um candidato nacional, os votos de Angola seriam normais. V. Ex.ª explica-me, tira-me as conclusões das consequências?

O Sr. Barreto de Lara: - Que consequência? Que problema poderia isso originar? Não é a unidade da Nação o que a todos nós une? E é curioso que em certo sector monárquico se tem defendido exactamente a eventualidade de concentrar, a partir de Angola, o ponto nevrálgico da unidade nacional. Solução que não espanta ninguém e que afecta de qualquer modo, antes ratifica a consumação da unidade da Nação, que é afinal tão defendida por todos nós nesta Casa e o ponto fundamental do nosso combate.

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado Barreto de Lara, mas creio que estamos a mudar de assunto. Eu não pus em causa o patriotismo nem as intenções de o general Norton de Matos se apresentar como candidato pelos votos provavelmente de Angola e perder no conjunto nacional.

O Sr. Magalhães Mota: - Pôs em causa uma coisa muito mais grave, Sr. Deputado.

O Orador: - Não quer dizer que a intenção de o general Norton de Matos, se fosse vivo, pudesse ser essa, porque sempre afirmou o contrário. Não é isso que está em causa.

O Sr. Magalhães Mota: - Pôs em causa uma coisa muito mais grave. Pôs em causa o patriotismo e o portuguesismo das gentes das províncias do ultramar.

O Orador: - Não! Não pus em causa patriotismo nenhum. Pus em causa apenas, a preferência por uma pessoa em relação a outra.

E disto que se trata numa eleição. Não pus em causa o patriotismo de Norton de Matos e até o citei deliberadamente por ser um caso em que esse problema se não punha, mas que era um caso perfeitamente lógico e possível. Não pus em causa o patriotismo dos portugueses de Angola, mas as consequências políticas de um acto.

O Sr. Magalhães Mota: - Achei muito bem a citação. O que não achei muito bem, e daí a minha discordância, foi pôr-se o problema de uma secessão visto através de uma eleição do Chefe do Estado.

O Orador: - Pois, V. Ex.ª não vê, mas eu tenho a impressão de que é óbvio. Todo o problema das regiões se tem posto mesmo nos países à base desse tipo de soluções. Se V. Ex.ª for apreciar, por exemplo, mesmo no seio da nação italiana actual, os problemas eleitorais surgidos com as regiões, encontrará esta mesma razão, da derivação política a partir de eleições.

Foi à sombra de homens eleitos que o problema se pôs em relação à secessão regional ou à dificuldade regional em relação ao poder central. É o caso típico do problema italiano de há seis meses. De resto, seria possível na excursão histórica demonstrar-lho e encontrar factos que vieram exactamente neste sentido de prova.

O Sr. Sá Carneiro: - Mas V. Ex.ª defende as regiões.

O Orador: - Pois defendo as regiões. Não está em causa. Pois com certeza, que defendo ais regiões. Desde que estou em estado de guerra, desde que tenho o perigo de uma eleição regionalizada num tipo de eleição para o Chefe do Estado poder conduzir a um princípio de divisão ou a um fermento da própria secessão, eu, evidentemente, sacrifício os princípios às realidades sociais. Este é o meu dever político.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A teoria é uma coisa e a vida é outra. As teorias são necessárias à vida, mas a vida não são teorias.

O Sr. Sá Carneiro: - Está perfeitamente certo e ninguém contesta a legitimidade. Só me parece que V. Ex.ª nessa altura tira os votos às gentes das regiões que defende.

O Orador: - Não tiro os votos. Por que é que faço os votos? Pelo contrário, na continuação das minhas palavras vou até dizer que uma das razões porque neste momento entendo que mão se deve mexer mo que está é pela necessidade de poder perequar melhor a participação das regiões na designação do Chefe do Estado.

É que, evidentemente, miais condições actuais, o peso dias votos de Moçambique e de Angola seria inferior àquilo que entendo que efectivamente deveria ser.

O Sr. Sá Carneiro: - Aguardarei então o desenvolvimento da ideia.

O Sr. Magalhães Mota: - Eu também.

O Orador: - Acresce, naturalmente, que hoje reforço as razões com as circunstâncias de ser necessário perequar a participação regional e de não ser aconselhável alterar, por simples razões de lógica, quanto recentemente se instituiu como inovação e em nada (prejudicou a solução da maior crise do regime entretanto ocorrida. É a sabedoria política que assim postula.

Estou pessoalmente convicto de que o senso comum da Câmara e o realismo prático da generalidade dos Deputados convirá comigo em que, não sendo conveniente nem prudente retornar, nas condições actuais, ao regime do primeiro quartel de vigência da constituição actual, se imporá neste momento alargar o colégio eleitoral e, talvez, expurgá-lo dos elementos que dele fariam parte por força de nomeações ou designações do Poder Executivo.

Por fim, não devo esquivar-me a apreciar a influência que a querela entre a fidelidade e a inovação, ou o primado da evolução sobre a continuidade ou desta sobre aquela tem s obre os debates, as atitudes, as incompreenssões, as angústias ou os temores.

É esta uma questão que sempre se suscita quando um homem excepcional molda um regime e é sucedido, por imperativo natural ou político, por outro sem mudança de regime.

Pouco tempo depois de a doença ter, abrupta e inesperadamente, determinado o afastamento do Doutor Salazar da chefia do Governo e do regime, outro tanto ocorreu em França, embora ali por motivos políticos.

Aconteceu entretanto que ambos deixaram já, e com pequeno intervalo de tempo também, esta vida.

Pois bem, esta mesma querela, mais aguda talvez ali, desenrolou-se em França nos mesmos termos daqui, com algumas vítimas ou sacrifícios de pessoas. Foi talvez mais breve porque mais intensa e quiçá esteja já ultrapassada.

Também nós temos de superá-la rapidamente, como o exigem o interesse do regime e o primado da unidade nacional que o estado de guerra mais imperiosamente impõe.