Para tanto, a lei fundamental do País, ao ser revista, não poderia nem deveria permitir que o Executivo deixasse, de ser forte; que a Assembleia Nacional se transformasse no pivot da vida pública portuguesa; que a preocupação de não cerceamento das liberdades cívicas viesse a ser causa e estímulo do desbobinar das paixões e querelas políticas de antanho.

Pela parte que me toca, sem renegar a cepa liberal, à sombra da qual nasci e a que desejo manter-me fiel até aos meus últimos dias, entendo que o Governo demonstrou, na sua proposta, o salutar propósito de dar decisivo e irreversível passo no sentido da restauração das liberdades, a que o Chefe do Governo se referiu ao tomar posse, como objectivo nacional que cumpre ter sempre em linha de conta.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Alguns teriam desejado que se fosse mais longe; mas eu creio firmemente que o Governo foi, neste momento, exactamente até onde deveria e poderia ir. Por isso, terá o meu voto e, estou certo, o da maioria esmagadora da Assembleia Nacional.

Vozes: - Muito bem!

específico do momento. Seria erro grave, porventura irreparável, deixarmo-nos embalar ao sabor de especulações meramente teóricas, ainda que brilhantemente apresentadas, que nos poderiam levar a legislar para hoje o que nem sequer temos a certeza de poder vir a ser aceite amanhã.

O velho aforismo que nos ensina ser «a política a arte do possível» tem de estar sempre presente no espírito e na actuação dos Deputados, cujo permanente enquadramento na realidade se afirma como dever irrenunciável.

Nem me parece que constituam motivo de perturbação, paira a Assembleia ou para o País, intervenções no estilo daquelas que o Dr. Sá Carneiro e outros ilustres colegas aqui apresentaram.

Sem me deter no pormenor da análise e mesmo sem negar validade a grande parte das premissas em que fundamentou o seu trabalho, eu gostaria ainda de dizer e recordar ao Dr. Sá Carneiro que, sem o seu talento e a sua temível lógica jurídica (alicerçada em experiência profissional que a minha brevíssima, mas saudosa, passagem pelo foro não me pôde proporcionar), eu não teria a menor dificuldade em fazer uma análise paralela de qualquer sociedade politicamente constituída e chegar a conclusões ainda menos favoráveis do que aquelas a que o Dr. Sá Carneiro chegou relativamente ao statu quo português.

Desde a celebrada democracia norte-americana - a que alguns dos principais responsáveis pela própria gestão política se não cansam de formular críticas, em relação às quais a intervenção do Dr. Sá Carneiro seria exemplo «cor-de-rosa» ... - até cairmos nas também soit disant democracias populares, colonizadas pela Rússia, passando pela livre Inglaterra, pela progressiva Suécia, pela Argélia socialista e pela China de Mão Tsé-Tung, nenhuma forma de governo nem lei constitucional em vigor seriam poupadas ao bisturi implacável que as desejasse reduzir às cinzas da incongruência e das contradições.

Nós vivemos em Portugal; em Portugal queremos continuar a viver. P recisamente porque «não há Portugal sem portugueses» - como aqui disse o Dr. Sá Carneiro - é que nós temos de actuar e legislar com os pés na terra, de harmonia com a preparação cívica dos cidadãos que constituem e identificam a comunidade.

A democracia não é susceptível de se instaurar por simples decreto. Mas por simples decreto pode vir a perder-se o caminho que acaso já se tenha percorrido.

Vozes: - Muito bem!

té que o actual Presidente do Conselho foi relator em 1951 do parecer da Câmara Corporativa que preconizava a continuidade de eleição do Presidente da República através do sufrágio universal. Daí o apontar-se como ortodoxa a tese que defende o regresso àquele sistema.

O argumento é aparentemente válido, mas carece de conteúdo.

Se o Governo, agora presidido pelo relator do referido parecer de 1951, ao apresentar a proposta de revisão constitucional manteve a actual forma de eleição do Chefe do Estado, ninguém poderá duvidar de que:

Ou o relator de então, Chefe do Governo de agora, alterou o seu ponto de vista, entendendo ser perfeitamente aceitável o recurso a um colégio eleitoral mais ou menos orgânico;

Ou o Chefe do Governo de agora, relator de então, mantendo o ponto de vista expresso em 51, entende que será inoportuna e politicamente inconveniente qualquer iniciativa que tente alterar o sistema.