dos que chegam a ordenar-se? Não tem eles dado ao País alguns dos seus homens mais ilustres, que o Estado se esqueceria do descobrir?

A situação criada pela Concordata para a Igreja não á, em rigor, privilégio, é antes reconhecimento de situações diferentes. Portugal nasceu, formou-se e vive ainda, na sua quase totalidade, no seio da Igreja. E uma realidade histórica e moral. Facto ainda sociológico que o Estado não pode esquecer: aqui, igualmente, seria falsidade, injustiça e traição ao bem comum.

A situação da Igreja, segundo a Concordata, não nega, antes proclama - disse-o há pouco o Episcopado da metrópole em solene pastoral - a obrigação de assegurar a todas as religiões os respectivos direitos, o que não quer dizer que sejam os mesmos. O Concílio, na Declaração sobre a Liberdade Religiosa, teve o cuidado de precisar: direitos "segundo o modo próprio de cada uma delas e conformo as suas obrigações para com o bem comum".

A existência de capelães militares corresponde a um serviço activo no Exército, paralelo ao serviço sanitário, e, tal como nos Estados Unidos e outros países, é lhes atribuído, para prestígio da sua função, um posto graduado e uma remuneração como aos médicos. Os militares católicos tom direito a assistência religiosa em muitos países.

Não pode considerar-se privilégio a proibição de utilizar-se os hábitos religiosos respectivos quando se não é sacerdote ou religiosa. Pretendeu-se, com isso, evitar burlas e fraudes.

O facto de o Governo ser ouvido antes da nomeação dos bispos não corresponde a um veto; é uma consulta que países como a França, a que já me referi também, já obtiveram de Roma. Pretende a Santa Sé, como os Estados, evitar dificuldades posteriores às nomeações. Não é também um agreement. Quando este é retirado pelo governo, tem o diplomata de sair do país. Não acontece qualquer coisa de semelhante com os bispos.

O ensino religioso não á um privilégio da Igreja, é um direito dos pais católicos que recusam um ensino laicista, que é fábrica de ateus, para os seus filhos.

Mas, Sr. Presidente, o artigo 24.º da Concordata - a indissolubilidade do casamento celebrado catolicamente - está no fundo desta Concordata.

Não se trata de discutir o divórcio ou a "epidemia do divórcio", que todos os católicos e muitos acatólicos (a maioria da Nação} condena não só por razões de ordem espiritual e doutrinária, mas por outras de ordem sócio-biológica que o consideram anti-natural, anti-social, nefasto ao filho e desagregador da família. Nem ainda de rever a história do divórcio em Portugal, com seu cortejo de arbitrariedades, injustiças e imposições contra a consciência católica da Nação.

A questão é de pôr-se, quanto a mim, neste dilema: deve ou mão modificar-se o artigo 24.º da Concordata por que a indissolubilidade lógica o coerente que estabeleça corresponda a coacção feita a católicos, utilizando o poder civil, impedindo-os de usar o direito a segundo casamento e a legitimar os filhos deste resultantes, se saírem do grémio da igreja católica?

E diz-se que esta opção deve passar-se no domínio das consciências a não tem de ser policiada pelo poder civil, que põe os cidadãos diante do irremediável e definitivo.

É me doloroso, Sr. Presidente, argumentar em pormenor este assunto, porque vejo diante de mim o dramatismo e a angústia tão respeitáveis e tão compreensíveis, de uma escassa minoria adentro daqueles 90 por cento (ou quase) de casais que optaram livremente pelo casamento "canónico-concordatário" desde 1940 para cá, e desejam agarrar-se a hipotética tábua de salvação da camuflagem civil do seu fracasso, ou ameaça de fracasso matrimonial como católicos.

Infelizmente, esta camuflagem civil para o fracasso do casamento de católicos, que, aliás, impede o regresso dos desiludidos ou dos prevaricadores sem proteger os mulheres repudiadas e vítimas do adultério masculino, é paralela a tantas situações desastrosas de irreversibilidade em tantos domínios da vida e da sociedade. Digo minoria, porque em relação aos 3 milhões de casamentos católicos na metrópole realizados desde 1940 é escasso o número de casamentos infelizes, na maior parte por escolha imprudente dos nubentes.

E nela o problema dos filhos do primeiro casamento e do seu futuro é tão angustioso como os do segundo. Problema cujo estudo na presente oportunidade é de fazer-se sem paixão.

Quer dizer, à luz de princípios, dos direitos da comunidade nacional estruturalmente católica, por um lado, e da pessoa humana, por outro, como disse no começo desta intervenção. Não é esta tribuna local mais apropriado, em meu entender, para isso.

Aqui ponho a questão - e admito que muitos de mim discordem - deste modo: não encontro motivos para revisão global da Concordata e seria desvantajoso para o País denunciá-la. Quanto ao artigo 24.º, a Igreja não pode renunciar ao seu conteúdo, como se depreende da entrevista que lemos esta manha de S. E. o Cardeal-Patriarca de Lisboa.

A Igreja não poderia, com efeito, tomar a iniciativa de criar uma situação que corresponderia a alargar o divórcio a católicos, facilitando-o, ainda porque sabe que sa facilidade de fazê-lo provoca-o".

Deve o Estado Português tomar essa iniciativa? Parece-me que não pode fazê-lo se tiver dúvidas, sem que a Nação o decidisse por uma das vias em que é legítimo consultá-la, depois de esclarecê-la.

Sr. Presidente: Na entrevista concedida pelo Sr. Presidente do Conselho ao Diário do Notícias, de Lisboa, em Outubro de 1969, foi perguntado pelos jornalistas se o Estado não podia denunciar a Concordata. O Prof. Marcelo Caetano respondeu: "Pode, mas estão em causa problemas muito delicados. O País nada tinha a ganhar com a abertura de uma questão religiosa."

E com esta citação faço ponto final.

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à

Para o fazer tenho que adiar para outra sessão o uso da palavra de alguns Srs. Deputados que se tinham inscrito para o período de antes da ordem do dia. Faço-o com pesar, apresentando-lhes pessoalmente as minhas desculpas. Mas a verdade é que a função primordial da Assembleia é a discussão das matérias dadas para ordem do dia.

O Regimento apenas assegura para o período de antes da ordem do dia o tempo de meia hora. Hoje mesmo, sendo