pulações, estatutos especiais que estabeleçam, sob a influência do direito público e privado português, regimes jurídicos de contemporização com os seus usos e costumes, se não forem incompatíveis com a moral, os ditames de humanidade ou o livre exercício da soberania portuguesa.

Este preceito, designadamente, contemplava o chamado estatuto dos indígenas da Guiné, Angola e Moçambique, era o estatuto do indigenato.

Este preceito, na actual revisão, desaparece. O seu conteúdo, como disse o Sr. Deputado Themudo Barata, implica valores respeitáveis.

Simplesmente, volto à minha: o artigo 8.º da Constituição, no seu § 1.º, consigna precisamente, bem interpretada, a mesma doutrina, quando diz que os direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos especificados não excluem outros, constantes da Constituição ou das leis.

O Sr. Themudo Barata: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Themudo Barata: - Eu percebo perfeitamente a argumentação de V. Ex.ª, e desejo agradecer-lhe uma vez mais a compreensão que manifestou pelas nossas intenções, mas parece-me que há um pequeno lapso no raciocínio tão brilhante de V. Ex.ª e que é o seguinte: sem dúvida nenhuma que a Constituição não pode consagrar todas as normas fundamentais da vida de um país, e V. Ex.ª sabe muito melhor do que eu que há até constituições não escritas.

Pergunto se este princípio não tem muito maior dignidade constitucional que outros princípios que figuram na Constituição. Em segundo lugar não se trata apenas de reconhecer direitos individuais, trata-se de reconhecer diferentes estilos de vida; pergunto se será justo, por exemplo, para uma população como a de Macau, que vive tão perto do mundo oriental, que é a China, com a bandeira portuguesa., se nós aí consagrarmos o nosso Código Civil, quantos direitos de família são completamente diferentes...

Pergunto se não será uma prova de consideração para com as populações ultramarinas dar-lhes uma palavra na Constituição nesse sentido. E por isso que volto a repetir o sentido da palavra «respeito».

O Orador: - Agradeço muito a companhia de V. Ex.ª aqui, porque, já agora, vale a pena continuarmos a esclarecer.

O artigo 136.º tem o seguinte texto, de acordo com a proposta da comissão eventual:

O exercício da autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação, a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado.

Para esse efeito, compete aos órgãos da soberania da República:

E depois vêm as alíneas que se seguem.

Eu chamei a isto na comissão eventual, no que tive a honra de ser citado pelo Sr. Deputado Linhares de Andrade, no seu discurso durante o debate na generalidade, chamei a este preceito, de algum modo, a alienação de travões para eventuais forças centrífugas da ordem jurídica que exclusivamente pertença à soberania do Estado.

Portanto, este artigo 136.º, numa boa hermenêutica, numa hermenêutica que se impõe à nossa inteligência, pretende, Sr. Presidente, reservar para os órgãos da soberania da República, isto é, para os órgãos centrais do Estado Português, o velar por todos os princípios e garantias aí consignados, incluindo o respeito dos direitos individuais nos termos da Constituição.

O aditamento parece-me de alguma maneira deslocado, atendendo até à própria intenção do artigo 136.º Portanto, terminando e prestando a minha homenagem a V. Ex.ª, eu volto a dizer: o artigo 136.º, alínea i), não era o lugar próprio para este aditamento.

Tenho dito.

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Seguindo o raciocínio do Sr. Deputado Júlio Evangelista, toda a alínea i) estiaria deslocada, porquanto, se ali se diz «zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição». É, pois, uma (redundância estar aqui alínea i). Parece-me uma incongruência, realmente, discutir este aditamento, que alguns Srs. Deputados, entre os quais eu, tiveram a honra de subscrever uma proposta de alteração à alínea i), e

manter a sua primeira parte, que diz: «zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição», e excluir a segunda parte do aditamento.

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - É que a intenção da alínea i), desculpe, não está deslocada, é indispensável no contexto do artigo 136.º, e indispensável tal como está. E porquê? O que a alínea i) pretende significar é que compete aos órgãos da soberania do Estado zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição, quando os órgãos legislativos ou executivos locais porventura desrespeitem esses princípios constitucionais.

É isto que se pretende exactamente da alínea i). Portanto, ela é indispensável nesta mecânica jurídica. Compreende V. Ex.ª? Era só este aparte.

O Orador: - O raciocínio de V. Ex.ª, quando esses órgãos locais desrespeitem os valores culturais das populações, dos seus usos e costumes, não compatíveis com a moral e o direito português, não está a mais; está até bastante bem. E eu até cato um exemplo, extraído de um jornal recentemente chegado à minha mão. É que houve uma altura, Sr. Deputado Júlio Evangelista, em que houve a preocupação de modificar nomes de várias cidades de Angola. Por exemplo, este nome, cheio de poesia e cheio de música que se designava «Capenda Cavilongo» passou a chamar-se «Oliveira-a-Nova», um nome que não diz nada às gentes que habitam aquela região. Eu acho isto muito simpático, mas não diz nada. Portanto, este respeito pelas culturas, este respeito pela África autêntica, de uma cultura africana, de uma África inóspita, selvagem possivelmente, mas com uma cultura sui generis, neste país que é pluricontinental, não parece desasado, nem me parece a mais. Que seja constitucionalmente consagr ado o respeito por estas culturas que existem nesta África autêntica que nós devemos manter, e chamar isto à colação do nosso folclore e da nossa linguagem...

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença, ainda, para outro aparte?

O Orador: - Faz favor.