autonomia intrínseca que, especificamente, não lhe advenha da sua própria posição no complexo da organização social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Também aqui o problema sai para fora do âmbito da Universidade: extravasa para a sociedade em geral e para as formas institucionais que no Estado lhe concretizam a organização.

É que, para além da simples máquina burocrática que todos conhecemos e que quando muito caracterizaria o Estado em sentido estrito, há, um Estado em sentido amplo, sede e forma de toda a organização, disciplina e progresso da sociedade. É responsável por ela e não pode alhear-se dessa responsabilidade e muito menos demitir-se dela! O que pode e deve é debruçar-se sobre as formas paraestaduais típicas em que possa assentar o seu melhor funcionamento. Para os que acreditem que a forma corporativa tem aí a sua justificação, a Universidade deve ser concebida e construída como autêntica corporação, corporação de escolares (que mestres e alunos o são ou devem ser permanentemente num esforço comum, embora diferenciado pelo trabalho, a difusão e o progresso da ciência e da cultura). Mas, cautela! Que cio princípio hão-de tirar-se todas as consequências, e não apenas as agradáveis. A autonomia, dentro do quadro geral da sociedade de que a Universidade faz parte, é apanágio da Universidade- corporação; não tem cabimento fora desse quadro; e deriva de um princípio que só pode ser aceite ou rejeitado em bloco. Tenhamos isto bem presente, para não nos iludirmos n nós próprios.

Para não nos iludirmos a nós próprios, nomeadamente no campo da participação, na orçamentação e na gestão da Universidade, de todos os que vivem nela; e, também, no campo dos processos de reforma defendidos.

É que a concepção corporativa da Universidade afasta liminarmente a ideia de um palco- onde as regras de luta do classes determinem o equilíbrio dinâmico da instituição. Conflitos e tensões existem sempre, por natureza e definição de organização social; mas não se situam, como é óbvio, no plano da luta de classes que a sublimação corporativa rejeita essencialmente; as formos de participação

- de uma participação que não poderá nem deverá esquecer-se - estão, assim, iniludìvelmente dependentes da concepção aceite para as instituições universitários; e hão-de modelar-se segundo a concepção a defender.

O mesmo sucede, com algumas diferenças, no processo reformista em que se opõem u reforma por constrangimento estadual (quer dizer, da sociedade organizada juridicamente) e a levada, a efeito pela via da auto-reforma.

Não basta chorar as lamentações, lançar anátemas e emitir juízos - juízos porventura temerários e baseados em generalizações indevidas-, é mister ter a coragem da coerência, mesmo que ela nos custe o sacrifício de sonhos antigos e das convicções que neles arreigamos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: É tempo de terminar. À luz dos princípios enunciados, apreciei o aviso prévio do Sr. Deputado Miller Guerra e as brilhantes intervenções que têm constituído o debate. À mesma luz eventualmente me pronunciarei sobre os votos concretamente formulados pela Câmara sobre este magno problema.

Mas não quero, e em consciência não posso, deixar esta tribuna sem manifestar ao ilustre apresentante, com os melhores cumprimentos, que, comungando nos mesmos anseios por uma Universidade remoçada e cada vez mais dignificada, junto os meus votos aos seus votos de que o Governo, como o vem fazendo com o dinamismo e a perseverança do Ministro Veiga Simão, continue a prosseguir o caminho iniciado: que, mais do que apenas uma reforma, é o da instituição em todos nós, em todos nós, repito - mestres, alunos, Governo e País -, de um verdadeiro e permanente espírito de reforma.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Miller Guerra: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sei se algum dia o Deputado avisante subiu a esta tribuna com o espírito mais jubiloso do que o meu. Creio ter razão de estar satisfeito - o acolhimento que tiveram as ideias expostas no aviso prévio, adesão da Assembleia a maioria das teses defendidas, bem como o eco que me chega de vários quadrantes, fazem-me crer que a matéria versada ocupa um lugar central nas preocupações e expectativas gentis.

Quero referir-me, muito em especial, aos Srs. Deputados que intervieram no debate, sem distinguir nenhum, pois mesmo aqueles que divergiram das opiniões e ideias que sustentei trouxeram a discussão um valioso contributo.

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem!

O Orador: - Direi até que me agradaram tanto as vozes discordantes como as outras - porque é pelo intercâmbio do pensamento expresso com liberdade que a cultura se engrandece.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Desagradam-me as vozes conformistas por temor ou sistema; as concordâncias passivas ou atormentadas; os embaraços causados à manifestação dos anseios, das ideias ou dos credos. Agrada-me o debate franco, como aquele que estes dias decorreu aqui.

Bem desejava asseverar que a mesma liberdade de expressão foi respeitada fora dn Assembleia Nacional, mas a verdade, manda dizer que mio sucedeu assim.

O Sr. Almeida Cotta: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Foça favor.

O Sr. Almeida Cotta: - Estou autorizado a afirmar o seguinte:

1.° A Presidência do Conselho deu ordem categórica para não serem feitos cortes nos textos dos discursos dos Srs. Deputados, quando do texto autêntico se trate;

2.° Tendo o Presidente da Assembleia transmitido n queixa de V. Ex.ª, foram pedidas explicações, tendo a Direcção dos Serviços de Censura informado que não houve cortes no texto do discurso, mas sim nos subtítulos com que certo jornal pretendia tirar efeito de certas passagens e nos comentários desse mesmo periódico.

O Orador: - Agradeço muito a V. Ex.ª a comunicação que faz, mas tenho provas de que foi cortado o texto, e por consequência, se o Sr. Presidente me dá licença, leio integralmente aquilo que tinha escrito.