agricultores, os milhares de pequenos comerciantes os donos de modestas indústrias e toda uma legião de funcionários públicos e empregados expulsos ou fugidos à fúria antiportuguesa. "E não só os brancos!"

E possível que VV. Ex.ªs o não saibam, mas em 1961, por exemplo, ficaram, milhares de pessoas a dever as suas vidas a elementos da população nativa, que os vieram avisar, que os protegeram com sacrifício das próprias vidos e com a consciência dos riscos que corriam. E que acabaram até, quantas vezes, por pagar com sangue a sua lealdade e o seu portuguesismo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E com que sanha feroz os elementos da desordem retaliaram, matando, decepando, mutilando.

E ainda não há muito tempo! Se VV. Ex.ªs se derem ao cuidado de ler, por exemplo, a elucidativa reportagem que vem na última revista A Noticia, ali podem ver a fotografia de homens profundamente golpeados, com orelhas cortadas, e que, conseguindo fugir, revelaram as atrocidades de que foram vítimas e por que o foram.

Não é, pois, de estranhar que qualquer dos movimentos que actuam em Angola, em Moçambique e na Guiné não tenha conseguido um dos meios indispensáveis & guerra subversiva: o alcançar apoio das populações. Ao contrário, até são elas, a maior parte das vezes, dos elementos mais válidos e mais colaborantes com as nossas forças. Isto é que é a verdade e um dos frutos da grande virtude do Português, da sua capacidade de adaptação, da sua comunhão de espírito e de facto com todas as etnias, da inúmera possibilidade de se integrar, captando simpatias e fazendo amizades.

E isto demonstra também que se em outras lutas semelhantes grandes potências claudicaram, o certo é que, naquela que nos impõem, mudam os dados do problema, e é isso exactamente que nos promete melhores dias e faz acalentar a esperança na vitória final. Disso não podemos duvidar um momento só que seja, porque a dúvida é já enfraquecer!

São estas e muitas outras coisas que se têm de saber. Têm e devem!

Valha-nos ao menos a propaganda que da realidade ultramarina começam a fazer, ao regressar, os soldados que ali vão cumprir o seu dever, pois são eles hoje o melhor meio de difusão da verdadeira verdade do ultramar português.

E quantos deles até ali não ficariam se encontrassem meios de ganhar a vida.

O que, não ocorrendo em territórios de tão larga dimensão è vastos recursos, e onde há lugar para todos, também nos faz ver que algo está errado.

E isto cria até uma situação dramática ao País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estes rapazes embarcaram em Lisboa e aí vão mar fora a cumprir o seu dever para com a Pátria.

Durante a sua campanha, porém, rasgam-se-lhes outros horizontes e opera-se neles uma transformação radical.

Encontram um mundo novo, prenhe de perspectivas, bem diferente da aldeia donde vieram.

Adquirem conhecimentos, ganham experiência, integram-se noutras realidades da vida e acalentam naturalmente sonhos e alimentam outras ambições. O homem que partiu já não é o homem que volta.

Querem ficar no ultramar, mas como há míngua de infra-estruturas que lho possibilitem, e como já se não comprazem em voltar à vida antiga, emigram em busca de novos mundos. Mas não só por isso!

Encontrei há anos um desses homens em Paris e falei com ele e inquiri porque, sendo operário especializado e tendo a possibilidade de angariar trabalho em Angola e bem remunerado, e gostando de o ter feito, como disse, preferia emigrar. E ele respondeu sucintamente: "Pois eu daqui possa mandar à minha família o dinheiro que quero, ao passo que se ficasse em Angola as dificuldades em o fazer eram quase insuperáveis!".

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Este facto real e vivo impressiona. E põe-nos perante a necessidade de a todo o transe procurar a solução para fixar esses homens em terra portuguesa, onde há lugar para todos. Ponto é que se vençam os obstáculos que até hoje o vêm dificultando.

Mas dizia eu que é urgente que se trabalhe em força para diminuir a ignorância do que é o ultramar português.

Na verdade, pouco, muito pouco mesmo se tem feito para explicar aos Portugueses o que é o ultramar e porque este desejo de não permitir a desintegração do território nacional e porque nos transcende e porque está para além de nós. Para além e para aquém!

O povo português não pode nem deve continuar a manter-se na ignorância do que se passa em parcelas - distantes, sim, mas integrantes do solo nacional. Não basta falar da luta que travamos, nem derramar lágrimas pêlos que tombam ou entoar hossanas pelas vitórias da ordem sobre a desordem e o desaustinamento.