Posta de lado a ideia, alvitramos outro solução, esta de acordo com os ideias que vimos defendendo: a criação de uma Faculdade de Medicina, aproveitando pana isso o hospital que se projecta edificar no Restelo.
Mas já que está vencido um dos piores obstáculos à instauração da mova Faculdade, que é o edifício, o hospital projectado preenche simultaneamente duas enormes lacunas - a do ensino e a da assistência. Com efeito, parece um ilogismo desaproveitar a ocasião de resolver dois problemas difíceis e, diríamos, crónicos - formar mais médicos e atender mais doentes. Poucas vezes se terão reunido condições tão propícias para solucionar problemas sócio-médioos, de uma só vez resolvem-se dois.
Segundo a nossa maneira de ver, a nova Faculdade deve ser nova e inovadora, de modo que aí se ensaiem métodos de organização escolar e assistência!, científicos e tecnológicos, modernos e progressivos, os quais, pelas razões que sabemos, são presentemente impraticáveis. Um programa assim pressupõe:
1.° Que a nova Faculdade seja independente e autónoma, isto é, sem sujeição à antiga Faculdade e possuindo autonomia pedagógica e administrativa;
Vozes: - Muito bem!
O Orador:
2.° Que a organização do ensino e da investigação se efectue por departamentos disciplinares, abandonando a arcaica centralização pedagógica, assistencial e de pesquisa na cátedra e nos pequenos e pouco produtivos laboratórios;
3.º Que o recrutamento dos professores se faça por critérios diferentes daqueles que, contra ventos e marés, item prevalecido e que assentam na cooptação, processo paralisante que sustenta as autocracias universitárias;
Vozes:- Muito bem!
O Orador:
4.° Que o corpo docente seja constituído por pessoas novas na idade e nas ideias, e não somente nas ideias, como tantas vezes se pede.
Neste ponto, convém fazer duas reflexões para atalhar aos argumentos habituais dos cépticos que sustentam hão haver gente para os cargos docentes de outra Faculdade. Eu diria (precisamente o contrário - a dificuldade está na escolha, não ao número. Existem na Faculdade de Medicina jovens talentosos com minguadas esperanças de acesso ao professorado. Além disso, há nos Hospitais Civis de Lisboa largo campo de recrutamento, aliás tradicional, porque muitos dos docentes procedem desse reputado estabelecimento. Em outras instituições públicas e privadas há médicos jovens de valor. Por fim, andam dispersos por essas Europa e América dezenas de cientistas médicos e tirocinantes de especialidades várias, alguns possuidores de títulos lá conquistados, que regressariam ao primeiro aceno de uma Faculdade que lhes concedesse meios de estudo e abrisse a carreira docente ou de pesquisa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A segunda objecção fundamenta-se no receio de que o número de médicos aumente exageradamente e voltemos a experimentar a situação de há trinta ou quarenta anos - a pletora médico.
Sem entrar em considerações miúdas, pode afirmar-se afoitamente que nos próximos anos os médicos vão faltar. Já agora, quem esteja com atenção ao que se passa no campo da medicina, descobre sem dificuldade sintomas que prefiguram as carências futuras daquilo que hoje se denomina "a mão-de-obra médica". E mais que certo o aumento gradual do consumo de serviços clínicos, como sucede em toda a parte.
A Federação de Caixas de Previdência, que beneficiou da pletora médica no tempo em que foi instituída e a sombra disso explorou os médicos, experimenta agora dificuldade em recrutá-los. A situação vai-se agravar infalivelmente e o que agora sucede em sectores particulares generalizar-se-á.
Uma Faculdade de Medicina leva a erigir um lapso de tempo que oscila entre cinco e dez anos; o médico demora a licenciar-se e a completar o tirocínio pelo menos doze anos. Isto significa que se principiasse já o novo hospital colheríamos os primeiros frutos daqui a uma dúzia de anos. Será exagero asseverar que se devia ter pensado nisto há mais tempo? Que em matéria de previsão e planeamento dos serviços de saúde, previdência e ensino médico dominou o improviso, o isolamento, os pontos de vista particularistas?
E agora o ensejo de dar um impulso à política da saúde, compreendida na sua quádrupla dimensão: hospitalar, saúde pública, previdência e formação médica.
Terá chegado o momento do arranque inovador, ou teremos de continuar esperando?
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à
O Sr. Presidente: - Continua o debate na generalidade sobre a proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1971.
Tem a palavra o Sr. Deputado Boboredo e Silva.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Em duas das minhas intervenções da sessão legislativa transacta -Lei de Meios e tomada de contas de 1968 -, a propósito das dificuldades que a Nação atravessa, tendo de bater-se em África numa luta que é total e que envolve ou devia envolver- todos as actividades nacionais e não podendo abrandar, antes acrescer, o seu desenvolvimento económico, que é vital, referi-me sucintamente, mas com a clareza indispensável, tenho essa sensação, à imperiosa necessidade de haver a maior austeridade e economia nos gastos não essenciais em todos os actos da Administração e vida públicas, evitando despesas sumptuárias e doudo assim exemplo aos particulares, para que todos os esforços convirjam no sentido de investir ou gastar no que é reprodutivo.
Por uma questão de coerência e de convicção não poderia deixar de voltar a aflorar esta matéria, até porque me parece que as minhas sugestões, ou melhor, os meus apelos, de pouco serviram, pois não se enxergou, pelo menos eu não a descortinei, a menor redução na intensa vida social dos órgãos do Estado, nas deslocações ao estrangeiro, nas viagens mais ou menos desnecessárias, nos banquetes, nos congressos e outros encontros, quantos deles porventura improdutivos ou, pelo menos, de menor significado.
Não se confundam, todavia, estas considerações com o desejo de qualquer isolacionismo, que hoje é incompatível com o progresso dos povos, designadamente dos