necessidades materiais e espirituais da colectividade que formamos.
O homem esquece, por vezes, que não pode viver só e perdido no mundo.
As nações - como disse um grande poeta- todas são mistérios. São, de facto, mistérios do mesmo plano insondável da criação, que o fez surgir solitário e errante sobre a Terra, o fez multiplicar-se em tipos humanos tão diferentes, diversificados mais ainda por uma babilónia de línguas que dir-se-ia criada para que os homens se mantenham isolados e uns aos outros se não entendam, mas .ao mesmo tempo gravou no fundo- da sua alma o horror à solidão e marcou de tal forma a sua vida pela necessidade de convivência que o homem se vem sentindo atraído a viver harmoniosamente em sociedades, a coalescer em espaços humanos cada vez maiores, da pequena tribo às grandes nações. Uma nação representa, assim, um património colectivo que se não mede pela simples operação aritmética de somar os seus habitantes, os seus haveres e os seus desejos ou ambições particulares; mas, como corpo organizado, tem também a sua alma, tem também a sua vida.
Se juntarmos braços e pernas a um tronco avulso e o encimarmos por uma cabeça, não teremos, por certo, um homem - mas apenas um cadáver. O que fazia o homem era a harmoniosa conjugação de todos estes pedaços - e esta harmonia era a vida.
Ora, o bem comum, nesta hora em que tão grandes problemas se deparam à Nação para assegurar a sua defesa e para acelerar o seu progresso, penso que deve ser visto, sobretudo, nesta mais ampla e mais generosa perspectiva.
A imagem serena, séria e digna do Chefe do Estado quando transmitia ao País a sua histórica decisão, tomada no exercício pleno, livre e independente do seu mandato e meditada grave e honestamente, como quem resolve um problema de consciência, e não como quem procurasse apenas habilidosamente equilibrar ambições ou interesses, foi não só o espelho do carácter de um homem, mas tombem o espelho do estado de espírito da Nação.
Continuou a dar o mesmo exemplo quando, escolhido o seu sucessor, apesar da natural diferença dos pessoas, dos seus modos de ser e de agir, de eventuais divergências de pontos de vista ou de piamos de acção, mostrou que sabia evoluir no despeito de uma obra e de uma personalidade.
E quando a morto fez entoar na serena paz de Deus a figura venerável e austera daquele homem que envelhecera a servir devotadamente a sua Pátria e que entrara já por direito próprio na sua história -, todo o País se sentiu emocionado ao escutar as palavras tão lúcidos e tão justos proferidas naquela hora pelo Sr. Presidente do conselho e que sentia serem também as suas. Acabara, de facto, de perder um homem - um grande homem que foi um grande pensador e um grande1 governante -, mas «naquela nobreza de atitudes, naquele equilíbrio dos juízos, naquele respeito, que correspondiam ao mais fundo e ao mais sincero dos sentimentos da generalidade dos portugueses, a Noção havia dado ao Mundo uma prova mais de maturidade e assegurado também a si própria a consoladora certeza de verificar que, mesmo que ao longo destas últimos décadas outra coisa se mão houvesse feito, se havia forjado no País uma alta consciência cívico e se haviam preparado homens que tornavam possível dar ao exercício da política tal elevação e tal dignidade.
É ao homem que a si próprio se designa como «civil e mestre-escola, desconhecedor profundo dos regulamentos, da vida e da história militar» que, quatro anos volvidos sobre a sua entrada para o Governo - ainda então apenas Ministro das Finanças -, os chefes militares vão pessoalmente entregar, como preito de homenagem, a grã-cruz da Torre e Espada, a mais alta das condecorações militares com que acabava de ser agraciado e fora adquirida por subscrição entre a oficialidade de terra e mar.
E este mesmo homem, que vê a sua vida política abrir-se com a herança de um movimento militar a que teve de dar rumo; que, já então Presidente do Conselho, por nova e singular coincidência, assume interinamente a pasta da Guerra quando as labaredas do comunismo ameaçavam alastrar por Espanha, escassos dois meses antes de se iniciar a dolorosa provação da sua guerra civil. Toma posse do lugar, para que entrava interinamente, mas que viria a ocupar durante oito longos anos, com um discurso de pouquíssimos minutos, sóbrio e claro - rude, talvez até, na firme posição de chefe com que assumia o posto. Tomara essa decisão porque entendia que tínhamos de ter em prazo relativamente curto o Exército que nos é necessário para a defesa dos grandes interesses da Nação.
Os ecos da guerra de Espanha fazem-se logo sentir no País numa tentativa sediciosa de desviar navios de guerra para apoiar aquela «luta internacional num campo de batalha nacional», como desde logo a apelidou. Dominado prontamente o incidente, na comunicação que dirige ao País exprime-se como político de visão lúcida que compreende toda a extensão do conflito, como governante prudente e firme, mas fala também como chefe exigente e esclarecido quando escreve que entre as coisas que a força armada deve ter sempre presentes «a primeira é