francas e singelas, cumpro, antes de mais, um imperativo de consciência, pois o respeito e o apreço pelas qualidades de carácter de uma pessoa são devidos em justiça. Obedeço também do mesmo passo a um impulso do coração: a cativante simpatia de V. Ex.ª, a sua bondade, o seu permanente bom humor, transformaram a solidão do lugar que ocupo na Mesa, à esquerda da cátedra curul, em convívio inesquecível e o exercício de funções tantas vezes Áridas em colaboração gostosa com quem muito se admira - poderei dizer: com quem se mantém verdadeira amizade?

Sr. Presidente: Em boa hora submeteu o Governo à apreciação desta Assembleia a proposta de lei, ora em debate, sobre circulação de mercadorias, nacionais ou nacionalizadas, entoe o continente e as ilhas adjacentes.

Vem de longe o regime hoje em dia vigente, que a proposto de lei pretende modificar. Consiste ele na existência de entraves de diversa ordem a livre circulação das mercadorias entre os vários parcelas da metrópole portuguesa, de entre os quais se salientam, os encargos tributários que constituem receita das autarquias e de outras entidades públicas locais.

Com efeito, a descontinuidade do território das ilhas entre si e destas com o continente sugeriu um processo expedito de obtenção de receitas, qual seja a tributação dos produtos importados, mesmo quando nacionais, mesmo até quando insulares, originários de outro distrito. Cada distrito autónomo passou, assim, a constituir como que um território aduaneiro, com pauta de tributação camarária própria, decalcada sobre a Pauta de Importação, à qual acrescem variadas outras alcavalas, e com fiscalização alfandegária.

Às consequências desta situações são conhecidas ou facilmente imagináveis: agravamento do custo dos produtos importados, que vão desde máquinas até bens de consumo de primeira necessidade, designadamente produtos alimentares, sobre os quais já incide, aliás, o encargo de fretes marítimos que são, entre o continente e as ilhas, dos mais caros do Mundo; estrangulamento de actividades produtivas locais, ricas de possibilidades, devido aos encargos acrescidos dos bens intermediários importados necessários a sua laboração; entorpecimento da vida económica das ilhas pela burocracia aduaneira . . .

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - À sombra de tal situação, e, nalguns casos, ainda de outros proteccionismos, surgiram iniciativas, desde o início ou com o decorrer do tempo, economicamente inviáveis em mercado aberto, vendendo os seus produtos a preços incomportáveis para a debilidade de recursos da esmagadora maioria da população dos ilhas e remunerando as matérias-primas e a mão-de-obra locais em termos que melhor é nem sequer qualificar.

Vozes: - Muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não é de excluir que este regime e os seus elementos anexos, dos quais avulta a faculdade, atribuída aos governadores de distrito pelo n.° 9.° do artigo 99.º do Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes, de "regular a exportação de produtos agrícolas e de gado por meio de instruções dirigidas às alfândegas" - faculdade essa em muitos casos concretos exercida, em tempos idos, no distrito de Ponta Delgada, ao arrepio do interesse geral e com claro prejuízo para a expansão das actividades produtivas, em especial a pecuária -, não é de excluir, dizia, que as famosas barreiras alfandegárias das ilhas adjacentes tenham tido a sua razão de ser.

Hoje, o conceito de economia autárquica que lhes está subjacente encontro-se totalmente superado, mesmo a nível nacional. E a segura convicção de que o alargamento dos mercados, derivado da integração dos espaços económicos, é estímulo adequado para o incremento das produções efectivamente competitivas, saldando-se portanto numa desejável especialização de acordo com as virtualidades próprias de cada região, condena irremissivelmente à extinção essas barreiras aduaneiras. Caberia mesmo perguntar como conseguiram tais vestígios do tempo das caravelas sobreviver até ai era das viagens espaciais . .

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: A proclamação do princípio da livre circulação das mercadorias nacionais e nacionalizadas entre as várias ilhas adjacentes e entre estos e o continente, com abolição dos gravames fiscais, dos regimes particulares de certos produtos, que são considerados "estrangeiros" ao entrarem em zonas diferentes da de origem e das discricionárias intervenções administrativas que a limitam, corresponde às realidades do mundo de hoje, em que os distâncias se anulam e o isolamento desaparece, e vai ao encontro dos interesses e aspirações da população insular.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Como já tive ocasião de referir alguma vez nesta Casa, desde sempre me lembro de ouvir protestos e reclamações contra a manutenção das barreiras alfandegárias que para Madeirenses e Açorianos se traduzia numa situação ominosa, já dificilmente justificável. Anoto, de passagem, que a supressão dos encargos aduaneiros locais constituiu mesmo um dos pontos do programa de reformas que eu e os meus colegas de círculo propusemos ao eleitorado de Ponto Delgada durante a companha que precedeu o acto eleitoral que aqui nos trouxe.

Com a revogação dos numerosos diplomas e preceitos legais dispersos que estabelecem entraves de diversa natureza à livre circulação dos mercadorias entre o continente e as ilhas adjacentes, ficam criados os condicionalismos jurídicos paro o integração do espaço económico metropolitano.

Digo que ficam criados os condicionalismos jurídicos para a integração económica da metrópole, porque este complexo fenómeno não depende apenas das leis. O desarmamento aduaneiro puro e simples, entre zonas em diferentes estádios de desenvolvimento económico-social, muito à margem de integração, o que causa é a total absorção do mercado da zona menos evoluída pêlos produtos originários daquela que o é mais, onde se recorre a tecnologias avançadas e se produz a preços unitários mais baixos, e até por vezes o colapso das estruturas produtivas da região atrasada, que não conseguem competir no mercado interno, muito menos no de exportação.

Vozes: - Muito bem!