Como afirmou o Dr. Neto Miranda, adjectivar ou qualificar estas de regiões autónomas é tornar realidade conteúdos jurídicos da Constituição.

Não há quebra de unidade, nem se processa uma política que atinja os órgãos soberanos dia República.

Com efeito, por que determo-nos no artigo 135.º da proposta, que define em que Consiste a autonomia das províncias ultramarinas, aliás condicionando os respectivos direitos, de moldo ta preservar desde logo a soberania do Estado, e não atentar no artigo 136.º, que, imediatamente a seguir, estabelece à forma de garantir o efectivo exercício dessa soberania, sem fractura da sua integridade, dia unidade da Noção, da Solidariedade entre todas as parceleis do território português, como expressamente se consigna no corpo do artigo? Insisto: a autonomia administrativa é indispensável se quisermos prosseguir ma obra de progresso e de promoção social em que nos empenhamos; se quisermos viver na paz que ambicionamos; no ideal da unidade que conquistámos por acção própria e havemos de continuar para legarmos aos vindouros um Portugal mais forte, mais progressivo e mais firme na sua determinação de se manter fiel aos princípios de solidariedade humana - suporte do direito de continuarmos indivisíveis na dispersão dos territórios que constituem a Nação.

Sr. Presidente: São estas as considerações gerais que se me oferece apresentar ao plenário da Câmara.

Das afirmações feitas conclui-se que aprovo na generalidade a proposta do Governo sobre a revisão constitucional.

Sem embargo, reservo-me para ma especialidade aceitar ou sugerir uma ou outra alteração de forma, desde que não toquem no fundo da proposta, orientada por um pensamento unitário a que não podemos introduzir mais modificações, sob pena de transformarmos um instrumento de tanta transcendência ... num emaranhado sem nexo.

A homogeneidade da proposta tem de ser respeitada, embora com alguns ajustamentos já aceites pelo Governo e que constam do proficiente relatório da comissão eventual.

Deve-se tal proficiência, clareza e simplicidade, que não era fácil de atingir, ao ilustre Deputado Prof. Doutor Gonçalves Ide Proença.

Sobre este notável e objectivo documento, direi com os praxistas, em homenagem ao autor: «Arrazoe quem quiser, articule quem souber.»

Pois, Sr. Presidente, o Prof. Gonçalves de Proença soube articular e tenho pena que o meu arrazoado não fique por aqui.

A verdade, porém, é que seria injustiça esquecer a extraordinária dignidade, o elevado aprumo, a alta craveira intelectual, evidenciados na comissão eventual pelos autores dos projectos n.ºs 6/X e 7/X ali presentes - Deputados Sá Carneiro, Pinto Balsemão, Magalhães Mota e Alberto Meireles.

Sem demérito para quem quer, manifesto-lhes o meu respeitoso apreço e agradeço-lhes, por mim próprio, o grande prazer intelectual que me proporcionaram com irmã dialéctica de alto nível, digna da maior admiração.

Sr. Presidente: Assim vale a pena discutir. Assim vale a pena dialogar.

Tenho dito.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Homem Ferreira: - Sr. Presidente: Eu devia começar por dizer que subo a esta tribuna vergado ao peso das responsabilidades e com a perfeita consciência

da importância dos assuntos em debate e das profundas implicações que eles podem assumir na jornada do futuro.

Mas não seria sincero se reeditasse a chapa destes lugares-comuns.

Creio que nem mesmo a revisão constitucional obriga a adoptar frases solenes e embalsamadas. Por isso, as palavras que vou proferir foram traçadas com riscos breves e simples. Tenho a noção exacta da sua inoperância.

Em primeiro lugar, não estou nada convencido de que a História esteja à espera da minha intervenção.

Depois, o meu cepticismo, perante a esgrima de teorias, impede-me de inserir no debate uma fatia de verniz jurídico, recolhida em qualquer compêndio de direito constitucional.

Continuo a recusar-me a confundir esta Assembleia com um mero instituto de conferências, em que tudo é denso e empolado - a palavra, a erudição e o tédio.

Por outro lado, já não estou em idade de querer endireitar o mundo, e conheço bem o círculo de giz das minhas limitações!.

Acresce que fiz parte da comissão eventual, mas, devido a uma grave crise de saúde, não me foi possível, nas últimas semanas, acompanhar a parte final dos trabalhos.

Todos estes factores, designadamente a minha precária condição física, autorizavam que me remetesse a um rigoroso silêncio.

A vida, porém, nem sempre permite obedecer à comodidade, por mais justificada que seja. E, continuamente, impõe deveres que não podem ser iludidos.

Na política, quem age com recta intenção e subordinado às exigências do carácter, é obrigado, muitas vezes, a transpor as fronteiras do sacrifício.

Creio ser esta a moldura das circunstâncias presentes.

Ninguém ignora que, em torno de certos pontos da proposta de revisão constitucional, se gerou uma doentia atmosfera de suspeição.

Não me refiro aos votos de vencidos constantes do parecer da Câmara Corporativa, um deles, aliás, subscrito por uma das mais luminosas inteligências que me tem sido dado conhecer e pessoa da minha particular estima.

Sendo, por formação profissional, partidário da livre exposição de ideias, sempre considerei o contraste de opiniões, a controvérsia de argumentos c pontos de vista, como um contributo salutar e necessário para o esclarecimento dos problemas e soluções.

Colaborar não é dizer ámen, nem concordar por sistema.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nestes termos, embora discorde delas, aceito e respeito as posições definidas nos votos de vencidos.

Mas já não aceito a campanha insidiosa, promovida na sombra e sorrateiramente, ao longo de todo o País, pelos que, bem instalados na fortuna e nos privilégios, se dedicaram à tarefa de criar fantasmas e alimentam o escuro propósito de atingir pessoas, magoar e pôr em crise o Governo e a sua chefia.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não vale a pena cobrir os factos com o veludo das conveniências, adoptar subterfúgios e fechar os olhos aos acontecimentos.