O Sr. Almeida Garrett: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça o favor.

O Orador: - Ah! Inteiramente de acordo ...

O Sr. Almeida Garrett: - Então estamos muito mal!

O Orador: - Pois! Instrumentais ...

O Sr. Almeida Garrett: -... porque, então, a frase a propósito da qual eu interrompi V. Ex.ª - e que era a da limitação das liberdades individuais - era uma expressão perfeitamente deslocada, não só perante os factos, mas até perante as ideias. E era isso que eu queria que V. Ex.ª fizesse o favor de me explicar para eu poder seguir o seu raciocínio ...

O Orador: - Bom! Está explicado?

O Sr. Almeida Garrett: - Não, não está! Deve ser culpa minha, mas ... não está!

O Orador: - Eu supunha que sim, quando V. Ex.ª empregou a palavra «instrumental» ...

O Sr. Almeida Garrett: - Pois, pois, instrumental ...

Mas é porque, se não for assim, V. Ex.ª compreende que, quando se fala em fins nacionais, quando se fala em valores nacionais, quando se fala em valores históricos, V. Ex.ª redu-los todos a valores individuais ...

Eu, quanto a isso, é que não posso, de maneira nenhuma, estar de acordo!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado: O problema está misto, os valores, ditos nacionais, são-no autenticamente, se efectivamente têm valor intrínseco, se contribuem para a plena realização de todas as faculdades que cada membro da comunidade nacional transporte. Custar-me-ia conceber que num plano teórico, porque teria então que admitir uma concepção transpersonalista, que houvesse qualquer valor considerado colectivo que de se próprio fosse atrofiador ou inibidor da autêntica expansão de cada membro da comunidade.

Portanto, isto dava uma conversa muito interessante, mas talvez agora deva continuar.

O Sr. Almeida Garrett: - Eu só pedia que V. Ex.ª, ao continuar, não dissesse, portanto ...

O Orador: - Continuando, eu dizia que nesta ordem de ideias a comunicação está para a comunidade social como o aparelho circulatório está para o corpo humano. É ela que permite que cada homem proporcione à comunidade de que faz parte todas as riquezas que brotam da sua originalidade criadora e que permite a cada homem, também e em sentido inverso, receba e se enriqueça com as criações dos demais.

A comunicação, que tem a sua expressão mais nobre na comunicação directa, aquela que estamos aqui a realizar, por intermédio desta maravilha que é a linguagem humana, que o progresso tecnológico permitiu, graças à imprensa, à rádio, à televisão, agora com as possibilidades que os satélites abrem, que se estenda em determinado momento a partir de um emissor às dimensões de toda a terra.

A importância essencial dos meios de comunicação social é serem condição indispensável de realização humana.

Marcando nesta importância certas tónicas com particular interesse, para e ste debate, eu gostaria de referir duas, de resto já aqui largamente invocadas e, portanto, abstenho-me de não as desenvolver: os meios de comunicação social como instrumento de participação política; gostaria de acentuar este último pela ênfase com que o digo, não pelo desenvolvimento que lhe vou dar, que é a importância .que cada vez vão assumindo mais ou deverão vir a assumir como meios de defesa de um mínimo que seja de espaço liberdade de cada um, cada vez mais reduzido, num mundo em que a organização estadual e empresarial o vai reduzindo, quase que diria à sua expressão mais simples.

Dos meios de comunicação social o mais importante é sem dúvida nenhuma a imprensa, veículo de informação, de opinião, de expressão, de participação.

Daí, necessariamente, que tudo o que a ela imprensa diz respeito deve merecer atenção particular dos poderes públicos, visto que, estando os meios de comunicação social ao serviço das pessoas e sendo a função dos poderes públic os proporcionar e facilitar as condições que permitem a autêntica e integral realização das pessoas, evidentemente que de nenhum modo a imprensa, e tudo o que lhe diz respeito, lhe pode ser estranha.

Numa sociedade utópica, de homens santos, não seria precisa a lei de imprensa nem qualquer lei. Numa sociedade de homens concretos, mas em que, fruto de uma educação autêntica, o civismo atingisse um nível alto, embora com as naturais imperfeições inerentes à natureza humana, poderíamos admitir que aquelas normas gerais, que regulam a vida social, bastariam para enquadrar devidamente a actividade da imprensa. Numa sociedade totalitária, talvez não seja necessária a lei de imprensa; a imprensa é propriedade do Estado; o Estado é a parte de todo o poder e de toda a lei; efectivamente, não seria necessária qualquer lei de imprensa. Nas sociedades em desenvolvimento cívico, parece indispensável a existência de um estatuto próprio que assegure, então das limitações de que qualquer lei é capaz, tanto quanto possível, que a imprensa realize a sua função social.

Quando se assiste (e também já tem sido aqui acentuado) à evolução das sociedades modernas em que, e em resultado em grande parte do próprio desenvolvimento tecnológico, com os recursos financeiros vultosos que exige para ser realizado, um dos grandes perigos que defronta a imprensa é ser usurpada pelo poder económico.

Por si só, este facto justificaria uma atenção particular do Estado, no sentido de dentro dos limites da sua com-