até impor, a cessação dos espectáculos. O Sr. Deputado Veiga de Macedo sustenta a opinião contrária.

Eu, primeiro numa posição doutrinária, queria referir o seguinte: um espectáculo de teatro é um espectáculo de ordem eminentemente colectiva. É no teatro que o aspecto colectivo da realização se apresenta. O espectáculo é um texto, que tem um autor; é uma companhia, são actores que representam esse texto.

Pode ser um texto maravilhoso, Sr. Presidente; pode ser uma companhia excepcional, Sr. Presidente. Mas sem público não é teatro. Sem público não é espectáculo. O público é elemento do espectáculo; é elemento do teatro com tal dignidade, com tal interesse, de tal modo participante como o texto e como os actores.

E nada mais arrasante, nada mais aviltante para os actores do que representarem para uma sala vazia.

Aliás, Sr. Presidente, tratando-se, efectivamente, de companhias subsidiadas pelo Fundo de Teatro, o subsídio tem a ajuda financeira do Fundo de Teatro, visa a transmissão da mensagem cultural que o espectáculo leva ao público. E não havendo público, tal finalidade perde-se, irremediavelmente.

Isto é um aspecto de elementar observação para quem se debruça sobre estes problemas. Além do mais, sujeitar, através de contratos, contratos de trabalho como todos os outros contratos, a dignidade de um actor, o passado de um actor, ou tudo o que representa o orgulho profissional de uma companhia, a representar para uma sala com dez, vinte ou trinta elementos, é sujeitá-los a vexame que os actores portugueses não merecem, a não ser que circunstâncias pessoais e excepcionais os conduzam a isso, mas tão-só pela chama da cultura.

Por observações que se deduzem e que, portanto, reflectem elementos de ordem cultural, não há teatro sem público. Por outro lado, tendo em consideração elementos de ordem humana, que são a qualidade, a altíssima, a sublime qualidade do trabalho de quem interpreta, de quem representa, de quem criou um texto para ser representado, entendo que está perfeitamente certa a intervenção do Estado, para não permitir que se degradem os espectáculos, que se possam sujeitar as companhias e os autores ao vexame de trabalhar sem público.

E claro que esta permissão da proposta de lei, temos que a entender, como se diz no lugar comum da linguagem jurídica, em termos hábeis. É uma permissão com que a Direcção-Geral fica, que ela executará prudentemente, que ela executará hàbilmente.

O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: Queria fazer uma anotação que me parece essencial à discussão.

Nos termos da proposta, o que acontece é que o próprio parecer formulado pela Secretaria de Estado vai ser sujeito a um último veredicto, que é o do público. E a própria Secretaria de Estado quem o propõe. A Secretaria e o Conselho de Teatro entenderam que determinado espectáculo mereceria ser subsidiado; mas depois vai-se sujeitar esse seu parecer a opinião favorável ou desfavorável de um público que, infelizmente - e nós o sabemos -, neste momento não está preparado para receber toda a espécie de espectáculos, especialmente aqueles espectáculos de nível mais elevado. Quero dizer que poderemos estar a abrir uma porta para que alinhemos num sistema de transigência, com algum mau gosto, pura e simplesmente porque esse mau gosto se reflecte em termos de bilheteira. Parece-me que este também é, com certeza, um elemento a ponderar.

O Sr. Veiga de Macedo: - Sr. Presidente: Uso novamente da palavra para esclarecer, se acaso é preciso fazê-lo, que este n.º 2, na faculdade que confere a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos, não é tão amplo como parece.

A Comissão, posso dizê-lo, começou por interpretar este preceito de uma maneira por demais extensiva. Pareceu-lhe, na verdade, que aquela faculdade envolvia a possibilidade de a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos suspender a actividade teatral da entidade assistida financeiramente. Mas, interpretando depois melhor essa disposição, a Comissão verificou que o seu alcance normativo é bem mais limitado. Na verdade, o que se pretende no fazer cessar um determinado espectáculo é pôr termo a uma situação inaceitável e estimular a entidade beneficiária do auxílio estatal a pôr em cena, em condições mais propícias, novas peças.

Quanto a observação, muito hábil - hábil no bom sentido, claro está -, do Sr. Deputado Magalhães Mota, ao meu espírito liberal nada impressiona ver um departamento do Estado rectificar posições. Ainda agora um nosso Ministro submeteu a apreciação generalizada - ia a dizer indiscriminada - importantes reformas.

Vai sujeitar-se, é natural, a que nem todos concordem. Mas do facto não vejo que advenham quaisquer inconvenientes. E, de resto, frequente ver o Governo ou os serviços públicos a rectificarem posições. Mau seria que o não fizessem sempre que há motivos para essa rectificação.

É certo que, no domínio do teatro e do cinema, a concessão de subsídios envolve um risco especial. Bem sei que há uma maneira de o evitar: seria exigir tais garantias às entidades que solicitam a assistência financeira que só muito poucas se abalançariam a aceitar as condições impostas.

Não há dúvida de que também nestes casos o Estado tem de ser compreensivo, pois, se leva as exigências longe de mais, não abrirá qualquer possibilidade a que novos valores surjam e se firmem. Mas daí a p roteger iniciativas sem interesse ou a sustentar mediocridades vai uma distância muito grande.

Nem deve esquecer-se que os dinheiros públicos não são elásticos. E pode ainda dar-se o caso de haver teatros subsidiados sem público, enquanto candidatos idóneos à assistência financeira não podem ser auxiliados por falta de verba dos fundos respectivos. E isto não me parece justo, nem aconselhável.

Aliás, tenho informações de que a experiência torna o preceito em debate de todo imprescindível. Terei sido mal informado? Antes assim fosse!