trina, não atribuiu discricionàriamente aos indivíduos, limitando-se a reconhecê-las e a tutelá-las de forma adequada.

Se as liberdades individuais estão convenientemente asseguradas, reprimindo-se os evenutais abusos por meio de sanções cominadas na lei e aplicadas pelos tribunais comuns, afigura-se-me que é dispensável uma legislação especial sobre a liberdade religiosa. Onde, pelo contrário, a actuação dos cidadãos tende a ser encarada, por princípio, com suspeita e se multiplicam os controles prévios e as intervenções administrativas - então já se exigirá um diploma próprio que derrogue as regras limitativas gerais, em nome do respeito merecido pela peculiar posição da liberdade religiosa, que é a primeira entre todas as liberdades.

Sobradamente se mostrou, durante o debate na generalidade da recente revisão constitucional, que é deste último tipo a situação que presentemente se verifica no nosso país. Por isso se justifica a elaboração de um estatuto especial p ara o exercício da liberdade religiosa - que bem gostaria de poder encarar como o prelúdio da efectiva e próxima restauração das liberdades cívicas dos portugueses.

É nesta ordem de considerações que se insere, Sr. Presidente, a proposta de lei ora em discussão. O seu objectivo principal não é certamente proclamar, com foros de novidade, o princípio da liberdade religiosa. Este princípio a pouco e pouco foi entrando nos hábitos do povo e no nosso sistema jurídico, a partir da revolução liberal e como reacção ao anterior regime de intolerância, tantas

vezes movido por razões políticas, de modo que constitui já hoje indesmentível conquista do património cultural do País. Mas existem problemas a resolver neste campo - e não há-de ser o temor de ferir susceptibilidades ou de reacender velhas querelas que impedirá a Assembleia Nacional de sobre eles se debruçar e decidir, com prudente ponderação dos interesses em causa.

De entre tais problemas avulta o do reconhecimento e personalização das confissões religiosas que não se encontram em comunhão com a Igreja de Roma, sejam elas cristãs ou não, bem como das associações que no seio das mesmas se constituam. Até aqui estas confissões religiosas têm vivido numa situação de puro facto, sem qualquer vantagem para a colectividade, e com evidentes prejuízos para elas próprias e para os respectivos fiéis. Mesmo que fosse só por isso, já se justificaria a proposta de lei em apreciação.

Mas contém também esta proposta de lei a compilação das normas fundamentais relativas à liberdade religiosa, presentemente dispersas por vários diplomas. Estas normas surgem agora reformuladas, imprimindo-se-lhes os matizes especiais requeridos por um mais completo respeito pelo livre comportamento do homem, no aspecto social e externo das suas relações com Deus. Este é outro motivo sério a justificar o presente diploma.

É exactamente aqui, porém, que se descobre, Sr. Presidente, a principal fraqueza da proposta de lei que discutimos. Criar um regime de favor para as liberdades de expressão de pensamento, de reunião e de associação em matéria religiosa não é tarefa fácil. Ou se admitem essas liberdades em termos gerais - destruindo-se o problema na sua raiz; ou então, precisamente porque a religião fornece sempre uma concepção global do mundo e da vida, não se conseguirá superar a ambiguidade que resulta de por uma forma ou por outra, querer o Estado conservar os controles de que protesta abrir mão.

Vou por isso mais longe do que há pouco. Não é por mera questão pessoal que gostaria de poder encarar o que agora acaso se avança na liberdade religiosa como prelúdio da efectiva e próxima restauração das liberdades cívicas no nosso país. É que sem estas liberdades, a própria liberdade religiosa não logrará subsistir em plenitude.

Estas últimas observações não me impedem, porém, de dar, Sr. Presidente, à proposta de lei em debate a minha aprovação na gene ralidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação, e espero que a conclusão, da discussão na generalidade da proposta de lei sobre a liberdade religiosa e, logo a seguir, o início da discussão e votação na especialidade da mesma proposta de lei.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.

Fernando David Laima.

Francisco António da Silva.

João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.

José Dias de Araújo Correia.

José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.

Luís Maria Teixeira Pinto.

Rogério Noel Peres Claro.

Rui Pontífice Sousa.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.

Alexandre José Linhares Furtado.

Amílcar Pereira de Magalhães.

António Júlio dos Santos Almeida.

António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.

Deodato Chaves de Magalhães Sousa.

Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.

Fernando Augusto Santos e Castro.

Francisco Correia das Neves.

Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.

Henrique José Nogueira Rodrigues.

Joaquim José Nunes de Oliveira.

José Guilherme de Melo e Castro.

Lufe António de Oliveira Ramos.

Manuel José Archer Homem de Mello.

Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.

Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Rectificações ao n.º 119 do Diário das Sessões enviadas por escrito, à Mesa, pelo Sr. Deputado Júlio Evangelista.

Na p. 2429, col. 1.ª, no final das minhas palavras, onde se lê: «a alínea i)», deve ler-se: «o aditamento à alínea i)».

Na p. 2431, col. 1.ª, antepenúltima linha, onde se lê: «alienação», deve ler-se: «alineação».