Isso não prejudica religiões e evita pretensos compromissos efectivos ou possíveis, ou acusações de compromissos.

Tenho dito.

O Sr. Bento Levy: -Sr. Presidente: Não era minha intenção intervir neste debate, visto que V. Ex.ª não me poupou a honra de me designar para a comissão eventual, onde tive a possibilidade de exprimir a minha posição.

Em todo o caso, entendo que não devo deixar de marcar aqui, também, o meu ponto de vista. Para isso, reputo indispensável esta afirmação prévia: não admito, não consinto, não permito, a quem quer que seja que me pergunte qual é a minha religião, nem sequer se acredito ou não em Deus.

E faço esta afirmação porque tenho notado que toda a tónica da discussão desta proposta de lei se tem baseado na religião católica.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - E V. Ex.ª estranha isso?

O Orador: - Não estranho nada. Ainda não acabei ... Ainda agora comecei ...

Quero afirmar que não estou numa Assembleia conciliar católica. Estou aqui como político, a servir os interesses da Nação dentro das minhas modestas possibilidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não discuto, nem católicos, nem judeus, nem protestantes, nem ateus ... graças a Deus! (Risos). Estou numa assembleia política, e é como políticos que nós temos de discutir para decidir e votar.

O Sr. Francisco Balsemão: - Muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E temos de servir todas as religiões, sejam elas quais forem, desde que não sejam contrárias à ordem constitucional, à nossa vida política ou a ordem social que propugnamos.

O Sr. Cunha Araújo: - É justamente por isso ... E por nós estarmos num país em que há variadíssimas religiões que não interessa estar a defender nenhuma e, portanto, a declaração não afecta qualquer delas.

O Orador: - No entanto, a mim, que nunca disse a ninguém que era judeu, já se tentou atingir-me. Lá por ser Bento Benoliel e Levy, isso não quer dizer nada!

O Sr. Casal-Ribeiro: - Em todo o caso, parece que alguém o ofendeu ...

O Orador: - Há quem possa enfiar a carapuça ...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Acho muito bem.

O Orador: - Desculpem-me, mas eu tinha de desabafar esta «do judeu».

De modo que, Sr. Presidente, e voltando ao princípio, entendo que a melhor posição do Estado, a melhor posição do Governo, com quem nós temos de colaborar, é exactamente aquela que resulta da redacção que está na propósito.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Às vezes colabora-se, discordando ...

O Orador: - V. Ex.ª pode discordar, mas eu concordo. «O Estado não professa qualquer religião» é uma fórmula que satisfaz todos.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Discordar é muitas vezes uma forma de colaborar.

O Orador: - Diz-se: há laicismo. No entanto, não se vê o que está adiante: o Estado, no seu pleno direito, procura dar uma orientação nas bases seguintes, preocupando-se em defini-la. A crítica isola o preceituado na base em discussão, sem reparar na contextura geral da proposta.

Se o fizer, verá que não há laicismo.

Há uma posição clara e definida do Estado perante as religiões.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - Antes de V. Ex.ª acabar e como não tenho, (regimentalmente, direito a usar mais da palavra, porque já falei duas vezes, vou aproveitar-me da possibilidade de um aparte a V. Ex.ª só pana fazer uma pequena lectificação ao que aqui disse.

Também foi como político que me pronunciei acerca da lei da liberdade religiosa. Como político, pois é como políticos que todos nós temos de procurar satisfazer os anseios nacionais.

E, em matéria de religião, trata-se de um anseio nacional.

Posto o problema assim, portanto, V. Ex.ª não tem de estiar a reparar se são ou não católicos os portadores dessa afirmação. E como político e foi como político que pus o problema? Muito obrigado.

O Orador: - A comissão eventual é secreta ...

O Sr. Cunha Araújo: - Não é nada.

O Orador: - É ... E e eu não quero dizer o que lá se passou ...

Muito obrigado, Sr. Presidente, não vale a pena continuar, visto que julgo esclarecido o meu ponto de vista quanto à base em discussão.

O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: A base II da proposta que assinei, da autoria do Sr. Deputado Cunha Araújo, é mais rigorosa na sua expressão do que a proposta de lei, mas quanto à definição de propósitos é rigorosamente igual. Se é assim, e falo apenas no plano político, pergunto por que razão não aprovaram a proposta que subscrevi e que agradaria muito mais, estou certo disso,, à grande maioria dos portugueses que, aqui e no ultramar, é evidentemente religiosa!