O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: -V. Ex.ª é, portanto, contra a preconizada reconversão da região do Douro?

O Orador: - Eu entendo, como vou dizer, que a vinha é perfeitamente viável no Douro, cultivada noutros termos.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Não creio que, se quisermos, o Governo, técnicos e agricultores quiserem, o problema não encontre solução válida, tempestiva e económica.

A solução não aparecerá como maná nem decorre da contemplação nostálgica do passado de glórias e tragédias, mas de uma acção inteligente, sistemática e firma, alicerçada nas conquistas da técnica, na diligência e compreensão dos interessados e na clara decisão do Governo.

Então, as dificuldades serão vencidas, já que nem por serem muitas tornam o problema mais difícil, quando é unívoco e bem delimitado.

A reconversão do Douro em termos de mecanização da exploração não comporta grandes dificuldades técnicas nem obriga a investimentos incomportáveis - é inteiramente viável para os actuais conhecimentos e experiências técnicas. Sabe-se como deve proceder-se e quanto custa.

A reconversão de l ha de vinhedo, em termos de mecanização, custará entre 25 e 30 contos, o que para uma integral reconstituição da Área actual significaria um investimento de cerca de 700 000 contos, ou em programa decenal, que dificilmente poderia executar-se, de 70000 contos por ano.

Compare-se com o encargo das intervenções da Junta Nacional do Vinho, que, depois de cinco anos de más produções e bons preços de vinho, ainda ronda o milhão de contos, e com o custo, só da l.ª fase, do Palácio da Justiça de Lisboa e ver-se-á claramente não constituir o investimento necessário obstáculo invencível ou dificuldade insuperável.

Eu sei que há outros e mais problemas ... A actual dispersão da produção, pois 75 por cento de produtores não dispõem de mais de l ha de vinha e 90 por cento não cultivam mais de 2 há!

A falta de caminhos, de acessos e de estradas aptos à circulação de veículos constitui outro factor de estrangulamento e problema psicologicamente de difícil solução.

O Sr. Cunha Araújo: -V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª sabe que o número de lavradores com 1 ha é exactamente de 19 000. Isso é que é o mais aflitivo.

O Orador: - Pois há, como disse, 75 por cento com menos de l ha, 90 por cento com menos da 2 ha.

Mas, para os conceitos actuais e modos de actuar na agricultura europeia nem um nem outro constituem obstáculos sérios se houver uma legislação apropriada, uma política clara, definida, e uma actuação firme e compreensiva.

Aumentar-se-iam os investimentos a efectuar, que passariam a rondar o milhão de contos, o que nem em programação decenal obrigaria a investir 100 000 por ano. Mas continuamos ainda dentro dos limites do possível em termos financeiros e económicos.

E depois a reconstituição, em termos de plena viabilidade económica para o futuro, não terá maior valor e utilidade económica e social?

Mas perguntar-se-á como poderia efectuar-se esta transformação, em que termos poderia a lavoura suportá-la e de que modo poderia o Governo ajudá-la?

Sem entrar em particularizações impróprias desta intervenção e desta Câmara, adiantarei que o prejuízo suportado com as intervenções rio mercado de vinhos custou, em media, no último decénio, l $50 por litro de vinho.

Pois bem, bastaria atribuir, como subsídio de reconversão, uma subvenção de 3500$ por hectare de vinha arrancada e plantada de novo, segundo as modernas exigências técnicas (mecanização, porta-enxertos, castas, etc.), durante o período em que não houvesse produção, para que o lavrador pudesse, sem sacrifício nem hesitação, proceder à reconversão e esperar as novas produções. O Governo não despendia nem mais um centavo do que actualmente, porquanto o arranque substituía, na exacta medida, a queima ou qualquer dos outros processos de escoar excedentes ...

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª desculpe, mas podia explicar-me, do ponto de vista de lavrador, como era possível operar-se a reconversão nos termos que V. Ex.ª Preconiza?

O Orador: - É simples. Bastaria que o Governo, em vez de despender avultadas verbas queimando vinho, substituísse o prejuízo com a queima do vinho por um subsídio equivalente durante o período em que não houvesse produção. O Governo não despenderia mais um tostão e o agricultor receberia cerca de 3500$ por hectare e ano.

O Sr. Cunha Araújo: - E isso acabava com a queima dos vinhos no futuro?

O Orador: - Perdão, não me preocupa se acabava ou não. Aquela vinha que se arrancasse dispensava a queima do vinho correspondente e, portanto, o Governo não despenderia mais um tostão.

Ficaria apenas de pé a questão de saber se a nova exploração é rentável perante o investimento exigido e ainda como fazer financeiramente face ao mesmo.

Se aditarmos as contas que simplesmente cada um pode fazer, comparando os custos de estabelecimento actuais ou mesmo os de há um lustro com os indicados, os benefícios resultantes de uma drástica economia de exploração, de um aumento unitário de produção e de um afinamento da qualidade, creio não ser necessário continuar ... Há (coisas evidentes ...

Fica ainda o problema do volume do investimento, questão que se afigura mais fácil do que qualquer outra.

Não julgo que fosse difícil obter um financiamento do Banco Mundial para levar a efeito esta tarefa de salvar o Douro, solução que nem sequer tem o inconveniente de vir a exigir mais tarde um sacrifício considerável em volume de divisas já que o vinho do Porto é um produto de exportação, e noutras condições encaminhar-se-á para a extinção ... Mas até internamente era possível resolver o problema, embora talvez com sacrifício de outros investimentos mais dificilmente realizáveis por esta via.