o Sr. Dr. Cunha Araújo. Portanto isto representa um facto, nada de novo além do reconhecimento do facto: o Estado não professa qualquer religião.

Quanto à necessidade de fazer constar da lei, realmente, o reconhecimento desse facto, pois eu volto a repetir, que, Como a mulher de César, será necessário que o Estado não garanta apenas tacitamente a sua imparcialidade, mas que a exprima tal e qual, como mais tarde eu virei defender - que os pais devem expressamente confirmar uma anuência tácita, que está prevista adiante, para autorizar os filhos a receberem a educação religiosa e a moral.

E aqui está, com toda a simplicidade, do que se trata. Eu nunca falei aqui nisso, e sou quase forçado a dizer: eu também sou católico, também sou apostólico, e não me sinto nada constrangido, pelo contrário, que fique bem claro que realmente o Estado, que tem diante de si várias religiões, e não como na Constituição, em que apenas se reconhecia a igreja católica. Forque o que estamos a resolver é precisamente o reconhecimento da personalidade jurídica às outras confissões religiosas, o Estado não estiava na mesma situação, a situação era diferente.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Foi aqui feita já a afirmação de que a religião católica é a religião tradicional do País, e estou convencido de que com esta afirmação queriam referir-se só ao Portugal europeu.

A afirmação de que o Estado não professa qualquer religião parece-me conveniente, pois que isso não põe em dúvida as suas relações com a religião tradicional do Portugal europeu e garante a todas as outras confissões que elas se encontrem em situação idêntica para com o Estado.

Parece-me, assim, o texto da proposta de lei o mais conveniente e o que melhor satisfaz ao País, querendo significar com País o todo nacional.

O Sr. Oliveira Dias: - Das redacções propostas para o n.º 1 desta base subscrevi, e, por conseguinte, julgo a mais conveniente, aquela que é sugerida: «O Estado não adopta qualquer religião [...]». Praticamente é a da proposta do Governo; só se substitui a expressão «não professa» por «não adopta», que reputo mais conforme com as realidades.

Como agora recordou o Sr. Deputado Moura Bastos, na definição do documento difundido pelo episcopado da metrópole sobre o problema da liberdade religiosa «o Estado, por si mesmo, é laico, mas não pode ser laicista». Ora, se é laico, isso significa, justamente, que não adopta qualquer religião, embora deva promover as consentâneas com o bem comum. Este será, também, o sentido da proposta do Governo, mas julgo a expressão «não professa» menos exacta, porquanto professar significa praticar, seguir, e o Estado, como tal, nunca pode abraçar qualquer religião. Pode, sim, adoptar uma religião como religião da Nação, como até há pouc o sucedia entre nós. Professar uma religião é acto próprio de indivíduos.

Por estas razões, dou o meu voto à citada proposta de emenda que substitui a expressão «não professa» da proposta do Governo por «não adopta».

não tem puro sentido negativo, expresso na eliminação de qualquer coacção sobre o pensamento ou a acção dos homens em matéria de religião», pois «ela reveste ainda um sentido marcadamente positivo, inspirado no valor social do fenómeno religioso, que obriga o Estado, embora de modo indirecto, a criar condições propícias ao seu livre exercício».

Não resisto à tentação, ainda sobre este último aspecto, de lembrar o que na declaração do Episcopado da metrópole sobre o projecto de lei relativo à liberdade religiosa se disse para fundamentar esta verdade de que se «o Estado, por si mesmo, é laico», ... «não pode ser laicista ... e assumir, em matéria religiosa, uma atitude de simples indiferença».

Naquele documento inscreveram-se, na verdade, palavras dignas de reflexão, como estas.

«E a razão está em que a vida religiosa do homem entra na própria composição da sua felicidade, mesmo terrena, tornando-se assim indispensável para a construção de uma sociedade convenientemente ordenada e integralmente sã», pelo que «os poderes públicos a devem, não apenas aceitar, mas proteger e promover».

São ainda de transcrever estas judiciosas palavras de um teólogo contemporâneo:

Dado que a dimensão religiosa pertence essencialmente à natureza humana, deve ser reconhecida pela sociedade civil, a qual é responsável pelo bem comum, como um elemento construtivo do mesmo bem comum. A plena liberdade religiosa deve, portanto, ser reconhecida pelos Estados de maneira positiva. Trata-se de uma exigência do direito natural. Quer o ateísmo de Estado, que impede a vida religiosa, quer o laicismo, que a ignora, são contrários ao direito natural.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os bispos portugueses, por tudo isto, reconhecendo embora que «o diploma revela o propósito de conceder a todas as confissões uma liberdade que não seja apenas sinónimo de simples tolerância», ... «consideram algum tanto destoante deste propósito a redacção da base V (base IV do projecto, equivalente à base II da proposta), que pode sugerir «a conclusão de que o Estado deseja assumir uma atitude meramente negativa em relação ao factor religioso».

Foi esta a orientação que defendi na comissão eventual e não vejo que, entretanto, tenham sobrevindo quaisquer razões que, de algum modo, a tivessem afectado. O sentido do meu voto ressalta, assim, bem nítido: será de plena aprovação da proposta de alteração que conduz à eliminação da primeira parte da base II.

Uma lei desta magnitude e desta natureza não pode, mesmo formalmente, ser contraditória nos termos e estes devem ser definidos com meridiana clareza.

«Decerto a esfera religiosa não é da competência do poder civil; mas este ... não pode ignorar a projecção so-