Esta concepção, como se indicou, ignora os objectivos da proposta, mas nem por isso se deixa de lhe fazer uma referência.

Há empresas que carecem, para se instalarem, de avultados capitais, pois logo se lhes impõe a aquisição de equipamentos de consideráveis montantes; mal vai às empresas deste tipo que para a aquisição desses dispendiosos e equipamentos, à falta de capital próprio, recorram maciçamente ao crédito, com o conhecido cortejo de encargos que este envolve.

Nas sociedades de seguros a importância do capital é particularmente acentuada durante os primeiros anos da sua existência, "período em que os encargos quase igualam os proventos e não lhes foi possível constituírem reservas suficientes que dêem larga margem às eventualidades de uma percentagem exagerada de sinistros" 24.

Também Lasheras Sans 25 afirma que:

... à medida que a massa dos segurados cresce e, por conseguinte, o volume das suas operações, o capital social vai perdendo importância frente às garantias dos segurados . . . com o crescimento das reservas técnicas (riscos em cursos e futuros) . . .

Estas opiniões quando referidas à dimensão predominante em grande número das nossas sociedades seguradoras justificam, a exigência de um capital relativamente elevado.

O volume exíguo das suas operações e o montante limitado das reservas que lhe correspondem fazem com que, de acordo com a opinião daqueles tratadistas, a exigência de um capital próprio subsista para muitas das sociedades seguradoras que exercem a sua actividade no País.

Além disso, "uma percentagem exagerada de sinistros" é uma eventualidade muito mais grave numa sociedade com uma pequena carteira do que numa sociedade com uma carteira volumosa e dividida.

E é-se reconduzido ao motivo fundamental que justifica a exigência do aumento do capital mínimo, a reconversão da indústria seguradora, de modo que os sociedades que exerçam essa actividade tenham dimensão que as afastem daquele risco. A reduzida dimensão das nossas sociedades seguradoras pode documentar-se pelos números relativos ao conjunto dos prémios dos vários ramos recebidos pelas 35 empresas seguradoras nacionais, pelas 4 sociedades mútuas e pelas 34 empresas estrangeiras que trabalham entre nós.

Só 3 empresas recebem prémios no montante anual superior a 200 000 contos (e nenhuma destas ultrapassa 360 000 contos); 2 recebem entre 100 000 contos e 200 000 contos, e 55 recebem menos de 50 000 contos (destas são 14 sociedades portuguesas e 3 mútuas)26.

Qualquer confronto com as grandes companhias internacionais não se justificaria 27.

Os números apontados são por si elucidativos. E, se se considerar a situação por ramos, só se confirmará a pequenez assinalada. No ramo "Vida" exercido por 26 sociedades só l cobrou prémios em 1968 entre 50 000 contos e 60 000 contos e 19 receberam menos de 20 000 contos de prémios.

No ramo "Acidentes de trabalho" exercido por 36 sociedades e mútuas, só l recebeu prémios de valor superior a 100 000 contos (mas não a 120 000 contos) e 27 receberam menos de 25 000 contos.

No ramo "Automóvel" exercido por 55 sociedades, só 5 receberam prémios superiores a 30 000 contos (mas nenhuma excedeu 80 000 contos) e 39 receberam menos de 20 000 contos.

A enumeração destes ramos considera-se suficiente, tanto mais que o panorama nos outros ramos é inteiramente análogo.

As restantes vinte e duas empresas receberam 35- por cento dos prémios. A média dos prémios em pouco excede 1,5 por cento do total. Haverá igualmente casos possíveis de imediata ligação, mas para os restantes a necessidade de concentração afigura-se óbvia. Convém desde já esclarecer dois pontos: as consequências no mercado financeiro da exigência de capital e o confronto do número de sociedades nacionais com o número de empresas estrangeiras nos vários países.

No que respeita ao primeiro, há que rejeitar in limine a ideia de que o cumprimento da nova lei se faria integralmente pela mobilização de dinheiro fresco no mercado. A admissão de tal hipótese, que envolveria a mobilização de várias centenas de milhares de contos, levaria esta Câmara, a rejeitar a aprovação na generalidade da lei, pois corresponderia a aceitar que seriam nulos os seus efeitos, que dela não derivava nenhuma fusão, quando o seu objectivo é precisamente esse.

O segundo ponto referido - confronto com a situação dos mercados seguradores estrangeiros - não pode ser feito em função do simples número de companhias sem atentar na respectiva dimensão. Por outro lado, também parece nada poder levar a concluir que em tais mercados a situação é ideal.

A França, que nacionalizou trinta e uma sociedades seguradoras que representavam em 1966 mais de 40 por cento do volume de negócios da actividade seguradora, concentrou essas trinta e uma sociedades em três grupos no início de 1967: a União dos Seguros de Paris (U. A. P.); os Seguros Gerais de França (A. G. F.), e o Grupo dos Seguros Nacionais (G. A. P.).

O caminho seguido foi assim o da concentração. Esta directiva no sentido da concentração que informa a proposta tem sido questionada num caso ou outro, por se considerar que os resultados nem sempre terão correspondido às esperanças depositadas nas fusões. Em primeiro lugar, parece cedo para se avaliar com seriedade dos efeitos da tendência apontada, e tanto assim que

24 Cf. Fernando de Brederode, na Colecção de Legislação Portuguesa de Seguros, p. 38. Contudo. Fritz Herrmannadorfer em Seguros Privados, tradução espanhola, p. 47, chega ao exagero, injustificável, de afirmar que nas sociedades de seguros o capital é desnecessário, "já que as operações são suportadas com a arrecadação de prémios destinados a esse fim".

25 Relações, loc. cit.

27 Apenas para se ter uma ideia da dimensão das grandes companhias internacionais, os números em francos franceses para as três maiores companhias inglesas em 1966 (Lloyds, Royal e Prudential) são de 6000 milhões, 3900 milhões e 3000 milhões. Para o Mercado Comum as três maiores companhias apresentam os seguintes números: 5200 milhões de francos franceses (a Allianz Munchener, alemã), 3060 milhões (a U. A. P., francesa) e 1865 milhões (a A. G. F., francesa).