Unida a tantas vozes ilustres que através dos tempos têm exaltado as maravilhas da Arrábida, ergue-se agora desta tribuna para a sua eterna defesa a mais descolorida voz desta Assembleia.

Amada por todos os que algum dia a conheceram, ligada à invocação da Virgem Maria na veneração dos crentes e dos humildes, enaltecida pêlos sábios e cantada pêlos poetas, a Arrábida tem- de ser totalmente preservada na sua integridade, tal .como sempre a conhecemos e como a conheceram os nossos antepassados, tal como nos veio do fundo das idades, sentinela da natureza e último reduto da floresta primitiva - assim deve ser legada, imutável e eterna como património cultural, as gerações que nos sucederem! ...

Seguindo sempre a orla costeira temos ainda, antes de Setúbal, a praia da Figueirinha a Comenda, com a sua praia e ribeira e as suas formosas matas, e a serra de S. Filipe, onde se ergue o castelo do mesmo nome.

Definidos assim os lados, o interior do parque seria constituído, além de uma pequena faixa a norte, paralela à costa atlântica, por todo o vasto hinterland compreendido entre as duas costas, desde a Charneca da Caparica aos Brejos de Azeitão, e dai contornando pelo exterior as serras do Louro e de Palmeia e englobando assim o 3.° castelo da região, flectiria em direcção a Setúbal, contornando o seu aglomerado citadino pêlos lados norte e oeste e iria fechar o perímetro na serra de S. Filipe, já atrás citada.

Esta grande área, riquíssima pelas suas matas, funcionaria como ponto de apoio das actividades turísticas e recreativas a criar, com vasto campo para se desenvolverem, sem, todavia, colidir com as princípios e normas da protecção a natureza.

Ao dar a minha aprovação na generalidade à proposta de lei sobre a protecção da natureza e seus recursos, louvo o Governo pela iniciativa, e peço, desde já, em nome do meu distrito e com base ao estudo feito para o Plano Director da Região de Lisboa, a criação do parque nacional da península de Setúbal, com a seguinte discriminação:

Reserva integral - As matas da Arrábida, nomeadamente a do Solitário e a Pedra da Anixa.

Retoma natural - Todo o perímetro da serra da Arrábida, as matas da Caparica e a lagoa de Albufeira.

Reserva turística - Toda a restante zona prevista para o parque.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - E, considerando as depredações e destruições que dia a dia vão desvalorizando e inutilizando a área prevista para o parque, e confirmando a necessidade de rapidamente se proteger o que ainda existe intacto ou recuperarei, peço a maior urgência no respectivo decreto.

Parafraseando uma conhecida frase histórica, direi, a terminar: "Depressa, porque mio temos mais vagar"

Vozes: - Muito bem!

O oradora foi cumprimentada.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: Acaba a Sr.ª Deputada Luzia Pereira Beijei de fazer reviver nesta Câmara um velho, ambicioso e belo projecto, metido em não sei que gaveta ministerial e que se propunha conservar como. parque nacional de rara beleza e notável interesse científico pelas espécies raras que encerra, toda a orla marítima. da Caparica a Setúbal, procurando, porém, com cuidada distribuição, o aproveitamento das zonas de praia para núcleos urbanos, vincadamente turísticos e adaptados ao ambiente natural.

A Quinta da Comenda, em Setúbal, é das coisas belas que por aqueles sítios há. Estende-se por um vale, rasgado pela ribeira da Ajuda, e pelas ondulações de terreno que acompanham as praias da parte poente da cidade, levando por matas e carreiros as faldas da serra da Arrábida. Nas mãos de um titular estrangeiro, tem sido há longos anos defendida das arremetidas urbanísticas, conservando, assim, a par da zona cultivada, largos trechos de natureza livre que são, e têm "ido há longos anos, prazer de quantos procuram na convivência do campo ou na proximidade do mar o descanso do corpo e do espírito. Há dias, Setúbal foi surpreendida com a notícia de que conhecido comprador de terrenos para urbanizar estava a fazer sérias diligências pura adquirir a Quinta da Comenda. A concretizar-se o negócio, iremos assistir a mais um retalhar de uma grande propriedade, que é no seu conjunto uma das mais belas matas naturais, transformando-a, assim, em "quintinhas" com os problemas que casos destes levantam às câmaras municipais e a destruição daquilo que é hoje também salutar logradoiro público.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Decerto que não se poderá proibir que o proprietário da Quinta da Comenda a troque por dinheiro, mus poder-se-á impedir que ela seja retalhada e transformada cie prédio rústico em zona urbana? Suponho que todas as nossas perguntas têm sempre a propósito uma lei que as satisfaz. Não é preciso recuar muito nos volumes do Diário do Governo, 1.ª série, para encontrar, datado de 29 de Novembro de 1960, o Decreto-Lei n.º 46 673, cuja introdução passo a ler, para nos situarmos dentro daquilo que pretendo dizer a seguir:

Em várias regiões do País em que se está processando ou simplesmente se presume que venha a processar-se em futuro próximo intenso desenvolvimento urbanístico, tem sido verificada, com frequência crescente, actividade especulativa de indivíduos ou de empresas para o efeito constituídas, visando o aproveitamento indiscriminado de terrenos para a .construção urbana. Assim, têm vindo a formar-se, por Vezes através de operações muito vultosas, aglomerados habitacionais criados sem sujeição a qualquer disciplina, os quais prejudicam ou contrariam os planos oficiais para o aproveitamento dessas regiões.

Por carência de meios legais adequados, as câmaras municipais e a Direcção-Geral dos Serviços- de Urbanização não têm podido exercer em tais casos acção eficaz visando a disciplina e à fiscalização dessas actividades, de modo a obstar a criação de núcleos habitacionais que contrariam o racional desenvolvimento urbano do território e a evitar que se efectuem operações de loteamento sem que previamente estejam asseguradas as indispensáveis infra-estruturas urbanísticas.

Estas actividades especulativas, além de lesarem, por vezes, os compradores de boa fé, criam para as câmaras municipais sérios problemas de ordem financeira, pois mais cedo ou mais tarde serão chamadas a realizar importantes obras de urbanização, impostas pela necessidade de se dotaram os referidos núcleos habitacionais com os indispensáveis acessos, redes de