caso, estaríamos perante taxas alfandegárias que, como os direitos ou outros emolumentos, foram abolidas pelo n.° 2 da base I da proposta de lei; este preceito põe os Deputados inteiramente à vontade relativamente ao cerceamento de todas e quaisquer receitas, de que não tomaram a iniciativa e com que apenas, jubilosamente, concordaram. Não foi a Assembleia que tomou a iniciativa de cercear receitas do Estado, através da liberalização, mas sim o próprio Governo que prescindiu directamente da percepção de todas as receitas ligadas à circulação de mercadorias entre ilhas do mesmo arquipélago ou entre o arquipélago e o continente. A não os considerar como abrangidos pelo n.° 2 da base I, teríamos de concluir que as possíveis receitas que as alfândegas cobrassem da emissão de guias se traduziam em taxas de outra natureza, correspondentes a prestação de uni serviço - o de desalfandegamento - que agora passará a não ser prestado nos termos em que o tem sido. E, sem serviço, não há taxa; mas não pode dizer-se que nessas condições continua a verificar-se o condicionalismo do artigo 97.° da Constituição. Em conclusão: por tudo isto, penso que n proposta de emenda subscrita pelo Sr. Deputado Mota Amoral e outros Srs. Deputados não traduz, relativamente à proposta do Governo, qualquer alteração de receitas. Suponho, pois, que a sua aprovação em nada infringe o artigo 97.º da Constituição.

O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Tomo a palavra para aderir à exposição e aos esclarecimentos que o Sr. Prof. Almeida Garrett acabou de prestar e que me pareciam pertinentes. Tanto assim que também eu me propunha prestá-los em relação às dúvidas que V. Ex.ª tão judiciosamente formulou quanto à possibilidade de colisão constitucional.

Afigura-se-me que o n.° 2 da base II, tal como está redigido, excluindo as taxas que actualmente oneram as mercadorias, põe perfeitamente a claro que não há colisão constitucional. Simplesmente, e é essa a dúvida que eu punha e que vem ao encontro, pelos vistos, da dúvida que V. Ex.ª acaba de exprimir, as guias de circulação referidas no n.° 3 da base I do texto da proposta de lei não podem, a meu ver, deixar de ser guias estatísticas, isto é, guias que garantam a origem e, portanto, a qualidade de nacional ou nacionalizada das mercadorias em trânsito.

É perfeitamente legítimo que o serviço alfandegário e os serviços fiscais se queiram garantir quanto à possibilidade de circularem entre as ilhas do arquipélago mercadorias, que não sejam nacionais ou nacionalizadas. E daí a necessidade, que compreendo, de uma guia de circulação, mera guia, e não recibo de taxa - são duas coisas diferentes -, que aproveite ao transitário da mercadoria, servindo-lhe de prova cabal de que a transitou de uma ilha para a outra.

Quanto a essa guia estatística ou guia de trânsito, compreendo perfeitamente que ela possa existir, mas não com aspecto fiscal nem com cobrança de taxas, pois se se fala aqui em supressão das taxas que actualmente oneram as mercadorias, e depois, a seguir, já no texto governamental, se referem "guias de circulação", não se poderá entender, sem entrar em colisão com a primeira disposição fundamental de livre circulação, que essas guias sejam passíveis de taxas. Considero, portanto, e é nesse aspecto que poderia dar este. achega, que a redacção da proposta de emenda não só não colide com a disposição constitucional que nos veda cerceamento de receitas do Estado, como admito que possa haver guias de circulação para cobrir as mercadorias que circulam entre as ilhas, mês meramente de contrôle estatístico e de origem.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença? São certificados de origem.

O Sr. Alberto de Meireles: - Exactamente. Seria uma forma tal como a do despacho pelas capitanias, conhecimento de carga de cabotagem, referente à mercadoria que se embarca. Mas isso é muito diferente do despacho alfandegário. Afinal seria de aplicar apenas o que está em vigor no continente, quanto à cabotagem.

Este o esclarecimento que me parecia impor-se.

O Sr. Mota Amaral: - Sr. Presidente: Queria ainda fazer uma observação acerca da questão incidental levantada por V. Ex.ª a propósito da constitucionalidade da proposta de emenda que subscrevi com alguns Srs. Deputados e, do mesmo passo, responderei a algumas das observações feitas pelo Sr. Deputado Alberto de Meireles.

A lei aduaneira presentemente em vigor prevê várias espécies de intervenção das alfândegas, quais sejam os despachos de exportação e de importação; e, se se trata de mercadorias que circulam entre pontos do território nacional, o despacho de cabotagem por entrada e por saída. A mesma lei alfandegária prevê ainda a passagem de guias de circulação. Portanto, não se trata de criar, através da nossa proposta de alteração, como tão-pouco da própria proposta de lei, uma espécie nova de intervenção alfandegária.

Existem já hoje em dia guias de circulação e por elas são cobrados determinados emolumentos. O que está agora em causa é dispensar a passagem dessas guias no trânsito das mercadorias entre as várias ilhas do mesmo arquipélago das ilhas adjacentes.

Se V. Ex.ª considerasse resolvido este incidente sobre a constitucionalidade da proposta de emenda, teria eu, entrando na discussão da substância dela, algumas observações a fazer ao Sr. Deputado Alberto de Meireles, que parece estar em desacordo com a proposta de emenda subscrita por mim e outros Srs. Deputados.

O Sr. Alberto de Meireles: - Não há discordância nenhuma. O meu esclarecimento foi exactamente no sentido de explicar que a proposta de emenda, quando permitia a circulação sem guia emitida pelas alfândegas, não evitaria o chamado "despacho", que os capitães dos portos emitem, salvo erro, para o trânsito de embarcações, mesmo de cabotagem.

Como V. Ex.ª sabe muito bem, um navio de carga não pode despachar sem licença da capitania. Simplesmente, quando a carga está condicionada a taxas aduaneiras, a capitania não despacha o navio sem que estejam pagos os impostos, as taxas alfandegárias.

A redacção que VV. Ex.ªs deram permite perfeitamente conciliar as duas coisas, entre elas o desejo de livre circulação entre as ilhas (eu já por lá andei e vi bem as difi-