É preciso deixar que os contrates, as antinomias e as contradições latentes na sociedade portuguesa, cobertas pelo ma ato diáfano da Concordância e do silêncio, se desenvolvam e venham à superfície. A existência de um povo é salutar quando pode exprimir os seus anseios, associar-se voluntariamente ao processo político, determinando, ele próprio, os fins colectivos.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Tem de reconhecer-se que a máxima dificuldade do movimento evolutivo reside mia antítese entoe a participação de todos mo progresso social e o temor de algumas camadas políticas do abrandamento do sistema repressivo.

Esta situação contraditória sacrifica o bem-estar do maior número à tranquilidade de poucos.

As contradições resolvem-se com a vitória das tendências progressivas.

Há anos atrás era comum perguntar se o Regime podia subsistir sem censura, ao que se respondia de dois ânodos: os adversários opinavam que ele ruiria nesse instante; os adeptos mais ferrenhos asseveravam o contrário, mas não consta que tentassem suprimi-la.

Há uma terceira resposta que pode fazer-nos sair da alternativa. Consiste em submeter a questão à prova dos factos. Termine-se com a censura, e observe-se o resultado. O que a especulação é incapaz de resolver, resolvê-lo-á a prática social.

Estou persuadido de quê o Governo saía vitorioso da prova, porque já conquistou a maioria da opinião pública pelo que realizou e, principalmente, pelas esperanças que se depositam nele.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A lei de imprensa não significa o fim da censura, nem o da atormentada existência do direito à expressão do pensamento em Portugal, mas abre um horizonte que pode ser a terra prometida - a simples liberdade de viver democraticamente.

O orador foi cumprimentado.

Constituição, a liberdade religiosa e, agora, a lei de imprensa.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Eu sei que esta última, mais do que qualquer outra, vem sendo há longo tempo objecto de estudos e constitui natural anseio dai próprias imprensa e de alguns políticos que pensam assim contribuir para a mentalização do País num estalo novo, mais liberal, mais descomprimido, como tenho ouvido chamar a toldo quanto resulta de uma abertura que se vai processando, não sem alguns inconvenientes, mas, segundo parece, de acordo com as novas fórmulas encontradas para dirigir e orientar o País, dentro da renovação adoptada na continuidade que se impõe.

Pensa-se que, desta forma, a imprensa poderá exercer melhor as suas funções informativas e formativas, e mão «ou eu que nego o facto, apesar de todas as reticências que possa pôr, mais quanto à oportunidade da entrada em vigor da lei em discussão do que quanto ao fundamento da argumentação dos que defendem a cessação da censura prévia -, salvo casos especiais, aliás previstos na proposta presente agora a esta Assembleia.

Desejo, para já, prestar a minha homenagem aos profissionais da imprensa, aos seus dirigentes e orientadores, pois considero que, na sua esmagadora maioria, estão uns e outros cheios das melhores intenções.

Confio, portanto, no bom critério e no patriotismo daqueles a quem está entregue, a pesada e importantíssima tarefa de esclarecer, informar e formar a opinião pública da Nação, tal como confio no bom critério e na autoridade que o Governo saberá exercer quando - e oxalá tal não venha a suceder - houver desvios que afectem a execução do importante diploma em análise.

Pessoalmente, e para além de não achar oportuna a entrada em vigor de medidas liberalizantes e inadequadas a um país em guerra, guerra que é decisiva para a sua unidade histórica e que do exterior lhe foi imposta, não me impressionou nunca a ideia do regime até aqui adoptado, e quase impunha para levar a cabo toda a obra de reconstrução iniciada há tão largo tempo. Mas seguindo uma linha de rumo da qual não tenciono afastar-me, ponho, neste caso, acima da minha opinião pessoal aquilo que o Governo, após aturado estudo, entende constituir uma necessidade para obter melhores frutos na tarefa ingente a que meteu ombros, e que, segundo julga, trará ao País benefícios, aliás só possíveis partindo de tudo quanto foi feito nos quarenta anos do Estado Novo, apesar das grilhetas, da escravidão e de outras coisas mais, sob a chefia do Doutor Salazar, a quem não me canso, hoje mais do que nunca, de render homenagem, por tudo quanto por nós trabalhou, e que constituiu, por assim dizer, a rampa de lançamento para a obra de actualização e desenvolvimento em curso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estudada, portanto, atentamente, a proposta do Governo e ressalvados os aspectos que já referi quanto à oportunidade da sua entrada em vigor, dou a minha aprovação na generalidade ao diploma em discussão, reservando-me na especialidade para aceitar e votar quaisquer emendas que possam vir a parecer-me mais capazes de corresponderem ao pensamento de quem é profundamente contrario a tudo quanto seja «uma falsa ideia clara» de liberdade susceptível de conduzir o País àquilo de que saiu, e a que ninguém por certo quer ver regressar.

Confio, repito e insisto, na acção do Governo, e também no trabalho daqueles a quem fica entregue a tarefa que sairá facilitada, segundo parece, da aprovação da lei de imprensa.

Não desejaria -, porém, e de certo comigo estarão todos os bem-intencionados, voltar a assistir àquele tipo de liberalizações em que se multiplicavam os assaltos às re-